Thursday 4 January 2007

A PROPOSITO DA "FORMULA WADE" DE COMBATE A POBREZA EM AFRICA (II)

No plano da justificacao moral da sua formula, Wade afirmou que “as companhias petroliferas devem conceder parte dos seus rendimentos a luta contra a pobreza ou arriscam-se a ser expulsas do continente pela instabilidade e revolta provocadas pela desigualdade… E’ indecente, imoral, que as maiores petroliferas estajam a recolher lucros de multi-bilioes de dolares do aumento do preco do petroleo, enquanto os paises africanos importadores de petroleo veem as suas facturas energeticas aumentar na ordem de dezenas de milhoes de dolares.” Dirigindo-se as petroliferas, Wade afirmou: “Voces sao livres de continuar a agir assim se quiserem. Mas, no longo prazo, serao expulsos de Africa!”

Ora, torna-se forcoso, perante tal posicionamento, perguntar-mo-nos:


1. Se as motivacoes do Presidente Wade nao serao fundamentalmente politicas e resultantes da sua perda de protagonismo na implementacao do Nepad (ao qual esta ligado como o autor de um dos seus precurssores, o Plano Omega) em favor dos seus mais proeminentes porta-vozes actuais, os Presidentes Mbeki e Obasanjo;

2. Se Wade se pretende notabilizar pela iniciacao de sucessivos projectos e pelo seu abandono tao logo a sua implementacao comece a tornar-se na questao central (viz. Nepad a nivel do continente e varios outros projectos trans-nacionais a nivel das varias regioes, como a SADC, a qual, diga-se de passagem, e’ uma plataforma politico-economica nao partilhada entre Angola e o Senegal…), o que nao o impede, no entanto, de continuar a propor projectos infrastruturais trans-continentais claramente orientados prioritariamente para os interesses exclusivos do seu pais, como o plano de construcao de uma linha ferrea ligando Johannesburg a Dakar e de outra ligando Dakar ao Djibouti, utilizando fundos que, em principio, se destinariam a todo o continente...;

3. Se a desigualdade que provoca a instabilidade e revolta a que Wade se refere, particularmente nos paises NOPAC, e' directamente provocada pelos lucros das petroliferas e se nao sera de senso comum admitirmos que se nao temos um determinado recurso dentro das fronteiras do nosso pais (... porque, ao contrario do que Wade parece sugerir, estas ainda existem... mesmo em Africa!) nao podemos razoavelmente esperar ditar unilateralmente as regras do jogo do mercado referentes a producao e comercializacao desse recurso...

4. Se o combate a pobreza no continente, particularmente se no contexto da promocao de um modelo de desenvolvimento economico e social sustentavel, pode basear-se exclusivamente nos rendimentos de um recurso nao renovavel como o petroleo, sobretudo tendo em conta que nenhum dos chamados OPAC tentou ainda criar um Fundo do Petroleo (a excepcao da tentativa semi-frustrada feita recentemente no Chade por “imposicao” do Banco Mundial…) para melhorar a redistribuicao desses rendimentos e para investir na investigacao e desenvolvimento de fontes alternativas de energia dentro dos seus proprios paises e muito menos para contribuir financeiramente para os NOPAC (por exemplo, investir em tornar-se completamente operacional a barragem do Inga no Rio Kongo que, com uma corrente apenas inferior a do Amazonas, despeja 42.5 milhoes de litros de agua por segundo no Atlantico e que peritos dizem podera gerar mais de 40,000 megawats de electricidade - mais do dobro da capacidade projectada para a massiva barragem dos “Tres Gorges” na China - o que seria suficiente para satisfazer a crescente procura de electricidade em Africa e nao so…);

5. Se a completa adesao dos paises OPAC a programas ja iniciados, como a Iniciativa para a Transparencia nas Industrias Extractivas, o combate a corrupcao a todos os niveis e o fortalecimento das instituicoes nacionais tanto dos OPAC como dos NOPAC nao deverao ser instituidos em condicoes sine-qua-non para a eficiente criacao e aplicacao de um qualquer fundo petrolifero dentro dos parametros propostos pela “Formula Wade”;

