Sunday 28 February 2010

Mais alguns passos adiante no Annus Angolensis...


Como uma verdadeira lufada de ar fresco para tanta asfixia intelectual e académica que vai grassando por estas bandas, passou por nós recentemente alguém vindo da prestigiada Universidade de Coimbra, de sua graça Costa Andrade- um nome que tem a particularidade de nos ser bastante “familiar”. Estranhamente "familiar".
(…)
O prof. Costa Andrade veio até nós com a sua bagagem a transbordar de conhecimentos numa área da ciência jurídica - a do direito relacionado com a liberdade de imprensa e a comunicação social- onde localmente o défice é verdadeiramente assustador, a levantar outras questões mais delicadas até no plano da própria honestidade intelectual.
O reparo nada simpático é naturalmente dirigido aos nossos juristas ou a uma parte deles que nos últimos tempos se têm pronunciado sobre a matéria, com um visão tão redutora do fenómeno, que os atira definitivamente para a prateleira dos “advogados do diabo”, onde de facto estão a prestar um bom serviço.
O recurso a esta expressão só aparentemente poderá ser considerada ofensiva, uma vez que é nossa intenção colocar, o mais fundo possível, o dedo numa ferida que tem a ver com o papel dos intelectuais na nossa sociedade.
Trata-se de uma ferida já crónica, um verdadeiro "mabute".
Depois de todas as lições que à esquerda e à direita a história foi generosa em dar-nos, a este respeito somos resolutamente partidários de uma postura assumidamente independente da parte dos intelectuais em qualquer sociedade e contexto político, o que não põe em causa as suas eventuais opções partidárias ou eleitorais. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Criticar o “camarada Presidente” já não pode ser mais uma heresia, nem motivo para prolongadas travessias no deserto. Desgraçadamente ainda é.
Depois de tudo aquilo que nos foi dado a ouvir da boca do Prof. Costa Andrade - para total conforto e integral satisfação das nossas preocupações- pouco haverá mais para acrescentar em termos académicos ao debate sobre a liberdade de imprensa e os seus limites. Os tão famosos limites que os nossos “advogados do diabo” querem hoje transformar no próprio fundamento de um direito constitucional que é a liberdade de imprensa.
Mais do que isso, conforme frisou Costa Andrade referindo-se à liberdade de imprensa, estamos diante de uma verdadeira instituição do estado democrático, que ultrapassa os jornalistas e as suas makas com os políticos e vice-versa, para se apresentar como um dos pilares da própria sociedade, sem o qual é impensável falar-se em democracia.
(…)
Puxando abertamente o “cacusso para o nosso carvão”, diríamos que a liberdade de imprensa é a única garantia que os cidadãos têm rapidamente à sua mão para “sobreviverem” individualmente, sobretudo quando os “poderes democráticos” começam a ter ataques de caspa, de tosse convulsa ou de nervos de galinha.
São sintomas que, diariamente, vamos observando por estas bandas onde, em abono da verdade, o “estado de sitio” é já uma realidade, que os diferentes porta-vozes do regime tentam pintar de amarelo e de outras cores mais simpáticas.
Algumas das liberdades fundamentais em Angola estão efectivamente suspensas, estando o seu exercício dependente agora do bom ou mau humor das autoridades administrativas, que vão assim permitindo algumas “manobras” da malta. Depois fazem discursos inflamados dizendo que só num país onde há liberdade de imprensa é que a mesma pode ser discutida tão abertamente. O sofisma chega a ser brilhante, mas já não convence ninguém. Em qualquer parte do mundo o problema do exercício das liberdades está na ausência do medo; medo este que, como se sabe, é neste momento o principal produto distribuído pelas diferentes agências governamentais que se ocupam da “aplicação” da lei.
Em Angola o medo de ir parar a uma cadeia imunda e infecta é tão grande, tão grande, que paralisa os mais corajosos, por isso é que a coragem neste país precisava de outros programas televisivos e radiofónicos mais abrangentes que nos falassem deste valor em todas as suas dimensões.

Reginaldo Silva (aqui)



Notícias vindas de Portugal convidam-nos a reflectir sobre a concentração da mídia no nosso país. Nos últimos dias a sociedade portuguesa tem discutido um alegado plano governamental de compra de uma televisão privada através de uma empresa pública. A conclusão é a que todos já sabem: qualquer tutela de órgãos de comunicação, seja pública ou privada, tem o fim último de influenciar os conteúdos informativos.
(…)
Há, assim, muitos cruzamentos com Angola para não vermos semelhanças entre a estratégia de concentração desenvolvida tanto pela MediaNova como pela Score Media. A MediaNova detém a TV Zimbo, o jornal O País, a Rádio Mais, o Semanário Económico, a revista Chocolate, a revista Exame, uma agência de publicidade, Publivision, e ainda uma empresa de meios e a gráfica Damer. A Score Media, por sua vez, detém os semanários Sol que circula em Portugal, Angola e Moçambique, e Expansão, e a revista Estratégia. Diz-se que brevemente avançará para uma rádio e para um canal de TV. Qualquer destas empresas, que agora dominam a mídia angolana, estão afectos a pessoas ligadas ao poder político e económico. Os seus conteúdos e opções editoriais acabam por engrossar uma corrente de jornalismo light pró-governamental, há muito praticada pelos órgãos públicos. Trata-se, na verdade, da mesma corrente política, o mesmo modo de ver o país.
(…)
O lado perverso da concentração é que os grupos ganham poderes para alterar as regras da concorrência, moldar o mercado segundo as suas conveniências. De resto, foi o que aconteceu com a sobrevalorização dos salários dos jornalistas protagonizado primeiro pelos órgãos públicos e, depois, pela MediaNova. Se, por um lado, se pode alegar que se trata de uma mera operação comercial, por outro somos forçados a reflectir urgentemente sobre os perigos não só da concentração em si, mas da concentração na mídia num país diverso, pluriétnico, com grupos económicos emergentes e em reconciliação nacional. Nos países mais avançados é a imprensa pública que faz o contraponto, assegurando um serviço público isento, divulgador e potenciador da diversidade. No nosso caso, a prática demonstra que é exactamente o serviço público que menos abertura concede à opinião diferente e à divulgação de sensibilidades diferentes de um mesmo assunto. A concentração da mídia acarreta, no nosso caso, perigos muito maiores, susceptíveis de levar ao silenciamento de sensibilidades, manipulação da opinião pública, com títulos diferenciados a divulgarem uma mesma e única visão dos problemas e fenómenos da sociedade ou, ainda, a imposição de valores que sejam do interesse dos grupos dominantes. Temos, então, um problema de ordem estratégica que deve levar a nova ministra da Comunicação Social a agir rapidamente.
(…)
Sobretudo porque também há a suspeita de que a referida concentração da mídia estará a ser feita à custa de dinheiro que era suposto ser de todos os angolanos. ■

