Sunday 30 November 2008

THIS MONTH LAST YEAR (11)

Ao contrario do que e’ habitual, a ‘cronica deste mes no ano passado’ comeca pelo fim, pela highlight do mes (e do ano): o primeiro aniversario deste blog!
Este ano nao estou exactamente em party mood, pelo que nao ha’ farra, mas sempre deixo aqui uns resquicios da do ano passado com a versao original da musica (o classico Mario, de Franco) que entao nos fez ‘dancer, dancer, dancer…, boujer, boujer, boujer…, sauter, sauter, sauter…'


Mas se alguem quiser mesmo reviver aqueles momentos ao som dos Wizards, nao faca cerimonia, entre por aqui...

Descendo para o principio do mes, outra highlight: o contributo pessoal de Paulo Lara para a Historia, com as suas memorias de “Che e Angola”, publicadas pela primeira vez em exclusivo neste blog.


O resto do mes foi particularmente marcado pela infeliz entrevista do brasileiro Jo Soares a um pseudo-etnologo, afinal taxista, que entitulei “Etnografia de Curral, ou Bestialidade Culturral” e que foi objecto de uma onda de indignacao que se propagou um pouco por todos os quadrantes onde se fez ecoar, culminando com um abaixo assinado de protesto que atraiu mais de mil assinaturas de varias partes do mundo.

Outros destaques: a libertacao de Graca Campos; o lancamento do livro “Ate’ Voce Ja Nao Es Nada”, de Paulo de Carvalho; uma mencao ao “estado da independencia” de (nossa?) Angola; um artigo meu sobre a atribuicao do Premio Mo Ibrahim a Joaquim Chissano e um ensaio de Francis Njubi sobre as varias questoes e preocupacoes que marcam a experiencia dos intelectuais africanos na diaspora e a sua relacao com os seus paises de origem (do qual destaco esta frase de Paul Zeleza, pela sua relevancia para alguns dos debates suscitados pela recente eleicao de Barack Obama para a Presidencia dos EUA: "Racial discourses and theories are socially constructed ... but repudiating race theory does not make it disappear in politics. Race matters... because it functions as a marker and an anchor to establish and repudiate identity, status and position... Races exist because racism exists", ou, dito de outro modo como o fiz aqui, "(...)a raca, ou a ideia de raca, nao desaparece apenas porque assim o decidimos, ou queremos, particularmente quando ela serviu de base de estruturacao de toda uma sociedade ao longo de seculos… em termos mais especificos, penso que o individuo “racializado” pela sociedade colonial nao se torna, como que por um golpe de magica ou acto de feitico, “desracializado” apenas porque Mia Couto escreveu um belo livro entitulado “Cada Homem E’ Uma Raca”…"); a continuacao das series “Capoeira Angola” e “Sunday Covers & Poetry”, com destaque para a da ja’ saudosa Miriam Makeba, complementada pelo seu "Grazing in Strawberry Fields" com o magistral Hugh Masekela; o aniversario do meu “birthday boy” (que este ano se ofereceu uns dias em Praga como prenda de anos e ainda nao voltou a dar noticias…), entre alguns outros temas e eventos.

E assim, mais coisa menos coisa, se passou mais um mes neste kubiko.
Ao contrario do que e’ habitual, a ‘cronica deste mes no ano passado’ comeca pelo fim, pela highlight do mes (e do ano): o primeiro aniversario deste blog!
Este ano nao estou exactamente em party mood, pelo que nao ha’ farra, mas sempre deixo aqui uns resquicios da do ano passado com a versao original da musica (o classico Mario, de Franco) que entao nos fez ‘dancer, dancer, dancer…, boujer, boujer, boujer…, sauter, sauter, sauter…'


Mas se alguem quiser mesmo reviver aqueles momentos ao som dos Wizards, nao faca cerimonia, entre por aqui...

Descendo para o principio do mes, outra highlight: o contributo pessoal de Paulo Lara para a Historia, com as suas memorias de “Che e Angola”, publicadas pela primeira vez em exclusivo neste blog.


O resto do mes foi particularmente marcado pela infeliz entrevista do brasileiro Jo Soares a um pseudo-etnologo, afinal taxista, que entitulei “Etnografia de Curral, ou Bestialidade Culturral” e que foi objecto de uma onda de indignacao que se propagou um pouco por todos os quadrantes onde se fez ecoar, culminando com um abaixo assinado de protesto que atraiu mais de mil assinaturas de varias partes do mundo.

Outros destaques: a libertacao de Graca Campos; o lancamento do livro “Ate’ Voce Ja Nao Es Nada”, de Paulo de Carvalho; uma mencao ao “estado da independencia” de (nossa?) Angola; um artigo meu sobre a atribuicao do Premio Mo Ibrahim a Joaquim Chissano e um ensaio de Francis Njubi sobre as varias questoes e preocupacoes que marcam a experiencia dos intelectuais africanos na diaspora e a sua relacao com os seus paises de origem (do qual destaco esta frase de Paul Zeleza, pela sua relevancia para alguns dos debates suscitados pela recente eleicao de Barack Obama para a Presidencia dos EUA: "Racial discourses and theories are socially constructed ... but repudiating race theory does not make it disappear in politics. Race matters... because it functions as a marker and an anchor to establish and repudiate identity, status and position... Races exist because racism exists", ou, dito de outro modo como o fiz aqui, "(...)a raca, ou a ideia de raca, nao desaparece apenas porque assim o decidimos, ou queremos, particularmente quando ela serviu de base de estruturacao de toda uma sociedade ao longo de seculos… em termos mais especificos, penso que o individuo “racializado” pela sociedade colonial nao se torna, como que por um golpe de magica ou acto de feitico, “desracializado” apenas porque Mia Couto escreveu um belo livro entitulado “Cada Homem E’ Uma Raca”…"); a continuacao das series “Capoeira Angola” e “Sunday Covers & Poetry”, com destaque para a da ja’ saudosa Miriam Makeba, complementada pelo seu "Grazing in Strawberry Fields" com o magistral Hugh Masekela; o aniversario do meu “birthday boy” (que este ano se ofereceu uns dias em Praga como prenda de anos e ainda nao voltou a dar noticias…), entre alguns outros temas e eventos.

E assim, mais coisa menos coisa, se passou mais um mes neste kubiko.

REVISTA ANGOLANA DE SOCIOLOGIA (No. 1)

A Revista Angolana de Sociologia, publicada semestralmente – em Junho e Dezembro, é um órgão da Sociedade Angolana de Sociologia (SASO) e publica textos da autoria de sociólogos e outros investigadores sociais, angolanos e de outras nacionalidades. A Revista Angolana de Sociologia é editada pela SASO (Luanda, Angola) e publicada pela Edições Pedago (Mangualde, Portugal).
Trata-se de um espaço de debate sobre temas actuais e relevantes não apenas da sociedade angolana, mas também das sociedades africanas e do mundo contemporâneo em geral.
O espírito da Revista Angolana de Sociologia (RAS) é estimular o debate, acolhendo e difundindo textos que contribuam para um diálogo transdisciplinar.
A RAS dirige-se não apenas a sociólogos, mas a todos os interessados em compreender de maneira rigorosa a complexidade e as dinâmicas dos fenómenos sociais contemporâneos.


[Mais detalhes aqui]
A Revista Angolana de Sociologia, publicada semestralmente – em Junho e Dezembro, é um órgão da Sociedade Angolana de Sociologia (SASO) e publica textos da autoria de sociólogos e outros investigadores sociais, angolanos e de outras nacionalidades. A Revista Angolana de Sociologia é editada pela SASO (Luanda, Angola) e publicada pela Edições Pedago (Mangualde, Portugal).
Trata-se de um espaço de debate sobre temas actuais e relevantes não apenas da sociedade angolana, mas também das sociedades africanas e do mundo contemporâneo em geral.
O espírito da Revista Angolana de Sociologia (RAS) é estimular o debate, acolhendo e difundindo textos que contribuam para um diálogo transdisciplinar.
A RAS dirige-se não apenas a sociólogos, mas a todos os interessados em compreender de maneira rigorosa a complexidade e as dinâmicas dos fenómenos sociais contemporâneos.


[Mais detalhes aqui]

JOS, NIGERIA: ANOTHER SENSELESS TRAGEDY


[Background and details here and here]


[Background and details here and here]

Thursday 27 November 2008

Wednesday 26 November 2008

FALECEU MICHEL LABAN

Com a devida venia e autorizacao da autora, transcrevo aqui uma homenagem a Michel Laban, falecido ontem em Paris:

Ilustre Professor e Investigador das Literaturas africanas de língua portuguesa tem-lhes dedicado desde os anos 70 do século passado grande parte do seu tempo, da sua pesquisa, da sua vida.
Deixou-nos uma ampla obra, só em parte publicada, dada a sua enorme modéstia.
Recordo-vos apenas os "Encontros com Escritores" de Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Cabo-Verde e Guiné-Bissau...autênticos monumentos de História oral, imprescindíveis para se conhecer a intelectualidade destes países e a época que os produziu. Um dicionário imenso de regionalismos e de neologismos de cada um dos escritores estudados, estava em permanente progresso. Era grande preocupação do Michel poder terminar este trabalho.
Tradutor exímio e exigente de grandes escritores da língua portuguesa, colocava o seu conhecimento, o da Zé (sua esposa, falante de português) e da sua velha mãe (falante de francês) ao serviço desta exigência, conseguindo que as suas traduções fossem tão belas quanto os livros traduzidos, por mais difíceis e herméticos que eles fossem.

Perdemos um grande investigador, um professor companheiro, um camarada de ideias e um grande Amigo para os que tiveram a felicidade de com ele privar.

Luisa d'Almeida
Historiadora Angolana
Com a devida venia e autorizacao da autora, transcrevo aqui uma homenagem a Michel Laban, falecido ontem em Paris:

Ilustre Professor e Investigador das Literaturas africanas de língua portuguesa tem-lhes dedicado desde os anos 70 do século passado grande parte do seu tempo, da sua pesquisa, da sua vida.
Deixou-nos uma ampla obra, só em parte publicada, dada a sua enorme modéstia.
Recordo-vos apenas os "Encontros com Escritores" de Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Cabo-Verde e Guiné-Bissau...autênticos monumentos de História oral, imprescindíveis para se conhecer a intelectualidade destes países e a época que os produziu. Um dicionário imenso de regionalismos e de neologismos de cada um dos escritores estudados, estava em permanente progresso. Era grande preocupação do Michel poder terminar este trabalho.
Tradutor exímio e exigente de grandes escritores da língua portuguesa, colocava o seu conhecimento, o da Zé (sua esposa, falante de português) e da sua velha mãe (falante de francês) ao serviço desta exigência, conseguindo que as suas traduções fossem tão belas quanto os livros traduzidos, por mais difíceis e herméticos que eles fossem.

Perdemos um grande investigador, um professor companheiro, um camarada de ideias e um grande Amigo para os que tiveram a felicidade de com ele privar.

Luisa d'Almeida
Historiadora Angolana

Friday 21 November 2008

"E Se........................?"