6. Finalmente, mas sem esgotar todas as possiveis questoes levantadas por esta estrategia, ter-se-a o Presidente Wade esquecido que qualquer economia, OPAC ou NOPAC, nao pode pretender combater eficazmente a pobreza se nao produzir produtos nao petroliferos, enfim se nao diversificar o seu 'output' de bens e servicos e se nao gerar riqueza que possa distribuir equitativamente para o desenvolvimento de todos os seus sectores economicos e o bem-estar de todos os seus extractos sociais? Note-se, a este proposito, que um dos OPAC que mais tem beneficiado do aumento do preco do petroleo, Angola, e' tambem um dos menos desenvolvidos do continente, nao se verificando, apesar do aumento dos seus rendimentos petroliferos, qualquer palpavel melhoria nas assimetrias redistributivas existentes na sua economia, ao mesmo tempo que o pais mais desenvolvido do continente e onde mais melhorias se registam na correccao daquelas assimetrias, a Africa do Sul, e' um NOPAC (salvaguardadas, obviamente, as razoes historicas subjacentes a tal 'sub-desenvolvimento', no primeiro caso, e 'desenvolvimento', no segundo) nao se esperando, certamente, que a Africa do Sul tambem venha exigir de Angola uma parte dos seus rendimentos petroliferos para satisfazer as suas necessidades energeticas (por sinal grande parte delas supridas por energia nuclear)...

Talvez reste ponderar em que bases se sustenta o Presidente Wade para pedir de Angola uma significativa contribuicao para a sua estrategia e, concretamente para o seu pais, quando, por exemplo, o Senegal esta 5 lugares acima de Angola no Indice de Desenvolvimento Humano da ONU (2006); quando 72 lugares separam os dois paises (a favor do Senegal) no Indice de Percepcoes de Corrupcao da Transparencia Internacional (2006); quando Angola tem uma esperanca de vida media de 41 anos comparados com os 56 anos no Senegal e uma taxa de mortalidade de 154 por cada mil nascimentos em comparacao com os 78 do Senegal; quando Angola tem uma taxa de prevalencia de HIV/SIDA, entre a sua populacao com idades compreendidas entre os 15-49 anos, de 3.7%, enquanto a mesma taxa no Senegal e’ de 0.9%? Quando Angola esteve mergulhada ate muito recentemente numa guerra de 30 anos, enquanto o Senegal tem sido um pais em paz desde a sua independencia, obtida 16 anos antes de Angola? Sera que na concepcao de tantos planos e formulas, perdemos a nocao da realidade, das distancias e das proporcoes, enfim, do equilibrio, Sr. Presidente Wade?!

No plano da justificacao moral da sua formula, Wade afirmou que “as companhias petroliferas devem conceder parte dos seus rendimentos a luta contra a pobreza ou arriscam-se a ser expulsas do continente pela instabilidade e revolta provocadas pela desigualdade… E’ indecente, imoral, que as maiores petroliferas estajam a recolher lucros de multi-bilioes de dolares do aumento do preco do petroleo, enquanto os paises africanos importadores de petroleo veem as suas facturas energeticas aumentar na ordem de dezenas de milhoes de dolares.” Dirigindo-se as petroliferas, Wade afirmou: “Voces sao livres de continuar a agir assim se quiserem. Mas, no longo prazo, serao expulsos de Africa!”

Ora, torna-se forcoso, perante tal posicionamento, perguntar-mo-nos:


1. Se as motivacoes do Presidente Wade nao serao fundamentalmente politicas e resultantes da sua perda de protagonismo na implementacao do Nepad (ao qual esta ligado como o autor de um dos seus precurssores, o Plano Omega) em favor dos seus mais proeminentes porta-vozes actuais, os Presidentes Mbeki e Obasanjo;

2. Se Wade se pretende notabilizar pela iniciacao de sucessivos projectos e pelo seu abandono tao logo a sua implementacao comece a tornar-se na questao central (viz. Nepad a nivel do continente e varios outros projectos trans-nacionais a nivel das varias regioes, como a SADC, a qual, diga-se de passagem, e’ uma plataforma politico-economica nao partilhada entre Angola e o Senegal…), o que nao o impede, no entanto, de continuar a propor projectos infrastruturais trans-continentais claramente orientados prioritariamente para os interesses exclusivos do seu pais, como o plano de construcao de uma linha ferrea ligando Johannesburg a Dakar e de outra ligando Dakar ao Djibouti, utilizando fundos que, em principio, se destinariam a todo o continente...;

3. Se a desigualdade que provoca a instabilidade e revolta a que Wade se refere, particularmente nos paises NOPAC, e' directamente provocada pelos lucros das petroliferas e se nao sera de senso comum admitirmos que se nao temos um determinado recurso dentro das fronteiras do nosso pais (... porque, ao contrario do que Wade parece sugerir, estas ainda existem... mesmo em Africa!) nao podemos razoavelmente esperar ditar unilateralmente as regras do jogo do mercado referentes a producao e comercializacao desse recurso...