Ismael Mateus (in SA#356,p.17)



Como uma verdadeira lufada de ar fresco para tanta asfixia intelectual e académica que vai grassando por estas bandas, passou por nós recentemente alguém vindo da prestigiada Universidade de Coimbra, de sua graça Costa Andrade- um nome que tem a particularidade de nos ser bastante “familiar”. Estranhamente "familiar".
(…)
O prof. Costa Andrade veio até nós com a sua bagagem a transbordar de conhecimentos numa área da ciência jurídica - a do direito relacionado com a liberdade de imprensa e a comunicação social- onde localmente o défice é verdadeiramente assustador, a levantar outras questões mais delicadas até no plano da própria honestidade intelectual.
O reparo nada simpático é naturalmente dirigido aos nossos juristas ou a uma parte deles que nos últimos tempos se têm pronunciado sobre a matéria, com um visão tão redutora do fenómeno, que os atira definitivamente para a prateleira dos “advogados do diabo”, onde de facto estão a prestar um bom serviço.
O recurso a esta expressão só aparentemente poderá ser considerada ofensiva, uma vez que é nossa intenção colocar, o mais fundo possível, o dedo numa ferida que tem a ver com o papel dos intelectuais na nossa sociedade.
Trata-se de uma ferida já crónica, um verdadeiro "mabute".
Depois de todas as lições que à esquerda e à direita a história foi generosa em dar-nos, a este respeito somos resolutamente partidários de uma postura assumidamente independente da parte dos intelectuais em qualquer sociedade e contexto político, o que não põe em causa as suas eventuais opções partidárias ou eleitorais. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Criticar o “camarada Presidente” já não pode ser mais uma heresia, nem motivo para prolongadas travessias no deserto. Desgraçadamente ainda é.
Depois de tudo aquilo que nos foi dado a ouvir da boca do Prof. Costa Andrade - para total conforto e integral satisfação das nossas preocupações- pouco haverá mais para acrescentar em termos académicos ao debate sobre a liberdade de imprensa e os seus limites. Os tão famosos limites que os nossos “advogados do diabo” querem hoje transformar no próprio fundamento de um direito constitucional que é a liberdade de imprensa.
Mais do que isso, conforme frisou Costa Andrade referindo-se à liberdade de imprensa, estamos diante de uma verdadeira instituição do estado democrático, que ultrapassa os jornalistas e as suas makas com os políticos e vice-versa, para se apresentar como um dos pilares da própria sociedade, sem o qual é impensável falar-se em democracia.
(…)
Puxando abertamente o “cacusso para o nosso carvão”, diríamos que a liberdade de imprensa é a única garantia que os cidadãos têm rapidamente à sua mão para “sobreviverem” individualmente, sobretudo quando os “poderes democráticos” começam a ter ataques de caspa, de tosse convulsa ou de nervos de galinha.
São sintomas que, diariamente, vamos observando por estas bandas onde, em abono da verdade, o “estado de sitio” é já uma realidade, que os diferentes porta-vozes do regime tentam pintar de amarelo e de outras cores mais simpáticas.
Algumas das liberdades fundamentais em Angola estão efectivamente suspensas, estando o seu exercício dependente agora do bom ou mau humor das autoridades administrativas, que vão assim permitindo algumas “manobras” da malta. Depois fazem discursos inflamados dizendo que só num país onde há liberdade de imprensa é que a mesma pode ser discutida tão abertamente. O sofisma chega a ser brilhante, mas já não convence ninguém. Em qualquer parte do mundo o problema do exercício das liberdades está na ausência do medo; medo este que, como se sabe, é neste momento o principal produto distribuído pelas diferentes agências governamentais que se ocupam da “aplicação” da lei.
Em Angola o medo de ir parar a uma cadeia imunda e infecta é tão grande, tão grande, que paralisa os mais corajosos, por isso é que a coragem neste país precisava de outros programas televisivos e radiofónicos mais abrangentes que nos falassem deste valor em todas as suas dimensões.

Reginaldo Silva (aqui)



Notícias vindas de Portugal convidam-nos a reflectir sobre a concentração da mídia no nosso país. Nos últimos dias a sociedade portuguesa tem discutido um alegado plano governamental de compra de uma televisão privada através de uma empresa pública. A conclusão é a que todos já sabem: qualquer tutela de órgãos de comunicação, seja pública ou privada, tem o fim último de influenciar os conteúdos informativos.
(…)
Há, assim, muitos cruzamentos com Angola para não vermos semelhanças entre a estratégia de concentração desenvolvida tanto pela MediaNova como pela Score Media. A MediaNova detém a TV Zimbo, o jornal O País, a Rádio Mais, o Semanário Económico, a revista Chocolate, a revista Exame, uma agência de publicidade, Publivision, e ainda uma empresa de meios e a gráfica Damer. A Score Media, por sua vez, detém os semanários Sol que circula em Portugal, Angola e Moçambique, e Expansão, e a revista Estratégia. Diz-se que brevemente avançará para uma rádio e para um canal de TV. Qualquer destas empresas, que agora dominam a mídia angolana, estão afectos a pessoas ligadas ao poder político e económico. Os seus conteúdos e opções editoriais acabam por engrossar uma corrente de jornalismo light pró-governamental, há muito praticada pelos órgãos públicos. Trata-se, na verdade, da mesma corrente política, o mesmo modo de ver o país.
(…)
O lado perverso da concentração é que os grupos ganham poderes para alterar as regras da concorrência, moldar o mercado segundo as suas conveniências. De resto, foi o que aconteceu com a sobrevalorização dos salários dos jornalistas protagonizado primeiro pelos órgãos públicos e, depois, pela MediaNova. Se, por um lado, se pode alegar que se trata de uma mera operação comercial, por outro somos forçados a reflectir urgentemente sobre os perigos não só da concentração em si, mas da concentração na mídia num país diverso, pluriétnico, com grupos económicos emergentes e em reconciliação nacional. Nos países mais avançados é a imprensa pública que faz o contraponto, assegurando um serviço público isento, divulgador e potenciador da diversidade. No nosso caso, a prática demonstra que é exactamente o serviço público que menos abertura concede à opinião diferente e à divulgação de sensibilidades diferentes de um mesmo assunto. A concentração da mídia acarreta, no nosso caso, perigos muito maiores, susceptíveis de levar ao silenciamento de sensibilidades, manipulação da opinião pública, com títulos diferenciados a divulgarem uma mesma e única visão dos problemas e fenómenos da sociedade ou, ainda, a imposição de valores que sejam do interesse dos grupos dominantes. Temos, então, um problema de ordem estratégica que deve levar a nova ministra da Comunicação Social a agir rapidamente.
(…)
Sobretudo porque também há a suspeita de que a referida concentração da mídia estará a ser feita à custa de dinheiro que era suposto ser de todos os angolanos. ■

Ismael Mateus (in SA#356,p.17)


Saturday 27 February 2010

White Negritude

OU "A IDEOLOGIA DOS (PRETENSOS) AFECTOS"

(...)