Totalmente "a desproposito" e extemporaneamente, breve referencia a este artigo de Luzia Moniz, publicado na edicao #292 de 22-29/11/2008 do Semanario Angolense:*



* [Por curiosidade, nao so', mas tambem, porque essa nao foi de facto "a primeira replica ao artigo matricial" - alias, e perdoe-se-me a "presuncao", tenho muitas razoes - mas especialmente o uso que nele fez do "sejamos claros" (que e' tambem como dizia, entre outros pre-datados, um certo alto espirita: "o problema que estamos com ele"...), que usei neste artigo, datado de 07/11/08, em relacao a questao central do "significado racial da vitoria de Obama" - para supor que o artigo de MC, publicado uma semana depois, nao tera' sido assim tao "matricial" quanto a primeira vista parecera', mas... como soi dizer-se, presuncao e agua benta cada um toma a que quer...), daquela mesma edicao decidi seleccionar um outro artigo que aqui entao postei - do que me viria a arrepender seriamente! E' que na altura ainda "nao sabia bem o que me esperava"!... E ja' agora: porque sera' que tambem nao 'reclamam' de o artigo da Luzia Moniz nao ter sido reproduzido na Africa 21?! ... Claramente Dois Pesos e Duas Medidas!!! Ai complexos, complexos... E se............. ?!]

"Comentario 1": Este blog nao so' nao e', nem se pretende, um "orgao de comunicacao social" formal ou "caixa de ressonancia" de tudo quanto e' publicado na imprensa lusofona ou de qualquer outro espaco linguistico ou geografico, como tambem nao e' patrocinado pelo Departamento de Estado Norte-Americano, estando a sua autora muito longe de ser representante da "comunidade internacional", ou porta-voz de Hillary Clinton ou de Assuncao dos Anjos [cujos governos se encontram actualmente engajados na estruturacao da sua "parceria estrategica" -- assunto que seria muito 'mais propositado', 'menos extemporaneo' e mais 'audaz' de ser tratado (e o que se segue nada tem a ver com a Luzia Moniz) por certas aspirantes a opinion makers nos orgaos de comunicacao social formal, mas que, quais elefantas numa loja de fina porcelana, nao conseguem passar de intriguistas irresponsaveis e copy-pasters e recyclers (para pior, excepto talvez no seu rebuscado e arcaico portugues de Camoes, o qual obviamente devem 'a sua "genuina portugalidade" ...), do (pouco!) que leem na diagonal nas introducoes e contracapas de livros alheios e das ideias, opinioes, informacoes, temas, debates, enfim, praticamente tudo que e' postado neste blog (excepto, obviamente, assuntos como "Viriato da Cruz e o PNCA", pois esses perigariam fatalmente os seus contratos de cooptacao actuais ou prospectivos com o poder!) - que aqui venhem, quais vultas famintas e piranhas mercenarias ensandecidas, todos os dias larapiar e rapinar a sorrelfa e a socapa!...] e, mais ainda, de se prestar a ser "comentarista" dos comentarios cobardemente nao assumidos ao que aqui e' publicado - excepto quando serias questoes eticas sao suscitadas por tais comentarios, nao apenas por isso, mas sobretudo por serem precisamente comentarios sistematicamente viciosos, insidiosos, dolosos, viperinos, traiçoeiros, raivosos, ofensivos, destrutivos, ameacadores, terroristas e, acima de tudo, remunerados (!) e nao provocados (!), em orgaos de comunicacao social formal!

"Comentario 2": Se ha' algum consolo de tudo isso, e' que pelo menos parecem estar a evoluir (ainda que apenas "a força", so' ate' ver e na maior parte so' para dizer disparates...): de cegueira partidaria para "independencia partidaria"... da intolerancia do convem sabermos sempre o que nos espera para "saudacoes especiais no dia internacional da tolerancia" e "o elogio do opinion maker"... do "intelectual revolucionario" ao "public intellectual", do poder popular e do 'voto nao secreto' para as "revolucoes tranquilas"... de Malcolm X, Marx e Said para Chomsky, Popper e Levi-Strauss... de etimologia para "epistemologia" e, pasme-se (!) ... de ideologia para "ciencia"!
Good, very good indeed!

Continuem a estagiar aqui, que um dia talvez cheguem la'... So' nao se esqueçam, mais uma vez, de creditar "a Sra. Professora" que, assim, aqui vai contribuindo incansavelmente para a "libertaçao das raparigas das amarras da discriminaçao a que sao votadas" !

Post Relacionado:

"E Se os Paises Africanos Fossem os EUA?"

(publicado aqui a 16/11/08 e referido aqui a 19/11/08).

Totalmente "a desproposito" e extemporaneamente, breve referencia a este artigo de Luzia Moniz, publicado na edicao #292 de 22-29/11/2008 do Semanario Angolense:*



* [Por curiosidade, nao so', mas tambem, porque essa nao foi de facto "a primeira replica ao artigo matricial" - alias, e perdoe-se-me a "presuncao", tenho muitas razoes - mas especialmente o uso que nele fez do "sejamos claros" (que e' tambem como dizia, entre outros pre-datados, um certo alto espirita: "o problema que estamos com ele"...), que usei neste artigo, datado de 07/11/08, em relacao a questao central do "significado racial da vitoria de Obama" - para supor que o artigo de MC, publicado uma semana depois, nao tera' sido assim tao "matricial" quanto a primeira vista parecera', mas... como soi dizer-se, presuncao e agua benta cada um toma a que quer...), daquela mesma edicao decidi seleccionar um outro artigo que aqui entao postei - do que me viria a arrepender seriamente! E' que na altura ainda "nao sabia bem o que me esperava"!... E ja' agora: porque sera' que tambem nao 'reclamam' de o artigo da Luzia Moniz nao ter sido reproduzido na Africa 21?! ... Claramente Dois Pesos e Duas Medidas!!! Ai complexos, complexos... E se............. ?!]

"Comentario 1": Este blog nao so' nao e', nem se pretende, um "orgao de comunicacao social" formal ou "caixa de ressonancia" de tudo quanto e' publicado na imprensa lusofona ou de qualquer outro espaco linguistico ou geografico, como tambem nao e' patrocinado pelo Departamento de Estado Norte-Americano, estando a sua autora muito longe de ser representante da "comunidade internacional", ou porta-voz de Hillary Clinton ou de Assuncao dos Anjos [cujos governos se encontram actualmente engajados na estruturacao da sua "parceria estrategica" -- assunto que seria muito 'mais propositado', 'menos extemporaneo' e mais 'audaz' de ser tratado (e o que se segue nada tem a ver com a Luzia Moniz) por certas aspirantes a opinion makers nos orgaos de comunicacao social formal, mas que, quais elefantas numa loja de fina porcelana, nao conseguem passar de intriguistas irresponsaveis e copy-pasters e recyclers (para pior, excepto talvez no seu rebuscado e arcaico portugues de Camoes, o qual obviamente devem 'a sua "genuina portugalidade" ...), do (pouco!) que leem na diagonal nas introducoes e contracapas de livros alheios e das ideias, opinioes, informacoes, temas, debates, enfim, praticamente tudo que e' postado neste blog (excepto, obviamente, assuntos como "Viriato da Cruz e o PNCA", pois esses perigariam fatalmente os seus contratos de cooptacao actuais ou prospectivos com o poder!) - que aqui venhem, quais vultas famintas e piranhas mercenarias ensandecidas, todos os dias larapiar e rapinar a sorrelfa e a socapa!...] e, mais ainda, de se prestar a ser "comentarista" dos comentarios cobardemente nao assumidos ao que aqui e' publicado - excepto quando serias questoes eticas sao suscitadas por tais comentarios, nao apenas por isso, mas sobretudo por serem precisamente comentarios sistematicamente viciosos, insidiosos, dolosos, viperinos, traiçoeiros, raivosos, ofensivos, destrutivos, ameacadores, terroristas e, acima de tudo, remunerados (!) e nao provocados (!), em orgaos de comunicacao social formal!

"Comentario 2": Se ha' algum consolo de tudo isso, e' que pelo menos parecem estar a evoluir (ainda que apenas "a força", so' ate' ver e na maior parte so' para dizer disparates...): de cegueira partidaria para "independencia partidaria"... da intolerancia do convem sabermos sempre o que nos espera para "saudacoes especiais no dia internacional da tolerancia" e "o elogio do opinion maker"... do "intelectual revolucionario" ao "public intellectual", do poder popular e do 'voto nao secreto' para as "revolucoes tranquilas"... de Malcolm X, Marx e Said para Chomsky, Popper e Levi-Strauss... de etimologia para "epistemologia" e, pasme-se (!) ... de ideologia para "ciencia"!
Good, very good indeed!

Continuem a estagiar aqui, que um dia talvez cheguem la'... So' nao se esqueçam, mais uma vez, de creditar "a Sra. Professora" que, assim, aqui vai contribuindo incansavelmente para a "libertaçao das raparigas das amarras da discriminaçao a que sao votadas" !

Post Relacionado:

"E Se os Paises Africanos Fossem os EUA?"

(publicado aqui a 16/11/08 e referido aqui a 19/11/08).

Wednesday 19 November 2008

JUST POETRY (III)


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Tuesday 18 November 2008

WHO IS BLACK?

Who Is Black?
One Nation’s Definition
By F. James Davis


Honored in 1992 as an "Outstanding Book" by the Gustavus Myers Center for the Study of Human Rights in the United States. Reprinted many times since its first publication in 1991, Who Is Black? has become a staple in college classrooms throughout the United States, helping students understand this nation's history of miscegenation and the role that the "one-drop rule" has played in it. In this special anniversary edition, the author brings the story up to date in an epilogue. There he highlights some revealing responses to Who Is Black? and examines recent challenges to the one-drop rule, including the multiracial identity movement and a significant change in the census classification of racial and ethnic groups.

From reviews of the original edition:

"This is a very well written book that communicates complex ideas with clarity and interest. It is rare, in my experience, for an academic book written by a social scientist to be as interesting and exciting as a piece of fiction. This book is hard to put down because Davis's story of how the United States as a nation came to define who is black reads like a mystery novel in which every historical event provides one more clue to the final murder of a people."—Aida Hurtado, in American Journal of Sociology

"Davis has given us a brilliant and informative history of the fateful policy commonly called the rule of hypodescent (the 'one-drop' rule) and the impact it has had psychologically, socially, economically, and politically on African-American history. Davis's book is the most recent in the series of works written on this topic, but is by far the most thorough and insightful."—
G. Reginald Daniel, in Contemporary Sociology

"This is an eye-opening appraisal of an issue often taken for granted in America."—Publishers Weekly

F. James Davis is Professor Emeritus of Sociology at Illinois State University and the author of Society and the Law (Free Press, 1962), Social Problems (Free Press, 1970), and Minority-Dominant Relations (AHM, 1978).

[More details here]
Who Is Black?
One Nation’s Definition
By F. James Davis


Honored in 1992 as an "Outstanding Book" by the Gustavus Myers Center for the Study of Human Rights in the United States. Reprinted many times since its first publication in 1991, Who Is Black? has become a staple in college classrooms throughout the United States, helping students understand this nation's history of miscegenation and the role that the "one-drop rule" has played in it. In this special anniversary edition, the author brings the story up to date in an epilogue. There he highlights some revealing responses to Who Is Black? and examines recent challenges to the one-drop rule, including the multiracial identity movement and a significant change in the census classification of racial and ethnic groups.

From reviews of the original edition:

"This is a very well written book that communicates complex ideas with clarity and interest. It is rare, in my experience, for an academic book written by a social scientist to be as interesting and exciting as a piece of fiction. This book is hard to put down because Davis's story of how the United States as a nation came to define who is black reads like a mystery novel in which every historical event provides one more clue to the final murder of a people."—Aida Hurtado, in American Journal of Sociology

"Davis has given us a brilliant and informative history of the fateful policy commonly called the rule of hypodescent (the 'one-drop' rule) and the impact it has had psychologically, socially, economically, and politically on African-American history. Davis's book is the most recent in the series of works written on this topic, but is by far the most thorough and insightful."—
G. Reginald Daniel, in Contemporary Sociology

"This is an eye-opening appraisal of an issue often taken for granted in America."—Publishers Weekly

F. James Davis is Professor Emeritus of Sociology at Illinois State University and the author of Society and the Law (Free Press, 1962), Social Problems (Free Press, 1970), and Minority-Dominant Relations (AHM, 1978).