4. Se o combate a pobreza no continente, particularmente se no contexto da promocao de um modelo de desenvolvimento economico e social sustentavel, pode basear-se exclusivamente nos rendimentos de um recurso nao renovavel como o petroleo, sobretudo tendo em conta que nenhum dos chamados OPAC tentou ainda criar um Fundo do Petroleo (a excepcao da tentativa semi-frustrada feita recentemente no Chade por “imposicao” do Banco Mundial…) para melhorar a redistribuicao desses rendimentos e para investir na investigacao e desenvolvimento de fontes alternativas de energia dentro dos seus proprios paises e muito menos para contribuir financeiramente para os NOPAC (por exemplo, investir em tornar-se completamente operacional a barragem do Inga no Rio Kongo que, com uma corrente apenas inferior a do Amazonas, despeja 42.5 milhoes de litros de agua por segundo no Atlantico e que peritos dizem podera gerar mais de 40,000 megawats de electricidade - mais do dobro da capacidade projectada para a massiva barragem dos “Tres Gorges” na China - o que seria suficiente para satisfazer a crescente procura de electricidade em Africa e nao so…);

5. Se a completa adesao dos paises OPAC a programas ja iniciados, como a Iniciativa para a Transparencia nas Industrias Extractivas, o combate a corrupcao a todos os niveis e o fortalecimento das instituicoes nacionais tanto dos OPAC como dos NOPAC nao deverao ser instituidos em condicoes sine-qua-non para a eficiente criacao e aplicacao de um qualquer fundo petrolifero dentro dos parametros propostos pela “Formula Wade”;

6. Finalmente, mas sem esgotar todas as possiveis questoes levantadas por esta estrategia, ter-se-a o Presidente Wade esquecido que qualquer economia, OPAC ou NOPAC, nao pode pretender combater eficazmente a pobreza se nao produzir produtos nao petroliferos, enfim se nao diversificar o seu 'output' de bens e servicos e se nao gerar riqueza que possa distribuir equitativamente para o desenvolvimento de todos os seus sectores economicos e o bem-estar de todos os seus extractos sociais? Note-se, a este proposito, que um dos OPAC que mais tem beneficiado do aumento do preco do petroleo, Angola, e' tambem um dos menos desenvolvidos do continente, nao se verificando, apesar do aumento dos seus rendimentos petroliferos, qualquer palpavel melhoria nas assimetrias redistributivas existentes na sua economia, ao mesmo tempo que o pais mais desenvolvido do continente e onde mais melhorias se registam na correccao daquelas assimetrias, a Africa do Sul, e' um NOPAC (salvaguardadas, obviamente, as razoes historicas subjacentes a tal 'sub-desenvolvimento', no primeiro caso, e 'desenvolvimento', no segundo) nao se esperando, certamente, que a Africa do Sul tambem venha exigir de Angola uma parte dos seus rendimentos petroliferos para satisfazer as suas necessidades energeticas (por sinal grande parte delas supridas por energia nuclear)...

Talvez reste ponderar em que bases se sustenta o Presidente Wade para pedir de Angola uma significativa contribuicao para a sua estrategia e, concretamente para o seu pais, quando, por exemplo, o Senegal esta 5 lugares acima de Angola no Indice de Desenvolvimento Humano da ONU (2006); quando 72 lugares separam os dois paises (a favor do Senegal) no Indice de Percepcoes de Corrupcao da Transparencia Internacional (2006); quando Angola tem uma esperanca de vida media de 41 anos comparados com os 56 anos no Senegal e uma taxa de mortalidade de 154 por cada mil nascimentos em comparacao com os 78 do Senegal; quando Angola tem uma taxa de prevalencia de HIV/SIDA, entre a sua populacao com idades compreendidas entre os 15-49 anos, de 3.7%, enquanto a mesma taxa no Senegal e’ de 0.9%? Quando Angola esteve mergulhada ate muito recentemente numa guerra de 30 anos, enquanto o Senegal tem sido um pais em paz desde a sua independencia, obtida 16 anos antes de Angola? Sera que na concepcao de tantos planos e formulas, perdemos a nocao da realidade, das distancias e das proporcoes, enfim, do equilibrio, Sr. Presidente Wade?!

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