Transference of cultural practices by close contact allows whites to write "black", a move that, besides the ultimate (albeit one step removed) indigenisation of the Euro-Brazilian, enables another transfer: the disappearance of the black by way of simultaneous incorporation and erasure. Black autonomous authorship (a voice that Freyre perceives as emblematic of US segregationism) is thus disqualified through transfer, together with mixed race authorship, a voice Freyre accuses of being intrinsically incapable of genuinely representing either race: not the manor, not the subaltern periphery, yet alone a synthesis or Brazilian ineffable heterogeneity.

Isfahani-Hammond recognises this dynamic, and sees Freyre situating "himself as a seignorial figure who has equal domain in elite and marginal sites, displacing people of mixed European/African ancestry from the embodiment of hybridization and, therein, from the ability to narrate or speak about national identity" (p. 14). Freyre finally "transfers" the south of Brazil: a site of degenerative modernisation, European immigration and influence, and, ultimately, Americanization. It is an alien and unauthentic locale; a source of foreign and therefore distorting stimuli.

At the end of a succession of discursive transfers, the white master's claim is the last one standing. His proximity to black commodified bodies enables authentic linguistic and spiritual incorporation, something that is denied to everyone else. Only the specific conditions of the northeastern plantation and the intimate contact between masters and slaves could produce Brazil's exceptional "Racial Democracy": "[t]he social history of the plantation manor is the intimate history of almost every Brazilian", Freyre concludes (quoted, p. 134). Casa Grande e Senzala is therefore exactly what the title says it is: a hierarchically organised dyad constituted by seigneural manor plus the contribution that emanates from the slave quarters. Despite their contribution, indeed exactly because of their contribution, the autonomous agency of the slaves and their descendants is effaced, and the seigneural manor remains the unique site of "genuine" Brazilian culture. Once the sequence of transfers is completed, Freyre's "almost every Brazilian", ends up reading like "every Brazilian who happens to be a white male seigneur who grew up in a plantation in the northeast of the country". An exceptionally inclusive tradition is thus recast into an exceptionally selective one.

Freyre ultimately took a conservative turn and his assertion of "Lusotropicalism" and its singularity sustained Portugal's imperialism throughout the 1960s and 1970s. He travelled to the African colonies in 1951 and 1952 where he recognised a number of "little Brazils", which for him was a good thing. The colonial establishment of the Portuguese state took advantage of Freyre's rhetoric and explicit complicity (see p. 163, n. 1). However, as Isfahani-Hammond illustrates, this evolution is actually much less discontinuous than the available literature is willing to acknowledge. While Freyrean notions of "racial Democracy" have been used in various contexts and for different purposes, an underlying continuity should be emphasised: he coherently supported a seigneural subjectivity against all its enemies, while at the same time expropriating and disallowing the cultural voice of Brazilian blackness. He consistently reclaimed a right to do so.

Freyre's transferist strategy, however, is not unique. Settlers elsewhere also need to enact physical and discursive transfers against their indigenous and exogenous opponents in order to effectively claim local versions of "genuine" indigenising cultural authenticity. Freyre's "creolization/indigenization", Isfahani-Hammond concludes, "is nationalistic and anticolonial yet grounded in symbolically Africanized, white dominance" (p. 52). Settler indigenisations elsewhere are also nationalistic and anticolonial; settlers need to build independent nations and supersede their dependency on the motherland. Settler indigenisation, of course, is also grounded on an indigenised white dominance that effaces really existing indigenous peoples.

[Here]

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O Dia Em Que o Leao (Nao) Comeu Pela Primeira Vez a Estrela

Jean-Baptiste Debret e a Coloracao da "Nossa" Escravidao no Brasil

"A Razao da Nossa Luta" 50 Anos Depois
OU "A IDEOLOGIA DOS (PRETENSOS) AFECTOS"

(...)

Transference of cultural practices by close contact allows whites to write "black", a move that, besides the ultimate (albeit one step removed) indigenisation of the Euro-Brazilian, enables another transfer: the disappearance of the black by way of simultaneous incorporation and erasure. Black autonomous authorship (a voice that Freyre perceives as emblematic of US segregationism) is thus disqualified through transfer, together with mixed race authorship, a voice Freyre accuses of being intrinsically incapable of genuinely representing either race: not the manor, not the subaltern periphery, yet alone a synthesis or Brazilian ineffable heterogeneity.

Isfahani-Hammond recognises this dynamic, and sees Freyre situating "himself as a seignorial figure who has equal domain in elite and marginal sites, displacing people of mixed European/African ancestry from the embodiment of hybridization and, therein, from the ability to narrate or speak about national identity" (p. 14). Freyre finally "transfers" the south of Brazil: a site of degenerative modernisation, European immigration and influence, and, ultimately, Americanization. It is an alien and unauthentic locale; a source of foreign and therefore distorting stimuli.

At the end of a succession of discursive transfers, the white master's claim is the last one standing. His proximity to black commodified bodies enables authentic linguistic and spiritual incorporation, something that is denied to everyone else. Only the specific conditions of the northeastern plantation and the intimate contact between masters and slaves could produce Brazil's exceptional "Racial Democracy": "[t]he social history of the plantation manor is the intimate history of almost every Brazilian", Freyre concludes (quoted, p. 134). Casa Grande e Senzala is therefore exactly what the title says it is: a hierarchically organised dyad constituted by seigneural manor plus the contribution that emanates from the slave quarters. Despite their contribution, indeed exactly because of their contribution, the autonomous agency of the slaves and their descendants is effaced, and the seigneural manor remains the unique site of "genuine" Brazilian culture. Once the sequence of transfers is completed, Freyre's "almost every Brazilian", ends up reading like "every Brazilian who happens to be a white male seigneur who grew up in a plantation in the northeast of the country". An exceptionally inclusive tradition is thus recast into an exceptionally selective one.