[More details here]

Sunday 16 November 2008

E SE OS PAISES AFRICANOS FOSSEM OS ESTADOS UNIDOS DA AMERICA?


Eis uma hipotese tao ‘absurda’ quanto a que subjaz a interrogacoes do tipo “E se Obama fosse Africano?. Admitamos, portanto, que estamos em pleno ‘Reino do Absurdistao’ e tentemos imaginar uma Africa que fosse os Estados Unidos da Africa a moda Americana, ou os EUA Africanos.

1. Os EUA Africanos estariam independentes ha’ mais de dois seculos e nao teriam existido guerras de libertacao contra o colonialismo durante decadas. Caso, por alguma razao, tivessem existido ‘movimentos de libertacao’, estes tenderiam a perseguir os seus objectivos atraves de protestos, marchas, boicotes, discursos, musica, cancoes e sonhos, sendo pouco provavel que se organizassem em exercitos armados.

2. Os EUA Africanos teriam adoptado uma Constituicao guiada por ideais libertarios, tanto em termos de liberdade economica como individual e nao teriam adoptado regimes monopartidarios ou seguido estrategias de desenvolvimento socialista lideradas por ex-guerrilheiros marxistas ou maoistas coadjuvados por poetas e romancistas (por sinal quase exclusivamente brancos e mesticos), quando nao eles proprios poetas e romancistas, e auxiliados por acessores e conselheiros tecnicos estrangeiros.

3. Os lideres dos EUA Africanos, independentemente da sua raca, etnicidade, genero ou origem geografica, nao seriam simplesmente apontados e ‘entronados’ em posicoes governamentais ou empresariais com base na sua militancia partidaria, mais antiga ou mais recente, ou no seu nome de familia, mas teriam que, no primeiro caso, concorrer a eleicoes regulares sancionadas pelo sufragio universal, tanto a nivel do seu partido (a menos que concorressem como independentes) como a nivel nacional, em condicoes de igualdade com qualquer outro candidato elegivel e, no segundo caso, demonstrar as suas capacidades e competencias atraves de resultados positivos observaveis e sancionaveis pelos shareholders das suas empresas ou, dito de outro modo, teriam que ‘subir a pulso’.

4. Os tres pontos anteriores compoeem um quadro em que:

i) Caso tivessem sido instituidas por lei nos EUA Africanos ‘aberracoes’ institucionais como o “one drop rule”, o “estatuto do indigena” ou o “apartheid”, os grupos por elas excluidos, discriminados e prejudicados educacional, social e economicamente, teriam a dada altura – nao, porem, sem arduas lutas –, beneficiado de politicas como a “accao afirmativa” e a “discriminacao positiva”;

ii) Os proprietarios de terras nao o seriam apenas por expropriacao e confinamento a ‘reservas’, ou ‘bantustoes’, da maioria do resto da populacao, de tal modo que cerca de 98% da terra fertil ficasse na posse de cerca de 2% da populacao pertencente a apenas uma raca; os empresarios melhor sucedidos nao o seriam apenas por operarem em sectores protegidos pelo estado, cuja mao de obra era remunerada a uma taxa muito inferior a sua produtividade marginal e sem quaisquer direitos laborais. Em qualquer caso, nao o seriam apenas por pertencerem a uma infima minoria com acesso a educacao formal, a formacao tecnico-profissional e ao credito bancario.

iii) Salvo naqueles estados em que a constituicao o impedisse (mas, estando nos a navegar no ‘Reino do Absurdistao’ dos EUA Africanos, haveria apenas uma Constituicao que, tal como o enunciado em 2., o permitiria…), qualquer candidato a cargos publicos, incluindo a Presidencia dos nossos EUA, independentemente da sua raca ou de qualquer outro factor diferenciador, teria que passar pelo processo selectivo enunciado em 3., do qual ressalta o sufragio universal. Isto poderia permitir que, por exemplo – apenas por hipotese academica, ou ‘absurda’ se se preferir –, se Lucio Lara, mestico Angolano, se candidatasse a presidencia de Angola quando estava no auge da sua popularidade por altura da independencia, pudesse ter, dependendo da forma como articulasse e veiculasse a sua mensagem, organizasse a sua campanha e forjasse as suas aliancas, grandes chances de vencer o escrutinio popular. Mas, por outro lado, o mesmo processo impediria, por exemplo, que Jerry Rawlings, mestico Ghanense, tomasse o poder atraves de um golpe de estado militar e muito menos lhe permitiria que depois ainda viesse a ter um second coming… ou que Ian Khama, mestico Motswana, acedesse automaticamente a presidencia do Botswana ‘apenas’ por ser o numero dois do partido no poder desde a independencia ha’ mais de 40 anos, posicao a que nao foi de todo alheia a circunstancia de ser filho do presidente fundador daquele estado.


Sejamos claros: poderia o "mulato" Barack Obama ser eleito Presidente dos EUA Africanos?
YES HE COULD!

Eis uma hipotese tao ‘absurda’ quanto a que subjaz a interrogacoes do tipo “E se Obama fosse Africano?. Admitamos, portanto, que estamos em pleno ‘Reino do Absurdistao’ e tentemos imaginar uma Africa que fosse os Estados Unidos da Africa a moda Americana, ou os EUA Africanos.

1. Os EUA Africanos estariam independentes ha’ mais de dois seculos e nao teriam existido guerras de libertacao contra o colonialismo durante decadas. Caso, por alguma razao, tivessem existido ‘movimentos de libertacao’, estes tenderiam a perseguir os seus objectivos atraves de protestos, marchas, boicotes, discursos, musica, cancoes e sonhos, sendo pouco provavel que se organizassem em exercitos armados.

2. Os EUA Africanos teriam adoptado uma Constituicao guiada por ideais libertarios, tanto em termos de liberdade economica como individual e nao teriam adoptado regimes monopartidarios ou seguido estrategias de desenvolvimento socialista lideradas por ex-guerrilheiros marxistas ou maoistas coadjuvados por poetas e romancistas (por sinal quase exclusivamente brancos e mesticos), quando nao eles proprios poetas e romancistas, e auxiliados por acessores e conselheiros tecnicos estrangeiros.

3. Os lideres dos EUA Africanos, independentemente da sua raca, etnicidade, genero ou origem geografica, nao seriam simplesmente apontados e ‘entronados’ em posicoes governamentais ou empresariais com base na sua militancia partidaria, mais antiga ou mais recente, ou no seu nome de familia, mas teriam que, no primeiro caso, concorrer a eleicoes regulares sancionadas pelo sufragio universal, tanto a nivel do seu partido (a menos que concorressem como independentes) como a nivel nacional, em condicoes de igualdade com qualquer outro candidato elegivel e, no segundo caso, demonstrar as suas capacidades e competencias atraves de resultados positivos observaveis e sancionaveis pelos shareholders das suas empresas ou, dito de outro modo, teriam que ‘subir a pulso’.

4. Os tres pontos anteriores compoeem um quadro em que:

i) Caso tivessem sido instituidas por lei nos EUA Africanos ‘aberracoes’ institucionais como o “one drop rule”, o “estatuto do indigena” ou o “apartheid”, os grupos por elas excluidos, discriminados e prejudicados educacional, social e economicamente, teriam a dada altura – nao, porem, sem arduas lutas –, beneficiado de politicas como a “accao afirmativa” e a “discriminacao positiva”;

ii) Os proprietarios de terras nao o seriam apenas por expropriacao e confinamento a ‘reservas’, ou ‘bantustoes’, da maioria do resto da populacao, de tal modo que cerca de 98% da terra fertil ficasse na posse de cerca de 2% da populacao pertencente a apenas uma raca; os empresarios melhor sucedidos nao o seriam apenas por operarem em sectores protegidos pelo estado, cuja mao de obra era remunerada a uma taxa muito inferior a sua produtividade marginal e sem quaisquer direitos laborais. Em qualquer caso, nao o seriam apenas por pertencerem a uma infima minoria com acesso a educacao formal, a formacao tecnico-profissional e ao credito bancario.

iii) Salvo naqueles estados em que a constituicao o impedisse (mas, estando nos a navegar no ‘Reino do Absurdistao’ dos EUA Africanos, haveria apenas uma Constituicao que, tal como o enunciado em 2., o permitiria…), qualquer candidato a cargos publicos, incluindo a Presidencia dos nossos EUA, independentemente da sua raca ou de qualquer outro factor diferenciador, teria que passar pelo processo selectivo enunciado em 3., do qual ressalta o sufragio universal. Isto poderia permitir que, por exemplo – apenas por hipotese academica, ou ‘absurda’ se se preferir –, se Lucio Lara, mestico Angolano, se candidatasse a presidencia de Angola quando estava no auge da sua popularidade por altura da independencia, pudesse ter, dependendo da forma como articulasse e veiculasse a sua mensagem, organizasse a sua campanha e forjasse as suas aliancas, grandes chances de vencer o escrutinio popular. Mas, por outro lado, o mesmo processo impediria, por exemplo, que Jerry Rawlings, mestico Ghanense, tomasse o poder atraves de um golpe de estado militar e muito menos lhe permitiria que depois ainda viesse a ter um second coming… ou que Ian Khama, mestico Motswana, acedesse automaticamente a presidencia do Botswana ‘apenas’ por ser o numero dois do partido no poder desde a independencia ha’ mais de 40 anos, posicao a que nao foi de todo alheia a circunstancia de ser filho do presidente fundador daquele estado.


Sejamos claros: poderia o "mulato" Barack Obama ser eleito Presidente dos EUA Africanos?
YES HE COULD!

A PROPOSITO DO 11 DE NOVEMBRO

Não tinha ainda dez anos quando tomei consciência de que não era português, ao contrário do que me era dito pelo meu professor na escola primária de Calulo e pelas matérias que era obrigado a estudar. Muito cedo também percebi o significado da discriminação, pois os negros e os mulatos mais pobres não podiam estudar na escola oficial, mas apenas na da missão católica. Com o meu pai aprendi que Angola seria um dia um país independente e também o ideal de liberdade, traduzido na ideia de que os homens e os passarinhos não podem ser colocados em prisões e gaiolas.

Algum tempo depois (1959) tive conhecimento das prisões de lutadores pela independência efectuadas pela PIDE em Luanda. Foram eles os meus primeiros heróis vivos. Lembro-me igualmente da satisfação e do orgulho sentidos quando, na manhã de 4 de Fevereiro de 1961, cheguei ao Liceu Salvador Correia e soube do ataque às cadeias da PIDE, sentimento que tinha de esconder da maioria dos meus assustados colegas portugueses. A partir daí, acompanhei os avanços e recuos da luta independência e sofri com as fraquezas do movimento de libertação, traduzidas em traições e deserções, na deficiência das estratégias de combate, nas divisões regionais e raciais, no desconhecimento das mudanças que iam acontecendo no país, nas divergências entre as lideranças e, sobretudo, na falta de uma visão de longo prazo que pudesse mobilizar de forma mais efectiva os angolanos e os amigos de Angola para a grande causa.

