Monday 11 May 2009

DE GRIPES E PATRIOTISMOS

A gripe suína e os tugas

Por Joao Melo

4 de Maio de 2009. Este dia ficará gravado para todo o sempre, de forma absolutamente indelével, na gloriosa história dos tugas: foi confirmado o primeiro caso de gripe suína (ou melhor, ex-suína, agora é gripe A) em Portugal. A honra lusitana está salva. Os espanhóis – que já têm cerca de duas dezenas de casos - não vão continuar a estigá-los.
Este facto extraordinário conseguiu ofuscar a canonização de D. Nuno Álvares Pereira, o herói de Aljubarrota, que vários séculos depois salvou da cegueira uma pobre mulher de uma buala portuguesa qualquer que, desajeitadamente, deixou o óleo da frigideira saltar-lhe para as vistas, como diriam os mangolês. Bastou à matrona lusitana invocar o nome do herói, que logo a sua visão melhorou. Ter-se-á transformado numa Super Mulher e passado a ver através das paredes e outras superfícies opacas? Eis um mistério que a malta (e bota malta nisso!) do Eixo do Mal poderá descobrir.
Quis o acaso que eu, uma simples e pobre criatura angolana, sem profissão reconhecida, testemunhasse, estando de passage rápida pelo novo Ultramar, por questões familiares, todos esses factos verdadeiramente inauditos. Vou registá-lo, pois, no meu CV. Se amanhã alguém criar o Prémio da Testemunha Sortuda do Século, talvez me calhe alguma coisa, que eu estou a precisar de arredondar o salário. Digo mesmo: foi pura sorte.
Quando eu cheguei, os jornalistas portugueses estavam à beira de um ataque de nervos. Como era possível ainda não se ter registado nenhum caso da nova gripe no indefectível jardim à beira mar plantado? Eu assistia à televisão e via me acometido de uma profunda compaixão por esses briosos e patrióticos profissionais.
As autoridades sanitárias do país tentavam explicar, serena e cientificamente, que os casos suspeitos de terem sido contaminados pela gripe A não foram comprovados, isto é, os suspeitos não eram culpados. Mas, como, os suspeitos não são culpados? Então, não ensina o jornalismo português (e outros… e outros…) que os suspeitos são sempre culpados?
E aquele doente de Coimbra? E aquela velhinha que, de repente, começou a espirrar e a falar espanhol?
Assisti também, ao vivo e a cores, à cobertura televisiva da chegada do primeiro avião tuga proveniente da Cidade do México depois do surgimento da nova doença. Estavam lá todos os canais, claro. Apesar de tudo, não notei quaisquer diferenças entre eles: todos os corajosos e temerarious repórteres enviados ao aeroporto da Portela para registar aquele momento ímpar e único me pareciam igualmente desesperados. Apenas estranhei não vê-los de máscara tapando a boca, mas, enfim, deve ser da crise.
Não larguei a tela doentia um minuto sequer. Comecei a imaginar os passageiros tugas resgatados do inferno mexicano saindo do avião em braços, espirrando e tossindo desvairadamente, proferindo discursos em línguas arcaicas, talvez alguns deles já num adiantado processo de transformação em autênticos ngulos. Não ia perder esse espectáculo.
Infelizmente, para saber o que de facto se passou, terão de ler os jornais e ver as televisões portuguesas, que são especializados em relatar não aquilo que vêem, mas aquilo que querem ver. Pela minha parte, lembro-me da célebre frase de uma personagem das aventuras de Astérix: - “Esses gauleses são malucos!”.
Eu não tenho dúvidas de que esses tugas são depressivos. Vou masé mimbora prá banda.