Freyre ultimately took a conservative turn and his assertion of "Lusotropicalism" and its singularity sustained Portugal's imperialism throughout the 1960s and 1970s. He travelled to the African colonies in 1951 and 1952 where he recognised a number of "little Brazils", which for him was a good thing. The colonial establishment of the Portuguese state took advantage of Freyre's rhetoric and explicit complicity (see p. 163, n. 1). However, as Isfahani-Hammond illustrates, this evolution is actually much less discontinuous than the available literature is willing to acknowledge. While Freyrean notions of "racial Democracy" have been used in various contexts and for different purposes, an underlying continuity should be emphasised: he coherently supported a seigneural subjectivity against all its enemies, while at the same time expropriating and disallowing the cultural voice of Brazilian blackness. He consistently reclaimed a right to do so.

Freyre's transferist strategy, however, is not unique. Settlers elsewhere also need to enact physical and discursive transfers against their indigenous and exogenous opponents in order to effectively claim local versions of "genuine" indigenising cultural authenticity. Freyre's "creolization/indigenization", Isfahani-Hammond concludes, "is nationalistic and anticolonial yet grounded in symbolically Africanized, white dominance" (p. 52). Settler indigenisations elsewhere are also nationalistic and anticolonial; settlers need to build independent nations and supersede their dependency on the motherland. Settler indigenisation, of course, is also grounded on an indigenised white dominance that effaces really existing indigenous peoples.

[Here]

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Wednesday 24 February 2010

Yes, Prime Minister!...

... Ou a Cultura do "Trungunguismo" em 10 Downing Street!


Se a serie televisiva Yes Minister! e sua sequela Yes, Prime Minister! - uma satira politica Britanica da decada de 80 do seculo passado que sempre me deu muito prazer assistir - ainda estivesse no activo, muito provavelmente teriamos Sir Humphrey argumentando perante os media, em defesa de Gordon Brown, que as acusacoes de "trungunguismo" contra os seus funcionarios de que este tem sido alvo nos ultimos dias, nao passam de "manobras dos Tories" e de alguns "ressaibados" (ex?)amigos do peito de Tony Blair (como esse agastado Peter Mandelson) para derrubarem a "torre de forca e caracter" que e' o seu Primeiro Ministro! Mas que ele, Humphrey, tinha Brown perfeitamente sob controlo... Ao que, por detras da cortina, Brown lhe gritaria "shut up, you fucking bastard!!!" e Sir Humphrey responderia mui diligente e sarcasticamente: "Yes, Prime Minister!"

Enfim, depois do recente escandalo financeiro protagonizado por alguns dos seus deputados, o establishment politico Britanico continua a dar cartas em muito do que e' suposto so' acontecer no dito terceiro mundo...
... Ou a Cultura do "Trungunguismo" em 10 Downing Street!


Se a serie televisiva Yes Minister! e sua sequela Yes, Prime Minister! - uma satira politica Britanica da decada de 80 do seculo passado que sempre me deu muito prazer assistir - ainda estivesse no activo, muito provavelmente teriamos Sir Humphrey argumentando perante os media, em defesa de Gordon Brown, que as acusacoes de "trungunguismo" contra os seus funcionarios de que este tem sido alvo nos ultimos dias, nao passam de "manobras dos Tories" e de alguns "ressaibados" (ex?)amigos do peito de Tony Blair (como esse agastado Peter Mandelson) para derrubarem a "torre de forca e caracter" que e' o seu Primeiro Ministro! Mas que ele, Humphrey, tinha Brown perfeitamente sob controlo... Ao que, por detras da cortina, Brown lhe gritaria "shut up, you fucking bastard!!!" e Sir Humphrey responderia mui diligente e sarcasticamente: "Yes, Prime Minister!"

Enfim, depois do recente escandalo financeiro protagonizado por alguns dos seus deputados, o establishment politico Britanico continua a dar cartas em muito do que e' suposto so' acontecer no dito terceiro mundo...

Sunday 21 February 2010

Ten Times a Winner!

The Angolan Women National Handball Team won its 10th African Cup playing against Tunisia today in Egypt!*

[Details here and here]


*With this feat they join the Men National Basketball Team which holds a similar record.
The Angolan Women National Handball Team won its 10th African Cup playing against Tunisia today in Egypt!*

[Details here and here]


*With this feat they join the Men National Basketball Team which holds a similar record.

Saturday 20 February 2010

E assim continua o Annus Angolensis...


[Ismael Mateus - in SA #355, pg. 17]



Cansado de ver o meu grupo a ser vergonhosamente derrotado pelo Júri na secretaria, este ano nem vi o Unidos a desfilar na Marginal. Este ano, pelos vistos, foi o Júri que se cansou de combater o que há de melhor no Carnaval de Luanda e lá nos fez o "favor" de reconhecer o óbvio. E o óbvio é que o Unidos de Caxinde, com apenas cerca de 10 anos de existência, é mesmo o melhor, na tradição e na modernidade, quer o Júri queira, quer não. Este ano, pela 2ª vez, o Júri quis. Bem hajam!

{Reginaldo Silva - aqui}

[Ismael Mateus - in SA #355, pg. 17]



Cansado de ver o meu grupo a ser vergonhosamente derrotado pelo Júri na secretaria, este ano nem vi o Unidos a desfilar na Marginal. Este ano, pelos vistos, foi o Júri que se cansou de combater o que há de melhor no Carnaval de Luanda e lá nos fez o "favor" de reconhecer o óbvio. E o óbvio é que o Unidos de Caxinde, com apenas cerca de 10 anos de existência, é mesmo o melhor, na tradição e na modernidade, quer o Júri queira, quer não. Este ano, pela 2ª vez, o Júri quis. Bem hajam!

{Reginaldo Silva - aqui}

Friday 19 February 2010

Just a few (more) good reasons to visit MyWeku














{Please click on pictures to access}













{Please click on pictures to access}

Tuesday 16 February 2010

Stupidity






No, Diesel isn't paying me for this.


This is just one of the most stupidly smart campaigns I've ever seen...


Come on, Be Stupid!







No, Diesel isn't paying me for this.