O 25 de Abril em Portugal constituiu uma preciosa ajuda, mas as fraquezas que vinham de trás permitiram que a transição para a independência se processasse de forma caótica, a economia se degradasse (principalmente nas áreas rurais), as instituições entrassem em colapso, as divisões entre os angolanos se agudizassem e, como corolário, que a guerra civil tivesse lugar. Fui alimentando o sonho de uma Angola próspera, pacífica, solidária, inclusiva e principalmente com muita justiça social num quadro de final do século XX.

A realidade foi dolorosamente diferente. Mas acho inadmissível que figuras da oposição atribuam exclusivamente ao Governo a responsabilidade dos males que nos afligiram e que alimentam a ideia de que muitos angolanos estão “fartos” da independência. A primeira vez que eu vi uma referência a isso foi num artigo publicado de um oposicionista do regime que rapidamente se transformou numa anedota. Segundo ele, um grupo de sobas da Baixa de Kassanji teria dito isso a Agostinho Neto numa reunião no Quela (Malanje), pouco tempo antes da sua morte. Eu estava presente nessa reunião, e não ouvi nada semelhante a isso. Já o disse várias vezes, mas não me canso de repetir. Perguntei inúmeras vezes, a camponeses angolanos se isso era verdade e a resposta tem sido sempre a mesma, pois ninguém está disposto a abrir mão das que consideram ter sido as três maiores conquistas da independência: a recuperação das terras dos seus ancestrais, o fim do trabalho obrigatório ou compulsivo e o respeito pela sua dignidade, traduzida no termo das prisões arbitrárias ou das agressões físicas, ou até em factos mais simples como o aperto de mão com que são saudados pelas autoridades administrativas.

Não tinha ainda dez anos quando tomei consciência de que não era português, ao contrário do que me era dito pelo meu professor na escola primária de Calulo e pelas matérias que era obrigado a estudar. Muito cedo também percebi o significado da discriminação, pois os negros e os mulatos mais pobres não podiam estudar na escola oficial, mas apenas na da missão católica. Com o meu pai aprendi que Angola seria um dia um país independente e também o ideal de liberdade, traduzido na ideia de que os homens e os passarinhos não podem ser colocados em prisões e gaiolas.

Algum tempo depois (1959) tive conhecimento das prisões de lutadores pela independência efectuadas pela PIDE em Luanda. Foram eles os meus primeiros heróis vivos. Lembro-me igualmente da satisfação e do orgulho sentidos quando, na manhã de 4 de Fevereiro de 1961, cheguei ao Liceu Salvador Correia e soube do ataque às cadeias da PIDE, sentimento que tinha de esconder da maioria dos meus assustados colegas portugueses. A partir daí, acompanhei os avanços e recuos da luta independência e sofri com as fraquezas do movimento de libertação, traduzidas em traições e deserções, na deficiência das estratégias de combate, nas divisões regionais e raciais, no desconhecimento das mudanças que iam acontecendo no país, nas divergências entre as lideranças e, sobretudo, na falta de uma visão de longo prazo que pudesse mobilizar de forma mais efectiva os angolanos e os amigos de Angola para a grande causa.

O 25 de Abril em Portugal constituiu uma preciosa ajuda, mas as fraquezas que vinham de trás permitiram que a transição para a independência se processasse de forma caótica, a economia se degradasse (principalmente nas áreas rurais), as instituições entrassem em colapso, as divisões entre os angolanos se agudizassem e, como corolário, que a guerra civil tivesse lugar. Fui alimentando o sonho de uma Angola próspera, pacífica, solidária, inclusiva e principalmente com muita justiça social num quadro de final do século XX.

A realidade foi dolorosamente diferente. Mas acho inadmissível que figuras da oposição atribuam exclusivamente ao Governo a responsabilidade dos males que nos afligiram e que alimentam a ideia de que muitos angolanos estão “fartos” da independência. A primeira vez que eu vi uma referência a isso foi num artigo publicado de um oposicionista do regime que rapidamente se transformou numa anedota. Segundo ele, um grupo de sobas da Baixa de Kassanji teria dito isso a Agostinho Neto numa reunião no Quela (Malanje), pouco tempo antes da sua morte. Eu estava presente nessa reunião, e não ouvi nada semelhante a isso. Já o disse várias vezes, mas não me canso de repetir. Perguntei inúmeras vezes, a camponeses angolanos se isso era verdade e a resposta tem sido sempre a mesma, pois ninguém está disposto a abrir mão das que consideram ter sido as três maiores conquistas da independência: a recuperação das terras dos seus ancestrais, o fim do trabalho obrigatório ou compulsivo e o respeito pela sua dignidade, traduzida no termo das prisões arbitrárias ou das agressões físicas, ou até em factos mais simples como o aperto de mão com que são saudados pelas autoridades administrativas.

Friday 14 November 2008

SIYABONGA MAMA AFRIKA




Mashakane


Pictures: Last performance by Miriam Makeba in South Africa
(Cape Town International Jazz Festival, 2005) by Ana Santana

Monday 10 November 2008

MIRIAM MAKEBA (R.I.P.)



Free file hosting by Ripway.com
Where Are You Going?
in Reflections (Last album by Miriam Makeba)
Composed by Hugh Masekela


The mud of my feet, mother,
Is from the long journey
I made, deluded that at the end
I should find wisdom and peace.
I trudged the hot red roads
And the hills that strive to touch the stars,
And came upon a clear river
In the folds of a valley.

Kwesi Brew




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Where Are You Going?
in Reflections (Last album by Miriam Makeba)
Composed by Hugh Masekela


The mud of my feet, mother,
Is from the long journey
I made, deluded that at the end
I should find wisdom and peace.
I trudged the hot red roads
And the hills that strive to touch the stars,
And came upon a clear river
In the folds of a valley.

Kwesi Brew


Sunday 9 November 2008

BE MY GUEST! (VI. LUIS)

Luis is a regular contributor to this blog since the early days and has been a good friend of mine for a good decade now, since we met at the LSE where he was preparing his PhD and I my MSc.
Born in Mozambique of Portuguese and Chinese parentage, he lives in Portugal since his early childhood and is very much a citizen of the world.
The piece he presents here draws partly on his fieldwork in South Korea. He promised it here and now (finally!) delivered the goods.
Enjoy.

THE “REVENGE” OF THE STATE

For the best part of the past three decades, policymakers in the developed world followed Ronald Reagan and Margaret Thatcher in pursuing the idea of a “minimal state” as the best solution to economic growth. Privatisation, deregulation and liberalisation progressively became the all-mighty mantra of the market pundits to be exported to the developing world. Yet, as the current financial and subsequent economic crises have shown us all, the state is still a much needed actor.

This is even more relevant when we are talking about which policies should developing countries follow in their path to economic growth and development and as we begin to observe a shifting power from the West to East Asia. Why? Because most of us seem to be unaware of how in the first place did the East get into this position and the economic and financial lessons that maybe other developing countries can derive from it.

Several scholars sought to explain the successful economic performance of East Asia by looking at the interventionist and leading role played by the state. For example, analysing the Japanese case, Chalmers Johnson (1982) introduced the concept of the “developmental capitalist state” as one which seeks economic development through high rates of growth, productivity and competitiveness. Six main policy features are regarded as crucial to explain the performance of the East Asian developmental states: (1) redistributive land reform; (2) state-controlled financial system; (3) macroeconomic stability to nurture long-term investment; (4) industrial policy that favoured simultaneously import substitution and export-led production; (5) protection and investment in the agricultural sector as well as improvement of rural livelihoods; (6) and income policies that produced a more equitable income distribution and higher living standards. As a whole, all these policies are correlated with the East Asian successful economic performance. However, industrial policy and financial control, in particular, stand at the core of the East Asian developmental states’ peculiar way of organising the market.

According to developmental state literature, the economic performance of East Asia is strongly associated with a series of key mechanisms devised by the interventionist state to organise the financial system and define the blueprint for industrial development. These key features make up what is known as the system of “socialisation of private risk”: (1) in a closely regulated bank-based system as in Korea or Taiwan, enterprises were inclined to make better investment decisions, because they were offered the opportunity to develop long-term strategies. As this relationship strengthened over time, and as long as firms’ investments followed long-term plans, loans were rolled over even if the returns were not as immediate as thought; (2) the bank-based system allowed for a faster allocation of capital to strategic industrial sectors and granted the state the capacity to control the financial flows; (3) close relations between banks and firms improved collection and the processing of information, allowed the monitoring of management performance, and eased restructuring of firms undergoing difficulties and; (4) control over the financial system offered the state the political leverage to build up the coalitions necessary to implement the industrial and development strategies. In this sense, the public-private co-operation usually present in East Asia was far from being an outcome of voluntary compliance by the business groups as they were discouraged from opposing the state under threat of possible loss of access to credit (Wade 1990).

Additionally, this literature claims that this cooperative system between state, banks and firms succeeded because it obeyed certain “imperatives”: (1) the state sustained the risks involved in the investments. This socialised risk took the form of: deposit insurance, lender-of-last-resort, subsidies to banks dangerously exposed to loan losses and firms in financial difficulties, banks’ shareholding in firms, or state-owned banks; (2) the creditor was involved in the firm management, and did not pull out when the company was under distress showing instead commitment with the restructuring of its management; (3) the state and the banks were able to distinguish between ‘responsible’ and ‘irresponsible’ borrowings, and disciplined the latter. This capacity allowed the state to avoid bailing out firms and moral hazard. Simultaneously, the government was also careful to monitor the activities of the financial intermediaries to impede them, for example, from hiding non-performing loans (NPLs); (4) the existence of a ‘central guiding agency’ was crucial to complement market signals with its own signals as to which sectors would be most profitable; ((5) finally, the state regulated international capital flows which granted it the capacity to control money supply and the cost of capital to domestic firms as well as to set and manage the development of strategic industrial sectors.

Importantly, underneath the East Asian system of “socialisation of private risk” are “hard states”, i.e., states that are “able not only to resist private demands but actively shape the economy and society (Wade, 1990). A competent bureaucracy usually led by a pilot agency in charge of formulating and implementing economic policies is the leading actor in the process of economic change and development. It is this bureaucracy that in fact “guided” the market, and implemented the consistent, coherent, and rational system of “socialisation of private risk”. As Robert Wade puts it, “in this kind of political regime, the bureaucracy can more easily demonstrate competence and remain ‘clean’, because it is neither caught between and penetrated by struggling interest groups nor subverted from above by the politics of rulers’ survival”(Wade, 1990). In tandem, ongoing organisational and institutional linkages between the government and the private sector eased the stream of information exchange, facilitated co-operation, policy coordination, implementation and goal consensus (Okimoto, 1989).

Thus, the developmental state is basically one where the autonomy of the bureaucracy is complemented by an unusual degree of private-public co-operation. The difference between East Asia and other late industrialising economies did not rest in the invention of industrial policy and financial control mechanisms as “many other nations have at one time or another tried most of the policy tools used in East Asia” (Wade, 1990). For Alice Amsden (1992), what distinguished East Asia was the willingness of states to behave in relation to the private sector as “disciplinarian agents, imposing performance standards while allocating subsidies for industrial development.”

Of course this is not the whole story but is a big part of it……

[References]
Luis is a regular contributor to this blog since the early days and has been a good friend of mine for a good decade now, since we met at the LSE where he was preparing his PhD and I my MSc.
Born in Mozambique of Portuguese and Chinese parentage, he lives in Portugal since his early childhood and is very much a citizen of the world.
The piece he presents here draws partly on his fieldwork in South Korea. He promised it here and now (finally!) delivered the goods.
Enjoy.