[In Novo Jornal, 08/05/09]

A gripe suína e os tugas

Por Joao Melo

4 de Maio de 2009. Este dia ficará gravado para todo o sempre, de forma absolutamente indelével, na gloriosa história dos tugas: foi confirmado o primeiro caso de gripe suína (ou melhor, ex-suína, agora é gripe A) em Portugal. A honra lusitana está salva. Os espanhóis – que já têm cerca de duas dezenas de casos - não vão continuar a estigá-los.
Este facto extraordinário conseguiu ofuscar a canonização de D. Nuno Álvares Pereira, o herói de Aljubarrota, que vários séculos depois salvou da cegueira uma pobre mulher de uma buala portuguesa qualquer que, desajeitadamente, deixou o óleo da frigideira saltar-lhe para as vistas, como diriam os mangolês. Bastou à matrona lusitana invocar o nome do herói, que logo a sua visão melhorou. Ter-se-á transformado numa Super Mulher e passado a ver através das paredes e outras superfícies opacas? Eis um mistério que a malta (e bota malta nisso!) do Eixo do Mal poderá descobrir.
Quis o acaso que eu, uma simples e pobre criatura angolana, sem profissão reconhecida, testemunhasse, estando de passage rápida pelo novo Ultramar, por questões familiares, todos esses factos verdadeiramente inauditos. Vou registá-lo, pois, no meu CV. Se amanhã alguém criar o Prémio da Testemunha Sortuda do Século, talvez me calhe alguma coisa, que eu estou a precisar de arredondar o salário. Digo mesmo: foi pura sorte.
Quando eu cheguei, os jornalistas portugueses estavam à beira de um ataque de nervos. Como era possível ainda não se ter registado nenhum caso da nova gripe no indefectível jardim à beira mar plantado? Eu assistia à televisão e via me acometido de uma profunda compaixão por esses briosos e patrióticos profissionais.
As autoridades sanitárias do país tentavam explicar, serena e cientificamente, que os casos suspeitos de terem sido contaminados pela gripe A não foram comprovados, isto é, os suspeitos não eram culpados. Mas, como, os suspeitos não são culpados? Então, não ensina o jornalismo português (e outros… e outros…) que os suspeitos são sempre culpados?
E aquele doente de Coimbra? E aquela velhinha que, de repente, começou a espirrar e a falar espanhol?
Assisti também, ao vivo e a cores, à cobertura televisiva da chegada do primeiro avião tuga proveniente da Cidade do México depois do surgimento da nova doença. Estavam lá todos os canais, claro. Apesar de tudo, não notei quaisquer diferenças entre eles: todos os corajosos e temerarious repórteres enviados ao aeroporto da Portela para registar aquele momento ímpar e único me pareciam igualmente desesperados. Apenas estranhei não vê-los de máscara tapando a boca, mas, enfim, deve ser da crise.
Não larguei a tela doentia um minuto sequer. Comecei a imaginar os passageiros tugas resgatados do inferno mexicano saindo do avião em braços, espirrando e tossindo desvairadamente, proferindo discursos em línguas arcaicas, talvez alguns deles já num adiantado processo de transformação em autênticos ngulos. Não ia perder esse espectáculo.
Infelizmente, para saber o que de facto se passou, terão de ler os jornais e ver as televisões portuguesas, que são especializados em relatar não aquilo que vêem, mas aquilo que querem ver. Pela minha parte, lembro-me da célebre frase de uma personagem das aventuras de Astérix: - “Esses gauleses são malucos!”.
Eu não tenho dúvidas de que esses tugas são depressivos. Vou masé mimbora prá banda.

[In Novo Jornal, 08/05/09]

2 comments:

umBhalane said...

Situações lamentáveis, caricatas, …
Como aquela do cão de água (português) de Obama (filhas)…
A pequenez cerebral é incomensuravelmente pior que a física.
Mas que João Melo tem uma GRANDE pedra no sapato, tem.
Porque será, não sei…
Nem vou perder tempo com isso.

MAS TEM.

Koluki said...

Bem, nao sabia que o cao das "minhas afilhadas" ;-) era proveniente das apraziveis aguas lusitanas! Mais, que sais je?
Quanto a pedras no sapato, oh meu caro amigo, o melhor e' andarmos todos de chinelos ou, melhor ainda, descalcos...