This is just one of the most stupidly smart campaigns I've ever seen...


Come on, Be Stupid!


Sunday 14 February 2010

Reviving Haiti Through Its Music*


Cristophe Colomb fut le premier à découvrir Haïti en 1492, un évènement qui devait transformer la région en une économie esclavagiste basée sur le commerce lucrative de la canne à sucre et autres produits agricoles. Au 17ème siècle, Haïti, la Martinique et la Guadeloupe étaient déjà devenues des colonies françaises. Haïti parvint à l’indépendence en 1804 suite à la révolte des esclaves, qui fut d’ailleurs la seule couronnée de succès de toute l’histoire.


La quasi totalité des genres musicaux venant d’ Haïti, de Martinique et de Guadeloupe est basée sur des rythmes traditionnels africains. Le compass Haïtien est un rythme medio tempo vraiment captivant et rempli de quiproquos à connotation sexuelle dont le saxophonist Jean Baptiste Nemours fut l’un des précurseurs. Sur le plan musical, ce style s’inspire directement de rythmes aussi variés que la merengue dominicaine, le calypso de l’ile de la Trinité, le jazz, le swing et plus récement le hip hop américain. Dès les années 60-70, le compass haïtien était également devenu le style de musique le plus populaire en Martinique et en Guadeloupe.


Michel Martelly, plus connu sous le nom de “Sweet Micky” a grandi à Carrefour, une banlieue de Port-Au-Prince, avec son frère et ses quatre souers. Son charme charimastique et sa voix brûlante ont propulsé Sweet Micky au firmament de la scène musicale compass haïtienne. Allors qu’il attribute son inspiration à des artistes comme Tabou Combo, Skah Shah et la légende du Cap Vert Cesária Évora. Micky a crée son propre son en alliant le compass avec quelques touches de reggae, de jazz, de soca et même de rara haïtienne (genre musical inspiré d’un festival folklorique haïtien).


[Pa Manyen Fanm Nan - Michel Martelly]

“Pa Manyen Fanm Nan” a été enregistré dans le cadre du très acclamé projet Haïti Twoubadou. La musique de cette chanson, rendue célèbre dans le monde entier par Cesária Évora, reprend l’hymne de Ramiro Mendes.


[Angola - Cesária Évora]

The enthralling style of music known as twoubadou dates back to the turn of the 20th century, when Haïtian migrant workers, returning from Cuban sugar plantations, brought this guitar-driven genre back with them. The Haïti Twoubadou project’s producers Fabrice Rouzier and Clement Belizaire put together a lineup that reads like an all-star list of the contemporary Haitian music scene. It features Michel Martelly, Les Freres Dodo, James Germain, Fabrice Rouzier, Michael Benjamin, Ralph Papillion, Hans Peters, Black Alex, Don Kato, Jackito, Beethova Obas and many others. These troubadours have also used the spotlight that the project has generated to help raise awareness for a variety of social problems in Haïti, including support for better education and the fight against AIDS.
Haïti Twoubadou has become such a success that the series has now extended to four volumes. This romantic sound that evokes Haïti’s windswept beaches is now being imitated in countless new twoubadou recordings, and has sparked a revival of acoustic music in the Haïtian diaspora.


[Ki Demon Sa-a - Haïti Twoubadou]


Emeline Michel was born in Gonaives, Haiti. She began singing gospel music in her local church. After studying music professionally at the Detroit Jazz Center; Michel returned to Haiti, where she released the first of her seven CDs, and was subsequently dubbed, “The Queen of Haitian Song.” Michel has made a name for herself through both her consciously aware songwriting and captivating performances. Her music combines traditional Haitian melodies with a plethora of sounds including compass, twoubadou, rara, jazz, rock, blues, bossa nova and samba.
“Moso Manman” is from Michel’s album Cordes et Ame (Strings and Soul). It is a self-produced collection of predominantly acoustic songs centered around the theme of perseverance (many are references to the political and social struggles that Haiti has been going through). Emeline Michel wrote “Moso Manman (Strong Mama)” as an ode to mothers. The lyrics say, “Dance with me mama, come dance with me mama, because even with diamonds, I can never repay you.”


[Moso Manman - Emeline Michel]

Alex Abellard launched the cutting-edge Haitian compass band Zin while he was attending City College of New York in the late 1980s. Zin is a Haitian creole word that can be interpreted both as “extraordinary” and “gossip”, two ideas that, as the group’s founder Alex Abellard puts it, “conjure up the image of the group, something that’s amazing, perhaps gossip, but something that you certainly want to hear.”
In the late 1980s, after the Haitian dictator Duvalier was overthrown, compass experienced a revival in Haiti and in expatriot communities like Miami and Brooklyn (now, the place with the second largest Haitian population in the world after Port au Prince). “When we came to New York,” explains Abellard, “we were listening to other music such as disco and hip-hop. We wanted to create a sound that was both from our own country [Haiti] while modernizing it at the same time.”


[Kanpe Sou Yon Bit - Zin]

In the late 1990s, Carlo Vieux, Richard Cave’, and Mickael Guirand decided to leave their native Haiti to pursue musical careers in the United States. All three men had strong backgrounds in Haitian compass, having played in the past with a number of popular groups. When they united in New York City, they moved to create a dynamic new form of Haitian compass, adding touches of zouk, reggae and hip-hop. Their name is a fusion of the band members’ names: Carlo, Richard, and Mickael.
“Ayiti (Bang Bang)” is the title track from their groundbreaking debut recording. The song became an immediate smash, and helped the group win “Album of the Year” at the 2001 Haitian Music Awards. Carimi uses the song as a strong indictment on the current socio-economic situation in Haiti, comparing it to the lawlessness portrayed in comic books (The reference to “Lucky Luke” in the song comes from a Belgian comic book character) and Hollywood’s images of the wild west: “My country has turned into a cowboy movie/ Bang Bang, Lucky Luke/ My country’s not a game/ Stop playing with it.”


[Ayiti (Bang Bang) - Carimi]



Tendo comecado com uma cancao em que se podem ouvir notas de outras ilhas musicais (Cabo Verde), termino com duas que, por sua vez, revelam a influencia do Haiti na linguagem musical de outras ilhas do Caribe/Antilhas, nomeadamente a Martinica e Guadeloupe (neste caso com os Kassav - que, interessantemente, em mwangole' se traduz para, mais do que apenas mandioca, funje - e um certo Rete', ja' tocado neste blog ha' uns tempos, que tambem diz algo sobre o (re)contagio destes estilos musicais com alguma da musica feita por Angolanos, como pode ser constatado aqui). Veja-se tambem, a este proposito, embora neste caso nao se possa falar propriamente de um directo "(re)contagio", o Kanpe Sou Yon Bit dos Zin, acima, em relacao a alguma da musica de um certo Afroman...