THE “REVENGE” OF THE STATE

For the best part of the past three decades, policymakers in the developed world followed Ronald Reagan and Margaret Thatcher in pursuing the idea of a “minimal state” as the best solution to economic growth. Privatisation, deregulation and liberalisation progressively became the all-mighty mantra of the market pundits to be exported to the developing world. Yet, as the current financial and subsequent economic crises have shown us all, the state is still a much needed actor.

This is even more relevant when we are talking about which policies should developing countries follow in their path to economic growth and development and as we begin to observe a shifting power from the West to East Asia. Why? Because most of us seem to be unaware of how in the first place did the East get into this position and the economic and financial lessons that maybe other developing countries can derive from it.

Several scholars sought to explain the successful economic performance of East Asia by looking at the interventionist and leading role played by the state. For example, analysing the Japanese case, Chalmers Johnson (1982) introduced the concept of the “developmental capitalist state” as one which seeks economic development through high rates of growth, productivity and competitiveness. Six main policy features are regarded as crucial to explain the performance of the East Asian developmental states: (1) redistributive land reform; (2) state-controlled financial system; (3) macroeconomic stability to nurture long-term investment; (4) industrial policy that favoured simultaneously import substitution and export-led production; (5) protection and investment in the agricultural sector as well as improvement of rural livelihoods; (6) and income policies that produced a more equitable income distribution and higher living standards. As a whole, all these policies are correlated with the East Asian successful economic performance. However, industrial policy and financial control, in particular, stand at the core of the East Asian developmental states’ peculiar way of organising the market.

According to developmental state literature, the economic performance of East Asia is strongly associated with a series of key mechanisms devised by the interventionist state to organise the financial system and define the blueprint for industrial development. These key features make up what is known as the system of “socialisation of private risk”: (1) in a closely regulated bank-based system as in Korea or Taiwan, enterprises were inclined to make better investment decisions, because they were offered the opportunity to develop long-term strategies. As this relationship strengthened over time, and as long as firms’ investments followed long-term plans, loans were rolled over even if the returns were not as immediate as thought; (2) the bank-based system allowed for a faster allocation of capital to strategic industrial sectors and granted the state the capacity to control the financial flows; (3) close relations between banks and firms improved collection and the processing of information, allowed the monitoring of management performance, and eased restructuring of firms undergoing difficulties and; (4) control over the financial system offered the state the political leverage to build up the coalitions necessary to implement the industrial and development strategies. In this sense, the public-private co-operation usually present in East Asia was far from being an outcome of voluntary compliance by the business groups as they were discouraged from opposing the state under threat of possible loss of access to credit (Wade 1990).

Additionally, this literature claims that this cooperative system between state, banks and firms succeeded because it obeyed certain “imperatives”: (1) the state sustained the risks involved in the investments. This socialised risk took the form of: deposit insurance, lender-of-last-resort, subsidies to banks dangerously exposed to loan losses and firms in financial difficulties, banks’ shareholding in firms, or state-owned banks; (2) the creditor was involved in the firm management, and did not pull out when the company was under distress showing instead commitment with the restructuring of its management; (3) the state and the banks were able to distinguish between ‘responsible’ and ‘irresponsible’ borrowings, and disciplined the latter. This capacity allowed the state to avoid bailing out firms and moral hazard. Simultaneously, the government was also careful to monitor the activities of the financial intermediaries to impede them, for example, from hiding non-performing loans (NPLs); (4) the existence of a ‘central guiding agency’ was crucial to complement market signals with its own signals as to which sectors would be most profitable; ((5) finally, the state regulated international capital flows which granted it the capacity to control money supply and the cost of capital to domestic firms as well as to set and manage the development of strategic industrial sectors.

Importantly, underneath the East Asian system of “socialisation of private risk” are “hard states”, i.e., states that are “able not only to resist private demands but actively shape the economy and society (Wade, 1990). A competent bureaucracy usually led by a pilot agency in charge of formulating and implementing economic policies is the leading actor in the process of economic change and development. It is this bureaucracy that in fact “guided” the market, and implemented the consistent, coherent, and rational system of “socialisation of private risk”. As Robert Wade puts it, “in this kind of political regime, the bureaucracy can more easily demonstrate competence and remain ‘clean’, because it is neither caught between and penetrated by struggling interest groups nor subverted from above by the politics of rulers’ survival”(Wade, 1990). In tandem, ongoing organisational and institutional linkages between the government and the private sector eased the stream of information exchange, facilitated co-operation, policy coordination, implementation and goal consensus (Okimoto, 1989).

Thus, the developmental state is basically one where the autonomy of the bureaucracy is complemented by an unusual degree of private-public co-operation. The difference between East Asia and other late industrialising economies did not rest in the invention of industrial policy and financial control mechanisms as “many other nations have at one time or another tried most of the policy tools used in East Asia” (Wade, 1990). For Alice Amsden (1992), what distinguished East Asia was the willingness of states to behave in relation to the private sector as “disciplinarian agents, imposing performance standards while allocating subsidies for industrial development.”

Of course this is not the whole story but is a big part of it……

[References]

O QUE NOSOTROS ANDAMOS PR'AQUI A PERDER...(6)

[Mais obras de Mayembe aqui]

Friday 7 November 2008

ECOS DA VITORIA DE OBAMA NO SA

BREVES NOTAS SOBRE “O SIGNIFICADO RACIAL DA VITORIA DE OBAMA” (*)

1. Ja’ aqui referi algumas vezes a minha conviccao de que a raca e o(s) racismo(s) dela derivado(s) sao um “constructo ideologico datado no tempo historico” cujo principal objectivo e’ a construcao de hierarquias sociais. E’, portanto, com bastante interesse que venho observando a forma como a “raca” de Obama tem sido ‘construida’ e ‘desconstruida’ em diferentes contextos sociais durante a longa campanha para a Presidencia Americana que acaba de ter como desfecho a sua vitoria.

Nao sendo sociologa ou antropologa – disciplinas que, em principio, mais se centram nesse tipo de analise –, as conclusoes que retiro das minhas observacoes baseam-se, por um lado, nas minhas proprias experiencias individuais e, por outro lado, nos instrumentos de analise historica que me permitem aferir que qualquer tentativa de extrapolacao de uma determinada realidade historico-social e economica para outra sera’, no minimo, um exercicio especulativo mal avisado, particularmente se desprovido de salvaguardas analiticas previas assentes numa solida base de evidencia empirica.

2. Tambem ja’ aqui mencionei a importancia de se ter em mente, quando se tenta “analisar” Obama e a sua vitoria do ponto de vista racial, a diferenca fundamental entre o constructo raca/racismo nos EUA e o mesmo constructo noutros contextos historicos, nomeadamente no ‘mundo lusofono’. Essa diferenca resume-se basicamente a dois factores principais:

i) Nos EUA ‘construiram-se’ de inicio essencialmente tres grupos racicos – o branco, o negro e o indio, ou amerindio – sendo que o ultimo, por ter sido quase completamente dizimado ou miscigenado, “passou tendencialmente a historia” como um grupo “indigena” (notem-se as semelhancas e dissemelhancas entre o apelativo “indigena” no contexto americano e no contexto colonial portugues, e.g. “O Estatuto Indigena” no quadro da politica assimilacionista em Angola; note-se tambem esta discussao da "questao indigena" nos EUA, que ja aqui havia anteriormente postado).

Ao longo da historia americana, verificaram-se varios graus e combinacoes de miscigenacao racial entre esses grupos, mas a ‘bitola de construcao social’ ao longo de linhas raciais foi estabelecida institucionalmente com base no principio do “one drop rule”, de acordo com o qual alguem que tivesse uma gota de sangue negro nao poderia ter qualquer outra classificacao socio-racial que nao a de “negro” (note-se tambem aqui que a designacao “mulato”, por ser derivada de “mula” no contexto escravocrata, assumiu historicamente uma conotacao altamente pejorativa nos EUA, ao contrario do que se passa no ‘mundo lusofono’ - veja-se o filme Sankofa, de Haile Gerima, para um notavel tratamento desta questao).

A designacao “negro”, por sua vez, sofreu varias alteracoes ao longo da historia americana, tendo-se mantido como a designacao de consenso para os “nao brancos” ou “indigenas” ate’ meados da decada de 60 do seculo passado, sendo substituida naquele consenso por “black” (muito por conta do mestico Malcolm X, como aqui 'poemiza' o mestico Gil Scott-Heron, e dos Black Panthers, que tinham uma lideranca predominantemente mestica, como a imagem de Angela Davis lembrara' a muita gente, e tambem dos negros Nina Simone e James Brown que a popularizaram com a cancao "Say It Loud: I'm Black and I'm Proud!") entre finais daquela decada e finais da de 80 e, finalmente, pela de “afro-americano” ate’ aos dias de hoje, embora estas duas ultimas continuem a coexistir em varios contextos e tambem se venha notando nos ultimos tempos a ‘ascensao’ de designacoes como brown e bi-racial por alguns mesticos (o termo coloured, ou of colour, embora tambem usado, nunca chegou a ser tao consensual nos EUA como na Africa do Sul). Nas adicoes de varias proveniencias ao melting pot Americano, outros grupos se foram juntando e inter-relacionando e igualmente se definindo de acordo com as suas origens (e.g. “afro-latino”, “latino-americano”, “hispano-americano”, etc.).

No entanto, sendo a America fundamentalmente a terra da “livre competicao economica” e da “igualdade de oportunidades” que consubstanciam o mitico “American Dream” e sao consagrados na Constituicao dos EUA sob o espirito de "We hold these truths to be self-evident, that all men are created equal", este constructo ideologico-doutrinario cedo entrou em choque e em competicao com aquele outro constructo da formacao de hierarquias sociais com base exclusivamente na raca. E’ neste contexto que se situam as varias lutas, primeiro contra o esclavismo, depois contra o segregacionismo e mais tarde pelos direitos civico-politicos dos negros americanos, os quais sempre contaram com a adesao e o apoio, directa ou indirectamente, de segmentos, maiores ou menores, de outros grupos racicos, nomeadamente brancos, senao por razoes estritamente ideologico-doutrinarias, seguramente por razoes economicas, expressas de forma mais ou menos explicita em determinados momentos historicos, dos quais o papel economico da escravatura na genese, alinhamentos racicos e desfecho da Guerra Civil Americana e' o exemplo mais emblematico.

Assim, nao sera’ inteiramente por acaso que o actual estado da economia americana e da economia global, atribuido quase inteiramente a administracao Republicana dos ultimos 8 anos, contribuiu decisivamente para galvanizar a maioria do eleitorado americano a volta de um candidato Democrata que, por acaso, e’ negro, ou afro-americano, como se preferir, que soube apresentar as propostas mais crediveis para a resolucao da crise actual (passando pela adopcao dos passos necessarios ao termino da guerra no Iraque, contra a qual ele foi o unico candidato que se manifestou desde o inicio). Que essa vitoria se tenha tambem “construido” como uma “vitoria da raca sobre o genero” nao deixa de ser interessante, mas constitui questao para outra discussao.

ii) A historia da formacao de hierarquias sociais com base no constructo raca/racismo noutros contextos historicos, e particularmente no ‘mundo lusofono’, assume claramente contornos bastante distintos do caso americano. Em primeiro lugar e fundamentalmente, porque nao foi institucionalmente adoptado o “one drop rule” e a hierarquia social entre os “nao brancos” foi institucionalmente mais claramente definida, assumida e implementada pelo poder colonial ao longo dos varios graus de miscigenacao entre brancos e negros dando lugar a varios grupos: desde os “cafusos”, ou “pardos”, aos “mulatos” e aos “cabritos”. Ou seja, foi instituida, em vez do “one drop rule”, a regra do “divide and rule”.