[Man Biswenw - Jean-Luc Alger]

Jean-Luc Alger hails from Martinique and had a long and illustrious career on the Caribbean music scene. He joined his first band in 1970, Les Sympas, with which he performed Haitian style compas. After a brief stint in the military, where he was part of the army band, he embarked on a successful career as bandleader and singer for the group Lazair. One highlight of this period was his work with famed singer Edith Lefel, with whom he recorded the hit song “Ice Manman” in 1984. Since the early 1990s, Alger has been working with the band Klima, and has specialized in hard-driving zouk performed with a real horn section and rhythms that keep a close connection to the roots and folklore of the French Caribbean. Recently, Alger has been working closely with producer Ronald Rubinel, one of the most respected and inventive composers and producers in modern French Caribbean music.


[Rete' - Kassav]

The world’s leading zouk band, Kassav, began with the inspiration of three men from Guadeloupe: brothers Pierre-Edouard and Georges Decimus and Jacob Desvarieux. They used the latest studio technology from Paris and created a new sound by fusing salsa, compass, reggae and other Caribbean styles with the folk rhythms of Martinique and Guadeloupe. “Before we got started”, explains Desvarieux, “the scene here in the French Antilles was dominated by Haitian compass. We wanted to create something new.”
Their name comes from the popular Caribbean dish, cassava (a mix of manioc paste and coconut). The band took shape with some of the leading musicians and vocalists from Guadeloupe and Martinique such as Jocelyn Beroard, Ralph Thamar and Jean-Phillipe Marthely. They quickly became one of the most successful bands both in France and the Caribbean, recording over a dozen hit albums, and inventing a genre.
By the mid-1980s, the group was selling out stadiums around the world with tours that spanned six continents. Kassav’s live version of the Jean-Philippe Marthely composition “Rete” is from their legendary 1986 concert at the Zenith in Paris.





*{In response to the devastating earthquake in Haiti, Putumayo Records is re-releasing their French Caribbean CD (first released in 2003 and on which this post is based) and donating 100% of the proceeds from the sale of each CD to The Red Cross, throughout 2010. Five of the (10) songs on the collection are by Haitian musicians.}

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Cristophe Colomb fut le premier à découvrir Haïti en 1492, un évènement qui devait transformer la région en une économie esclavagiste basée sur le commerce lucrative de la canne à sucre et autres produits agricoles. Au 17ème siècle, Haïti, la Martinique et la Guadeloupe étaient déjà devenues des colonies françaises. Haïti parvint à l’indépendence en 1804 suite à la révolte des esclaves, qui fut d’ailleurs la seule couronnée de succès de toute l’histoire.


La quasi totalité des genres musicaux venant d’ Haïti, de Martinique et de Guadeloupe est basée sur des rythmes traditionnels africains. Le compass Haïtien est un rythme medio tempo vraiment captivant et rempli de quiproquos à connotation sexuelle dont le saxophonist Jean Baptiste Nemours fut l’un des précurseurs. Sur le plan musical, ce style s’inspire directement de rythmes aussi variés que la merengue dominicaine, le calypso de l’ile de la Trinité, le jazz, le swing et plus récement le hip hop américain. Dès les années 60-70, le compass haïtien était également devenu le style de musique le plus populaire en Martinique et en Guadeloupe.


Michel Martelly, plus connu sous le nom de “Sweet Micky” a grandi à Carrefour, une banlieue de Port-Au-Prince, avec son frère et ses quatre souers. Son charme charimastique et sa voix brûlante ont propulsé Sweet Micky au firmament de la scène musicale compass haïtienne. Allors qu’il attribute son inspiration à des artistes comme Tabou Combo, Skah Shah et la légende du Cap Vert Cesária Évora. Micky a crée son propre son en alliant le compass avec quelques touches de reggae, de jazz, de soca et même de rara haïtienne (genre musical inspiré d’un festival folklorique haïtien).


[Pa Manyen Fanm Nan - Michel Martelly]

“Pa Manyen Fanm Nan” a été enregistré dans le cadre du très acclamé projet Haïti Twoubadou. La musique de cette chanson, rendue célèbre dans le monde entier par Cesária Évora, reprend l’hymne de Ramiro Mendes.


[Angola - Cesária Évora]

The enthralling style of music known as twoubadou dates back to the turn of the 20th century, when Haïtian migrant workers, returning from Cuban sugar plantations, brought this guitar-driven genre back with them. The Haïti Twoubadou project’s producers Fabrice Rouzier and Clement Belizaire put together a lineup that reads like an all-star list of the contemporary Haitian music scene. It features Michel Martelly, Les Freres Dodo, James Germain, Fabrice Rouzier, Michael Benjamin, Ralph Papillion, Hans Peters, Black Alex, Don Kato, Jackito, Beethova Obas and many others. These troubadours have also used the spotlight that the project has generated to help raise awareness for a variety of social problems in Haïti, including support for better education and the fight against AIDS.
Haïti Twoubadou has become such a success that the series has now extended to four volumes. This romantic sound that evokes Haïti’s windswept beaches is now being imitated in countless new twoubadou recordings, and has sparked a revival of acoustic music in the Haïtian diaspora.


[Ki Demon Sa-a - Haïti Twoubadou]


Emeline Michel was born in Gonaives, Haiti. She began singing gospel music in her local church. After studying music professionally at the Detroit Jazz Center; Michel returned to Haiti, where she released the first of her seven CDs, and was subsequently dubbed, “The Queen of Haitian Song.” Michel has made a name for herself through both her consciously aware songwriting and captivating performances. Her music combines traditional Haitian melodies with a plethora of sounds including compass, twoubadou, rara, jazz, rock, blues, bossa nova and samba.
“Moso Manman” is from Michel’s album Cordes et Ame (Strings and Soul). It is a self-produced collection of predominantly acoustic songs centered around the theme of perseverance (many are references to the political and social struggles that Haiti has been going through). Emeline Michel wrote “Moso Manman (Strong Mama)” as an ode to mothers. The lyrics say, “Dance with me mama, come dance with me mama, because even with diamonds, I can never repay you.”


[Moso Manman - Emeline Michel]

Alex Abellard launched the cutting-edge Haitian compass band Zin while he was attending City College of New York in the late 1980s. Zin is a Haitian creole word that can be interpreted both as “extraordinary” and “gossip”, two ideas that, as the group’s founder Alex Abellard puts it, “conjure up the image of the group, something that’s amazing, perhaps gossip, but something that you certainly want to hear.”
In the late 1980s, after the Haitian dictator Duvalier was overthrown, compass experienced a revival in Haiti and in expatriot communities like Miami and Brooklyn (now, the place with the second largest Haitian population in the world after Port au Prince). “When we came to New York,” explains Abellard, “we were listening to other music such as disco and hip-hop. We wanted to create a sound that was both from our own country [Haiti] while modernizing it at the same time.”


[Kanpe Sou Yon Bit - Zin]

In the late 1990s, Carlo Vieux, Richard Cave’, and Mickael Guirand decided to leave their native Haiti to pursue musical careers in the United States. All three men had strong backgrounds in Haitian compass, having played in the past with a number of popular groups. When they united in New York City, they moved to create a dynamic new form of Haitian compass, adding touches of zouk, reggae and hip-hop. Their name is a fusion of the band members’ names: Carlo, Richard, and Mickael.
“Ayiti (Bang Bang)” is the title track from their groundbreaking debut recording. The song became an immediate smash, and helped the group win “Album of the Year” at the 2001 Haitian Music Awards. Carimi uses the song as a strong indictment on the current socio-economic situation in Haiti, comparing it to the lawlessness portrayed in comic books (The reference to “Lucky Luke” in the song comes from a Belgian comic book character) and Hollywood’s images of the wild west: “My country has turned into a cowboy movie/ Bang Bang, Lucky Luke/ My country’s not a game/ Stop playing with it.”


[Ayiti (Bang Bang) - Carimi]



Tendo comecado com uma cancao em que se podem ouvir notas de outras ilhas musicais (Cabo Verde), termino com duas que, por sua vez, revelam a influencia do Haiti na linguagem musical de outras ilhas do Caribe/Antilhas, nomeadamente a Martinica e Guadeloupe (neste caso com os Kassav - que, interessantemente, em mwangole' se traduz para, mais do que apenas mandioca, funje - e um certo Rete', ja' tocado neste blog ha' uns tempos, que tambem diz algo sobre o (re)contagio destes estilos musicais com alguma da musica feita por Angolanos, como pode ser constatado aqui). Veja-se tambem, a este proposito, embora neste caso nao se possa falar propriamente de um directo "(re)contagio", o Kanpe Sou Yon Bit dos Zin, acima, em relacao a alguma da musica de um certo Afroman...


[Man Biswenw - Jean-Luc Alger]

Jean-Luc Alger hails from Martinique and had a long and illustrious career on the Caribbean music scene. He joined his first band in 1970, Les Sympas, with which he performed Haitian style compas. After a brief stint in the military, where he was part of the army band, he embarked on a successful career as bandleader and singer for the group Lazair. One highlight of this period was his work with famed singer Edith Lefel, with whom he recorded the hit song “Ice Manman” in 1984. Since the early 1990s, Alger has been working with the band Klima, and has specialized in hard-driving zouk performed with a real horn section and rhythms that keep a close connection to the roots and folklore of the French Caribbean. Recently, Alger has been working closely with producer Ronald Rubinel, one of the most respected and inventive composers and producers in modern French Caribbean music.


[Rete' - Kassav]

The world’s leading zouk band, Kassav, began with the inspiration of three men from Guadeloupe: brothers Pierre-Edouard and Georges Decimus and Jacob Desvarieux. They used the latest studio technology from Paris and created a new sound by fusing salsa, compass, reggae and other Caribbean styles with the folk rhythms of Martinique and Guadeloupe. “Before we got started”, explains Desvarieux, “the scene here in the French Antilles was dominated by Haitian compass. We wanted to create something new.”
Their name comes from the popular Caribbean dish, cassava (a mix of manioc paste and coconut). The band took shape with some of the leading musicians and vocalists from Guadeloupe and Martinique such as Jocelyn Beroard, Ralph Thamar and Jean-Phillipe Marthely. They quickly became one of the most successful bands both in France and the Caribbean, recording over a dozen hit albums, and inventing a genre.
By the mid-1980s, the group was selling out stadiums around the world with tours that spanned six continents. Kassav’s live version of the Jean-Philippe Marthely composition “Rete” is from their legendary 1986 concert at the Zenith in Paris.





*{In response to the devastating earthquake in Haiti, Putumayo Records is re-releasing their French Caribbean CD (first released in 2003 and on which this post is based) and donating 100% of the proceeds from the sale of each CD to The Red Cross, throughout 2010. Five of the (10) songs on the collection are by Haitian musicians.}

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Saturday 13 February 2010

Rabelai, Rabelais, Rabelait...



Pensamento 'absurdo' (?):
Primeiro "peixe trungungueiro graudo"
a cair nas malhas da "tolerancia zero"?



... Ou "o quarto poder" (ou seria "o p(h)oder" no quarto? ou "o quarto de p(h)oder"?) com as tripas de fora!



[Forme a sua propria opiniao aqui , aqui e aqui]


[Votos de boa sorte a nova Ministra da Comunicacao Social, Carolina Cerqueira]


Pensamento 'absurdo' (?):
Primeiro "peixe trungungueiro graudo"
a cair nas malhas da "tolerancia zero"?



... Ou "o quarto poder" (ou seria "o p(h)oder" no quarto? ou "o quarto de p(h)oder"?) com as tripas de fora!



[Forme a sua propria opiniao aqui , aqui e aqui]


[Votos de boa sorte a nova Ministra da Comunicacao Social, Carolina Cerqueira]

Thursday 11 February 2010

Alexander McQueen's Shocking Death

May his soul rest in peace

[Details here ]
May his soul rest in peace

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Jean-Baptiste Debret e a Coloracao da "Nossa" Escravidao no Brasil


Nos comentários que acompanham as pranchas de Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, é ambíguo o olhar que Debret lança aos negros. Embora reconheça que neste país “tudo assenta no escravo negro” e condene os castigos públicos - “revoltantes para um europeu” (DEBRET: 1954,85-86) -, o pintor segue descrevendo os negros sob a ótica racista própria ao século XIX.


Em comentário sobre os castigos dados aos escravos, destacado por vários autores, Debret diz que “o negro é indolente, vegeta onde se encontra, compraz-se na sua nulidade e faz da preguiça sua ambição; por isso a prisão é para ele um asilo sossegado, que pode satisfazer sem perigo sua paixão pela inação [...].”