Mas, talvez mais determinante do lugar social de cada um desses grupos, foi instituida uma maior rigidez estrutural em termos de mobilidade social e economica comparativamente aos EUA, a qual se tornou ainda mais dificil de transpor pelos grupos mais proximos do “estatuto de indigena” (ou seja, a maioria da populacao - e aqui estou a pensar particularmente no caso de Angola), por razoes de ordem historica, cultural, tribal e etno-linguistica dos paises em questao.

Isso num contexto em que, contrariamente ao constructo doutrinario-ideologico do “American Dream” em que, em principio, qualquer individuo, independentemente das suas origens, poderia assumir qualquer posicao social desde que seguisse as “regras do jogo” da politica do integracionismo, nas nossas sociedades o lugar social do individuo continuava a ser determinado por uma hierarquia baseada na “raca”, na “tribo” e na “etnia”, mesmo quando os individuos tivessem passado “todos os testes” da politica assimilacionista (ou, como soi dizer-se em certos tugurios lusosfericos, continuavam a ter que tirar os sapatos para poderem contar ate' 12 e a cair das copas das arvores mesmo depois de terem passado por universidades...).

E essa realidade ainda esta’ presente nos dias de hoje nas nossas sociedades, senao estritamente em termos politico-ideologicos e da simbologia do poder, certamente em termos socio-culturais e economicos (a nao confundir aqui o desiderato, ainda por satisfazer, de se criarem mecanismos efectivos de distribuicao dos rendimentos nacionais por todos os segmentos populacionais, com as fortunas, grandes ou pequenas, adquiridas em alguns casos ilicitamente, por alguns membros das elites ditas “predadoras” ou “endocoloniais” associadas ao poder do periodo post-independencias).

Mas, tal como nos EUA, e essa talvez seja a maior semelhanca entre os dois contextos, outros grupos coexistiram com os grupos raciais basicos da construcao social colonial, integrando-se socio-cuturalmente, contudo, segundo criterios igualmente hierarquicos, nos quais se situavam os chamados “brancos de segunda”, os “indianos” e, interessantemente, os “cabo-verdianos”, entre alguns outros.

3. Ora, das consideracoes anteriores segue-se que, como acima notei, sera’ sempre desavisado tentar-se transpor o “significado da vitoria de Obama” nos EUA, para outros contextos historico-sociais, e particularmente para o ‘mundo lusofono’, com base na sua “constituicao”, ou “construcao”, racial, pelas seguintes razoes fundamentais:

i) Em primeiro lugar, porque os mecanismos de ascencao politica e de obtencao do poder nos EUA sao drasticamente diferentes, em termos tanto constitucionais, como institucionais e ideologicos, dos que vigoram de forma geral nos nossos paises, e muito particularmente nos paises Africanos que adoptaram estrategias de inspiracao marxista durante a luta anti-colonial e no seu post-independencia;

ii) Em segundo lugar, porque a experiencia da America enquanto colonia foi relativamente curta e em moldes bastante diversos dos que marcaram a experiencia colonial Africana (o que a torna, por exemplo, mais similar a experiencia do Brasil do que a de outros espacos do ‘mundo lusofono’);

iii) Em terceiro lugar, porque ao longo dos seculos de debate, formulacao e reformulacao do “lugar social da raca” nos EUA, uma questao que ficou estabelecida com bastante clareza, e ela deriva grandemente dos principios da liberdade individual e dos direitos humanos que integram o “American Dream” (claro que assumido aqui como apenas isso mesmo – um sonho, um ideal – mas um sonho, um ideal que a historia dos EUA tem largamente vindicado, sendo a vitoria de Obama apenas o ultimo exemplo disso mesmo), e’ que se ha’ algo fundamentalmente errado com o “constructo raca/racismo” e’ que ele constitui a definicao de uma parte da raca humana por outra, nomeadamente a dos grupos dominados pelos grupos dominadores, particularmente na sequencia da gesta dos “descobrimentos” (note-se como esta questao de to be defined by others e’ abordada numa mensagem que John Lennon le numa discussao sobre o termo “nigger” cujo link coloquei nos comentarios a este post) .

E e’ fundamentalmente isso que, quanto a mim, torna as tentativas de definicao de Obama como “mulato” (note-se, mais uma vez, a carga pejorativa desta designacao nos EUA) e de reivindicacao da sua vitoria por determinados grupos raciais nos nossos paises, tao ofensivo quanto perturbador. Desde logo porque quando se tenta "dissecar" a sua composicao genetica como se de um especimen de laboratorio se tratasse, deve ter-se em conta que, tal como ele afirmou em varias ocasioes, mas mais enfaticamente no seu discurso sobre a raca nos EUA, "A America e' mais do que a soma das suas partes", qualquer ser humano e' tambem muito mais do que a mera soma das suas partes. Depois porque ele proprio, se alguma vez se definiu em termos racicos – e num contexto de anti-racismo e de defesa das liberdades fundamentais do individuo essa e’ a unica definicao que realmente conta e deve contar e ser respeitada – fe-lo como “negro”, ou como “afro-americano”, assumindo nessa definicao toda a complexidade do seu background familiar e individual, como filho de pai negro-africano e de mae branca (naturalmente de ascendencia europeia, como o sao todos os brancos a face da terra…), de nome arabe, criado no Hawai por avos brancos, estudado na Indonesia, mas… crescido e amadurecido, casado e socializado cultural, religiosa e politicamente no seio da comunidade negra americana.

Isto e’, ele define-se por relacao a sua propria experiencia politica e socio-cultural e nao necessariamente por oposicao a de outros (tambem como eu propria o fiz a minha maneira, muito contra a corrente diga-se, neste artigo...), mesmo porque, como ele proprio afirmou no contexto da maka sobre o Reverendo Wright (alguem que, note-se, tal como Colin Powell por exemplo, no ‘mundo lusofono’ seria classificado e socializado como “cabrito”, mas que nos EUA nao contempla classificar-se de outro modo senao como “negro”): “eu nao o posso renegar, tal como nao posso renegar a minha avo branca em quem, apesar de me ter criado, observei manifestacoes de preconceito racial em relacao ao negro”. Ora, essa definicao “por si proprio” e nao “por outros” ou “contra outros” foi essencialmente o que lhe permitiu ser apelativo a praticamente todos os grupos racicos nos EUA e um pouco por todo o mundo e e’ o que torna a sua vitoria tao bonita!

Porque quererao entao alguns, particularmente se em sociedades completamente distintas dos EUA, estragar essa beleza tentando aplicar-lhe criterios de definicao racica que lhe sao completamente estranhos e, pior ainda, tentar reivindicar a sua vitoria como uma bandeira exclusiva de um particular grupo racico, o dos auto-definidos “mulatos” no ‘mundo lusofono’, quando a propria designacao “mulato” constituiria para si uma ofensa, quanto mais nao seja porque a sua miscigenacao nao derivou do particular contexto historico em que essa designacao foi adoptada nos EUA, isto e’ a escravatura, o que alias lhe mereceu o relativo alheamento, quando nao aberta hostilidade, de alguns segmentos da comunidade afro-americana descendente de escravos, nao apenas mas sobretudo porque ele proprio e' descendente pelo lado materno de donos de escravos? Mas nao seria apenas a designacao “mulato” que tenho poucas duvidas ele regeitaria (quanto muito, aceitaria mais facilmente a designacao geralmente adoptada nos EUA para os mesticos: “mixed-race”), como tambem a de “branco” que alguns no 'mundo lusofono' tambem lhe pretendem “a viva forca” aplicar pelo facto de ter nascido de mae branca…

Ou seja, continua-se em alguns sectores do ‘mundo lusofono’ a pensar a “raca” ainda em termos hierarquicos (sendo bastante elucidativo disto o modo como alguns nesse mundo equacionam a questao em termos de "racismo de cima para baixo e de baixo para cima" - estando "em cima" o branco e "em baixo" o negro, com o mestico "no meio"...), de tal modo que, aparentemente para tais sectores, a forma como Obama se auto-identifica parece nao ter qualquer importancia, ou mesmo como se a forma como ele se posiciona ‘racicamente’ nao tivesse tido qualquer relevancia para a sua eleicao: sejamos claros, se ele se identificasse social e culturalmente como “mulato”, ou como “branco”, nao so’ seria ridicularizado, ostensiva ou dissimuladamente, pelos brancos americanos, como dificilmente teria obtido o voto maioritario do grupo “afro-americano”, o qual, como de resto se observou nas manifestacoes de voto nos estagios iniciais da campanha, inclui segmentos que teriam preferido votar noutro candidato, independentemente da sua raca ou genero e que, sendo embora minoritario, foi decisivo para a sua vitoria - particularmente nas primarias e sua consequente nomeacao como candidato pelo partido Democrata.

Grupo “afro-americano” esse onde, nunca e’ demais repeti-lo, se incluem todos os nao-brancos desde que tenham uma gota de sangue negro. E, se e’ certo que o "one drop rule" foi inicialmente uma criacao do grupo dominante branco nos EUA com motivacoes racistas, nao e’ menos certo que ele foi apropriado, internalizado e socializado historicamente pelos “afro-americanos” que – ao contrario, nunca e’ demais nota-lo, do que se passou e em grande medida ainda se passa nas ex-colonias portuguesas onde se instituiu uma diferenciacao racica hierarquizante de acordo com os varios tons de pele entre negros e brancos – partilharam ao longo de seculos em condicoes de igualdade tanto a discriminacao racial contra si (vide o caso da 'cabrita' Rosa Parks), como as oportunidades sociais, politicas e economicas que souberam conquistar para si (vide o caso da 'negra' Oprah Winfrey) como um unico grupo racico, pesem embora as clivagens e friccoes que tambem existem no seu seio, originadas, directa ou indirectamente, pelos diferentes tons de pele entre si (particularmente entre as mulheres, como quem tenha ouvido atentamente uma celebre conversa entre mulheres “negras” no filme Jungle Fever de Spike Lee tera’ notado; note-se tambem a este respeito a controversia gerada, especialmente no seio da comunidade afro-americana, quando a dada altura Tiger Woods decidiu regeitar a designacao “black” e se auto-definir como cablasian, ou seja uma mistura de caucasian, black e asian), mas, mais marcadamente, pelas diferencas culturais entre os que sao descendentes de escravos na America e os que para la’ emigraram ou foram estudar em decadas mais recentes provindos de Africa, entre os quais se inclui o pai de Obama (e, neste contexto, o casamento de Obama com Michelle pode ser visto tambem como uma ‘alianca’ entre esses dois grupos, a qual tera' tambem porventura contribuido para atrair os votos dos descendentes de escravos), sendo igualmente importante notar que o relativo esbatimento, quando nao completa obliteracao, das diferencas tribais e etnico-linguisticas no contexto americano tambem contribuiu de forma decisiva para essa relativa equidade de status social, politico e economico entre os nao-brancos de origem africana.

Mas talvez o elemento mais perturbador na forma como a vitoria de Obama tem sido entendida por alguns segmentos do ‘mundo lusofono’ (para alem da tendencia de se classificarem algumas das experiencias politicas, sociais e economicas post-coloniais e post-apartheid menos positivas como “racismo intra-racico” ou “endocolonialismo”, numa lamentavel tentativa de se “redimir” de algum modo o colonialismo e o apartheid e, em ultima analise, o proprio racismo que eles “construiram” – como se os 30 a 50 anos das independencias africanas, ou os menos de 20 anos desde o fim do apartheid, nao constituissem apenas um decimo ou menos da duracao do colonialismo e do apartheid no contexto da formacao e evolucao de novas sociedades, ou como se, por serem negros, uma vez no poder os negros nao pudessem ter problemas entre si e estivessem isentos de cometer erros, quer herdados ou induzidos por outros, quer de criacao propria – nao se contribuindo com tal postura de forma positiva e constructiva para a constituicao de aliancas e coligacoes sociais “apesar e para alem da raca” que possam efectivamente ultrapassar e prevenir tais experiencias menos positivas nas nossas sociedades, com vista a criacao de um futuro melhor que possa ser partilhado por todos), e’ a implicacao de que, ainda pensando em termos da “raca como constructo ideologico criador de hierarquias sociais”, de algum modo tratar-se Obama como “negro”, em vez de “mulato” ou “branco”, constitui uma ofensa, uma diminuicao, uma humilhacao, enfim, um “denegrimento” e, mais tristemente ainda, motivo de ressentimento para os que se consideram “nao negros”…

Bom, a designacao destas notas como “breves”, pelo que ja’ vai escrito, faz-me parar por aqui, sendo certo que muito mais ha’ ainda a dizer sobre a questao.

(*) Estas notas foram-me sugeridas, entre outras observacoes e leituras de reaccoes a vitoria de Obama, por esta serie e por este post no blog "Diario de Um Sociologo".


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Ecos da Vitoria de Obama no SA
1. Ja’ aqui referi algumas vezes a minha conviccao de que a raca e o(s) racismo(s) dela derivado(s) sao um “constructo ideologico datado no tempo historico” cujo principal objectivo e’ a construcao de hierarquias sociais. E’, portanto, com bastante interesse que venho observando a forma como a “raca” de Obama tem sido ‘construida’ e ‘desconstruida’ em diferentes contextos sociais durante a longa campanha para a Presidencia Americana que acaba de ter como desfecho a sua vitoria.

Nao sendo sociologa ou antropologa – disciplinas que, em principio, mais se centram nesse tipo de analise –, as conclusoes que retiro das minhas observacoes baseam-se, por um lado, nas minhas proprias experiencias individuais e, por outro lado, nos instrumentos de analise historica que me permitem aferir que qualquer tentativa de extrapolacao de uma determinada realidade historico-social e economica para outra sera’, no minimo, um exercicio especulativo mal avisado, particularmente se desprovido de salvaguardas analiticas previas assentes numa solida base de evidencia empirica.

2. Tambem ja’ aqui mencionei a importancia de se ter em mente, quando se tenta “analisar” Obama e a sua vitoria do ponto de vista racial, a diferenca fundamental entre o constructo raca/racismo nos EUA e o mesmo constructo noutros contextos historicos, nomeadamente no ‘mundo lusofono’. Essa diferenca resume-se basicamente a dois factores principais:

i) Nos EUA ‘construiram-se’ de inicio essencialmente tres grupos racicos – o branco, o negro e o indio, ou amerindio – sendo que o ultimo, por ter sido quase completamente dizimado ou miscigenado, “passou tendencialmente a historia” como um grupo “indigena” (notem-se as semelhancas e dissemelhancas entre o apelativo “indigena” no contexto americano e no contexto colonial portugues, e.g. “O Estatuto Indigena” no quadro da politica assimilacionista em Angola; note-se tambem esta discussao da "questao indigena" nos EUA, que ja aqui havia anteriormente postado).

Ao longo da historia americana, verificaram-se varios graus e combinacoes de miscigenacao racial entre esses grupos, mas a ‘bitola de construcao social’ ao longo de linhas raciais foi estabelecida institucionalmente com base no principio do “one drop rule”, de acordo com o qual alguem que tivesse uma gota de sangue negro nao poderia ter qualquer outra classificacao socio-racial que nao a de “negro” (note-se tambem aqui que a designacao “mulato”, por ser derivada de “mula” no contexto escravocrata, assumiu historicamente uma conotacao altamente pejorativa nos EUA, ao contrario do que se passa no ‘mundo lusofono’ - veja-se o filme Sankofa, de Haile Gerima, para um notavel tratamento desta questao).

A designacao “negro”, por sua vez, sofreu varias alteracoes ao longo da historia americana, tendo-se mantido como a designacao de consenso para os “nao brancos” ou “indigenas” ate’ meados da decada de 60 do seculo passado, sendo substituida naquele consenso por “black” (muito por conta do mestico Malcolm X, como aqui 'poemiza' o mestico Gil Scott-Heron, e dos Black Panthers, que tinham uma lideranca predominantemente mestica, como a imagem de Angela Davis lembrara' a muita gente, e tambem dos negros Nina Simone e James Brown que a popularizaram com a cancao "Say It Loud: I'm Black and I'm Proud!") entre finais daquela decada e finais da de 80 e, finalmente, pela de “afro-americano” ate’ aos dias de hoje, embora estas duas ultimas continuem a coexistir em varios contextos e tambem se venha notando nos ultimos tempos a ‘ascensao’ de designacoes como brown e bi-racial por alguns mesticos (o termo coloured, ou of colour, embora tambem usado, nunca chegou a ser tao consensual nos EUA como na Africa do Sul). Nas adicoes de varias proveniencias ao melting pot Americano, outros grupos se foram juntando e inter-relacionando e igualmente se definindo de acordo com as suas origens (e.g. “afro-latino”, “latino-americano”, “hispano-americano”, etc.).

No entanto, sendo a America fundamentalmente a terra da “livre competicao economica” e da “igualdade de oportunidades” que consubstanciam o mitico “American Dream” e sao consagrados na Constituicao dos EUA sob o espirito de "We hold these truths to be self-evident, that all men are created equal", este constructo ideologico-doutrinario cedo entrou em choque e em competicao com aquele outro constructo da formacao de hierarquias sociais com base exclusivamente na raca. E’ neste contexto que se situam as varias lutas, primeiro contra o esclavismo, depois contra o segregacionismo e mais tarde pelos direitos civico-politicos dos negros americanos, os quais sempre contaram com a adesao e o apoio, directa ou indirectamente, de segmentos, maiores ou menores, de outros grupos racicos, nomeadamente brancos, senao por razoes estritamente ideologico-doutrinarias, seguramente por razoes economicas, expressas de forma mais ou menos explicita em determinados momentos historicos, dos quais o papel economico da escravatura na genese, alinhamentos racicos e desfecho da Guerra Civil Americana e' o exemplo mais emblematico.

Assim, nao sera’ inteiramente por acaso que o actual estado da economia americana e da economia global, atribuido quase inteiramente a administracao Republicana dos ultimos 8 anos, contribuiu decisivamente para galvanizar a maioria do eleitorado americano a volta de um candidato Democrata que, por acaso, e’ negro, ou afro-americano, como se preferir, que soube apresentar as propostas mais crediveis para a resolucao da crise actual (passando pela adopcao dos passos necessarios ao termino da guerra no Iraque, contra a qual ele foi o unico candidato que se manifestou desde o inicio). Que essa vitoria se tenha tambem “construido” como uma “vitoria da raca sobre o genero” nao deixa de ser interessante, mas constitui questao para outra discussao.

ii) A historia da formacao de hierarquias sociais com base no constructo raca/racismo noutros contextos historicos, e particularmente no ‘mundo lusofono’, assume claramente contornos bastante distintos do caso americano. Em primeiro lugar e fundamentalmente, porque nao foi institucionalmente adoptado o “one drop rule” e a hierarquia social entre os “nao brancos” foi institucionalmente mais claramente definida, assumida e implementada pelo poder colonial ao longo dos varios graus de miscigenacao entre brancos e negros dando lugar a varios grupos: desde os “cafusos”, ou “pardos”, aos “mulatos” e aos “cabritos”. Ou seja, foi instituida, em vez do “one drop rule”, a regra do “divide and rule”.

Mas, talvez mais determinante do lugar social de cada um desses grupos, foi instituida uma maior rigidez estrutural em termos de mobilidade social e economica comparativamente aos EUA, a qual se tornou ainda mais dificil de transpor pelos grupos mais proximos do “estatuto de indigena” (ou seja, a maioria da populacao - e aqui estou a pensar particularmente no caso de Angola), por razoes de ordem historica, cultural, tribal e etno-linguistica dos paises em questao.

Isso num contexto em que, contrariamente ao constructo doutrinario-ideologico do “American Dream” em que, em principio, qualquer individuo, independentemente das suas origens, poderia assumir qualquer posicao social desde que seguisse as “regras do jogo” da politica do integracionismo, nas nossas sociedades o lugar social do individuo continuava a ser determinado por uma hierarquia baseada na “raca”, na “tribo” e na “etnia”, mesmo quando os individuos tivessem passado “todos os testes” da politica assimilacionista (ou, como soi dizer-se em certos tugurios lusosfericos, continuavam a ter que tirar os sapatos para poderem contar ate' 12 e a cair das copas das arvores mesmo depois de terem passado por universidades...).

E essa realidade ainda esta’ presente nos dias de hoje nas nossas sociedades, senao estritamente em termos politico-ideologicos e da simbologia do poder, certamente em termos socio-culturais e economicos (a nao confundir aqui o desiderato, ainda por satisfazer, de se criarem mecanismos efectivos de distribuicao dos rendimentos nacionais por todos os segmentos populacionais, com as fortunas, grandes ou pequenas, adquiridas em alguns casos ilicitamente, por alguns membros das elites ditas “predadoras” ou “endocoloniais” associadas ao poder do periodo post-independencias).

Mas, tal como nos EUA, e essa talvez seja a maior semelhanca entre os dois contextos, outros grupos coexistiram com os grupos raciais basicos da construcao social colonial, integrando-se socio-cuturalmente, contudo, segundo criterios igualmente hierarquicos, nos quais se situavam os chamados “brancos de segunda”, os “indianos” e, interessantemente, os “cabo-verdianos”, entre alguns outros.

3. Ora, das consideracoes anteriores segue-se que, como acima notei, sera’ sempre desavisado tentar-se transpor o “significado da vitoria de Obama” nos EUA, para outros contextos historico-sociais, e particularmente para o ‘mundo lusofono’, com base na sua “constituicao”, ou “construcao”, racial, pelas seguintes razoes fundamentais:

i) Em primeiro lugar, porque os mecanismos de ascencao politica e de obtencao do poder nos EUA sao drasticamente diferentes, em termos tanto constitucionais, como institucionais e ideologicos, dos que vigoram de forma geral nos nossos paises, e muito particularmente nos paises Africanos que adoptaram estrategias de inspiracao marxista durante a luta anti-colonial e no seu post-independencia;

ii) Em segundo lugar, porque a experiencia da America enquanto colonia foi relativamente curta e em moldes bastante diversos dos que marcaram a experiencia colonial Africana (o que a torna, por exemplo, mais similar a experiencia do Brasil do que a de outros espacos do ‘mundo lusofono’);

iii) Em terceiro lugar, porque ao longo dos seculos de debate, formulacao e reformulacao do “lugar social da raca” nos EUA, uma questao que ficou estabelecida com bastante clareza, e ela deriva grandemente dos principios da liberdade individual e dos direitos humanos que integram o “American Dream” (claro que assumido aqui como apenas isso mesmo – um sonho, um ideal – mas um sonho, um ideal que a historia dos EUA tem largamente vindicado, sendo a vitoria de Obama apenas o ultimo exemplo disso mesmo), e’ que se ha’ algo fundamentalmente errado com o “constructo raca/racismo” e’ que ele constitui a definicao de uma parte da raca humana por outra, nomeadamente a dos grupos dominados pelos grupos dominadores, particularmente na sequencia da gesta dos “descobrimentos” (note-se como esta questao de to be defined by others e’ abordada numa mensagem que John Lennon le numa discussao sobre o termo “nigger” cujo link coloquei nos comentarios a este post) .

E e’ fundamentalmente isso que, quanto a mim, torna as tentativas de definicao de Obama como “mulato” (note-se, mais uma vez, a carga pejorativa desta designacao nos EUA) e de reivindicacao da sua vitoria por determinados grupos raciais nos nossos paises, tao ofensivo quanto perturbador. Desde logo porque quando se tenta "dissecar" a sua composicao genetica como se de um especimen de laboratorio se tratasse, deve ter-se em conta que, tal como ele afirmou em varias ocasioes, mas mais enfaticamente no seu discurso sobre a raca nos EUA, "A America e' mais do que a soma das suas partes", qualquer ser humano e' tambem muito mais do que a mera soma das suas partes. Depois porque ele proprio, se alguma vez se definiu em termos racicos – e num contexto de anti-racismo e de defesa das liberdades fundamentais do individuo essa e’ a unica definicao que realmente conta e deve contar e ser respeitada – fe-lo como “negro”, ou como “afro-americano”, assumindo nessa definicao toda a complexidade do seu background familiar e individual, como filho de pai negro-africano e de mae branca (naturalmente de ascendencia europeia, como o sao todos os brancos a face da terra…), de nome arabe, criado no Hawai por avos brancos, estudado na Indonesia, mas… crescido e amadurecido, casado e socializado cultural, religiosa e politicamente no seio da comunidade negra americana.

Isto e’, ele define-se por relacao a sua propria experiencia politica e socio-cultural e nao necessariamente por oposicao a de outros (tambem como eu propria o fiz a minha maneira, muito contra a corrente diga-se, neste artigo...), mesmo porque, como ele proprio afirmou no contexto da maka sobre o Reverendo Wright (alguem que, note-se, tal como Colin Powell por exemplo, no ‘mundo lusofono’ seria classificado e socializado como “cabrito”, mas que nos EUA nao contempla classificar-se de outro modo senao como “negro”): “eu nao o posso renegar, tal como nao posso renegar a minha avo branca em quem, apesar de me ter criado, observei manifestacoes de preconceito racial em relacao ao negro”. Ora, essa definicao “por si proprio” e nao “por outros” ou “contra outros” foi essencialmente o que lhe permitiu ser apelativo a praticamente todos os grupos racicos nos EUA e um pouco por todo o mundo e e’ o que torna a sua vitoria tao bonita!

Porque quererao entao alguns, particularmente se em sociedades completamente distintas dos EUA, estragar essa beleza tentando aplicar-lhe criterios de definicao racica que lhe sao completamente estranhos e, pior ainda, tentar reivindicar a sua vitoria como uma bandeira exclusiva de um particular grupo racico, o dos auto-definidos “mulatos” no ‘mundo lusofono’, quando a propria designacao “mulato” constituiria para si uma ofensa, quanto mais nao seja porque a sua miscigenacao nao derivou do particular contexto historico em que essa designacao foi adoptada nos EUA, isto e’ a escravatura, o que alias lhe mereceu o relativo alheamento, quando nao aberta hostilidade, de alguns segmentos da comunidade afro-americana descendente de escravos, nao apenas mas sobretudo porque ele proprio e' descendente pelo lado materno de donos de escravos? Mas nao seria apenas a designacao “mulato” que tenho poucas duvidas ele regeitaria (quanto muito, aceitaria mais facilmente a designacao geralmente adoptada nos EUA para os mesticos: “mixed-race”), como tambem a de “branco” que alguns no 'mundo lusofono' tambem lhe pretendem “a viva forca” aplicar pelo facto de ter nascido de mae branca…

Ou seja, continua-se em alguns sectores do ‘mundo lusofono’ a pensar a “raca” ainda em termos hierarquicos (sendo bastante elucidativo disto o modo como alguns nesse mundo equacionam a questao em termos de "racismo de cima para baixo e de baixo para cima" - estando "em cima" o branco e "em baixo" o negro, com o mestico "no meio"...), de tal modo que, aparentemente para tais sectores, a forma como Obama se auto-identifica parece nao ter qualquer importancia, ou mesmo como se a forma como ele se posiciona ‘racicamente’ nao tivesse tido qualquer relevancia para a sua eleicao: sejamos claros, se ele se identificasse social e culturalmente como “mulato”, ou como “branco”, nao so’ seria ridicularizado, ostensiva ou dissimuladamente, pelos brancos americanos, como dificilmente teria obtido o voto maioritario do grupo “afro-americano”, o qual, como de resto se observou nas manifestacoes de voto nos estagios iniciais da campanha, inclui segmentos que teriam preferido votar noutro candidato, independentemente da sua raca ou genero e que, sendo embora minoritario, foi decisivo para a sua vitoria - particularmente nas primarias e sua consequente nomeacao como candidato pelo partido Democrata.

Grupo “afro-americano” esse onde, nunca e’ demais repeti-lo, se incluem todos os nao-brancos desde que tenham uma gota de sangue negro. E, se e’ certo que o "one drop rule" foi inicialmente uma criacao do grupo dominante branco nos EUA com motivacoes racistas, nao e’ menos certo que ele foi apropriado, internalizado e socializado historicamente pelos “afro-americanos” que – ao contrario, nunca e’ demais nota-lo, do que se passou e em grande medida ainda se passa nas ex-colonias portuguesas onde se instituiu uma diferenciacao racica hierarquizante de acordo com os varios tons de pele entre negros e brancos – partilharam ao longo de seculos em condicoes de igualdade tanto a discriminacao racial contra si (vide o caso da 'cabrita' Rosa Parks), como as oportunidades sociais, politicas e economicas que souberam conquistar para si (vide o caso da 'negra' Oprah Winfrey) como um unico grupo racico, pesem embora as clivagens e friccoes que tambem existem no seu seio, originadas, directa ou indirectamente, pelos diferentes tons de pele entre si (particularmente entre as mulheres, como quem tenha ouvido atentamente uma celebre conversa entre mulheres “negras” no filme Jungle Fever de Spike Lee tera’ notado; note-se tambem a este respeito a controversia gerada, especialmente no seio da comunidade afro-americana, quando a dada altura Tiger Woods decidiu regeitar a designacao “black” e se auto-definir como cablasian, ou seja uma mistura de caucasian, black e asian), mas, mais marcadamente, pelas diferencas culturais entre os que sao descendentes de escravos na America e os que para la’ emigraram ou foram estudar em decadas mais recentes provindos de Africa, entre os quais se inclui o pai de Obama (e, neste contexto, o casamento de Obama com Michelle pode ser visto tambem como uma ‘alianca’ entre esses dois grupos, a qual tera' tambem porventura contribuido para atrair os votos dos descendentes de escravos), sendo igualmente importante notar que o relativo esbatimento, quando nao completa obliteracao, das diferencas tribais e etnico-linguisticas no contexto americano tambem contribuiu de forma decisiva para essa relativa equidade de status social, politico e economico entre os nao-brancos de origem africana.

Mas talvez o elemento mais perturbador na forma como a vitoria de Obama tem sido entendida por alguns segmentos do ‘mundo lusofono’ (para alem da tendencia de se classificarem algumas das experiencias politicas, sociais e economicas post-coloniais e post-apartheid menos positivas como “racismo intra-racico” ou “endocolonialismo”, numa lamentavel tentativa de se “redimir” de algum modo o colonialismo e o apartheid e, em ultima analise, o proprio racismo que eles “construiram” – como se os 30 a 50 anos das independencias africanas, ou os menos de 20 anos desde o fim do apartheid, nao constituissem apenas um decimo ou menos da duracao do colonialismo e do apartheid no contexto da formacao e evolucao de novas sociedades, ou como se, por serem negros, uma vez no poder os negros nao pudessem ter problemas entre si e estivessem isentos de cometer erros, quer herdados ou induzidos por outros, quer de criacao propria – nao se contribuindo com tal postura de forma positiva e constructiva para a constituicao de aliancas e coligacoes sociais “apesar e para alem da raca” que possam efectivamente ultrapassar e prevenir tais experiencias menos positivas nas nossas sociedades, com vista a criacao de um futuro melhor que possa ser partilhado por todos), e’ a implicacao de que, ainda pensando em termos da “raca como constructo ideologico criador de hierarquias sociais”, de algum modo tratar-se Obama como “negro”, em vez de “mulato” ou “branco”, constitui uma ofensa, uma diminuicao, uma humilhacao, enfim, um “denegrimento” e, mais tristemente ainda, motivo de ressentimento para os que se consideram “nao negros”…

Bom, a designacao destas notas como “breves”, pelo que ja’ vai escrito, faz-me parar por aqui, sendo certo que muito mais ha’ ainda a dizer sobre a questao.

(*) Estas notas foram-me sugeridas, entre outras observacoes e leituras de reaccoes a vitoria de Obama, por esta serie e por este post no blog "Diario de Um Sociologo".


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Thursday 6 November 2008

WHY IS THERE NO PEACE IN THE DRC?

That was the question participants at today's Cyber Seminar promoted by the Norwegian Council for Africa sought to address.
The debate was introduced by Dr. Muzong W. Kodi, coordinator of the British-Congo Forum at Chatham House, who offered the following explanations:

The various attempts that have been made so far to resolve the enduring conflict in Eastern Congo have failed because they have not addressed the root causes of the problem which has been wrongly dealt with as an exclusively Congolese concern. This conflict is also the result of the mismanagement of the consequences of the 1994 Rwandan genocide, which has put the Kivus in the frontline of the Tutsi-Hutu bloody confrontation. The root causes are:
• The illicit exploitation of the natural resources of Eastern Congo by trading networks put in place during the two wars of 1996-1997 and 1998-2003 by the occupying armies of Rwanda and Uganda which include all the Congolese militias, units of the Congolese national army, the Rwandan Hutu militias in Congo, and Congolese and Rwandan traders.
• Discrimination in land and other resource distribution between the various communities.
• Culture of impunity for human rights violations and other crimes.


[More details here]
That was the question participants at today's Cyber Seminar promoted by the Norwegian Council for Africa sought to address.
The debate was introduced by Dr. Muzong W. Kodi, coordinator of the British-Congo Forum at Chatham House, who offered the following explanations:

The various attempts that have been made so far to resolve the enduring conflict in Eastern Congo have failed because they have not addressed the root causes of the problem which has been wrongly dealt with as an exclusively Congolese concern. This conflict is also the result of the mismanagement of the consequences of the 1994 Rwandan genocide, which has put the Kivus in the frontline of the Tutsi-Hutu bloody confrontation. The root causes are:
• The illicit exploitation of the natural resources of Eastern Congo by trading networks put in place during the two wars of 1996-1997 and 1998-2003 by the occupying armies of Rwanda and Uganda which include all the Congolese militias, units of the Congolese national army, the Rwandan Hutu militias in Congo, and Congolese and Rwandan traders.
• Discrimination in land and other resource distribution between the various communities.
• Culture of impunity for human rights violations and other crimes.


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Monday 3 November 2008

A IS FOR ACHIEVEMENT!

The Youngest F1 World Champion in History!
The Youngest F1 World Champion in History!