O impacto desta visualidade tão desconexa de seu acervo imagético, viria desenvolver, potencializado por seu olhar estrangeiro, uma certa qualidade de 'esquizo'...


Esse olhar estrangeiro, por vezes assemelha-se ao olhar da criança - o olhar-imaginação, que estabelece conflito entre o que vê e o que acha que vê.


Debret vê o Brasil como imensas manchas de cor, seu olhar é pictórico; não obstante, em sua narrativa, por vezes o imaginário precede o diagnóstico – o real é construído.



[Sobre Jean-Baptiste Debret]

Nos comentários que acompanham as pranchas de Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, é ambíguo o olhar que Debret lança aos negros. Embora reconheça que neste país “tudo assenta no escravo negro” e condene os castigos públicos - “revoltantes para um europeu” (DEBRET: 1954,85-86) -, o pintor segue descrevendo os negros sob a ótica racista própria ao século XIX.


Em comentário sobre os castigos dados aos escravos, destacado por vários autores, Debret diz que “o negro é indolente, vegeta onde se encontra, compraz-se na sua nulidade e faz da preguiça sua ambição; por isso a prisão é para ele um asilo sossegado, que pode satisfazer sem perigo sua paixão pela inação [...].”


O impacto desta visualidade tão desconexa de seu acervo imagético, viria desenvolver, potencializado por seu olhar estrangeiro, uma certa qualidade de 'esquizo'...


Esse olhar estrangeiro, por vezes assemelha-se ao olhar da criança - o olhar-imaginação, que estabelece conflito entre o que vê e o que acha que vê.


Debret vê o Brasil como imensas manchas de cor, seu olhar é pictórico; não obstante, em sua narrativa, por vezes o imaginário precede o diagnóstico – o real é construído.



[Sobre Jean-Baptiste Debret]

Wednesday 10 February 2010

O CAN da "nossa" Globalizacao...

(...)

Angola has spent an estimated $1bn (£615m) in building four new stadiums and associated infrastructure.
The work has been almost exclusively outsourced. A Chinese company using Chinese labour has been responsible constructing four gleaming state-of-the-art venues.
They rise impressively out of the dust, but are set to stand empty for most of the year.
A UK firm has laid the pitches, the television pictures are supplied by a French company, accreditation was provided by experts from Germany, the fake shirts available on the street were made in Portugal.

[Here]

N.B.: Faltou acrescentar a directa ascendencia portuguesa do "nosso" treinador nacional, do arquitecto do "nosso" estadio nacional do "nosso" 11 de Novembro do "nosso" CAN e da "nossa" coreografa-em-chefe ex-critica do sistema, que, claramente sem saber de que terra e', coitad@, a "nossa" terra foi parar como "nossa" escrava branca kaTchokwe', comandando suas tropas de elite e 'patrioticamente' arrotando postas do "nosso" bacalhau da Noruega em perfeito 'timming' nos "nossos" midia (who said that "sex doesn't sell"?!) sobre a "nossa" cultura e as "nossas" raizes, em nome dos "nossos" ancestrais, e blasfemando 'descomplexada' e mui 'educadamente' (porra!!!) contra essa tal de "nossa" globalizacao que nao ha' meio de acabar e que so' veio aumentar os "nossos" patrocinios e corromper o "nosso" internacionalismo proletario comunista (fidelista) , o "nosso" nacional socialismo de esquerda (stalinista) e mais o "nosso" patriot(eir)ismo (chauvinista)... tudo ao som da "nossa" musica classica europeia e rematado com uma bela sessao do "nosso" ballet classico kaTchokwe' protagonizado por um par de vultos extra-terrestres caidos sabe-se la' de que progresso e, finalmente com uma boa funjada a "nossa" maneira com ingredientes supostamente importados va-se la' saber de que alem mares!
Nosso (unico) Gooooolo!!!


[Oh yes, WE can... ehehehehehehe]
(...)

Angola has spent an estimated $1bn (£615m) in building four new stadiums and associated infrastructure.
The work has been almost exclusively outsourced. A Chinese company using Chinese labour has been responsible constructing four gleaming state-of-the-art venues.
They rise impressively out of the dust, but are set to stand empty for most of the year.
A UK firm has laid the pitches, the television pictures are supplied by a French company, accreditation was provided by experts from Germany, the fake shirts available on the street were made in Portugal.

[Here]

N.B.: Faltou acrescentar a directa ascendencia portuguesa do "nosso" treinador nacional, do arquitecto do "nosso" estadio nacional do "nosso" 11 de Novembro do "nosso" CAN e da "nossa" coreografa-em-chefe ex-critica do sistema, que, claramente sem saber de que terra e', coitad@, a "nossa" terra foi parar como "nossa" escrava branca kaTchokwe', comandando suas tropas de elite e 'patrioticamente' arrotando postas do "nosso" bacalhau da Noruega em perfeito 'timming' nos "nossos" midia (who said that "sex doesn't sell"?!) sobre a "nossa" cultura e as "nossas" raizes, em nome dos "nossos" ancestrais, e blasfemando 'descomplexada' e mui 'educadamente' (porra!!!) contra essa tal de "nossa" globalizacao que nao ha' meio de acabar e que so' veio aumentar os "nossos" patrocinios e corromper o "nosso" internacionalismo proletario comunista (fidelista) , o "nosso" nacional socialismo de esquerda (stalinista) e mais o "nosso" patriot(eir)ismo (chauvinista)... tudo ao som da "nossa" musica classica europeia e rematado com uma bela sessao do "nosso" ballet classico kaTchokwe' protagonizado por um par de vultos extra-terrestres caidos sabe-se la' de que progresso e, finalmente com uma boa funjada a "nossa" maneira com ingredientes supostamente importados va-se la' saber de que alem mares!
Nosso (unico) Gooooolo!!!


[Oh yes, WE can... ehehehehehehe]

Sunday 7 February 2010

1960-2010: “The Year of Africa” 50 Years On (II)

"A RAZAO DA NOSSA LUTA" 50 ANOS DEPOIS...

Este historico texto (historico, tanto no sentido temporal – porque escrito em 1974; como no sentido reflexivo – na medida em que nos permite uma avaliacao, nao so’ dos seus fundamentos argumentativos a altura em que foi escrito, como da sua validade e relevancia actual) de M.M. de Brito Junior, serve-me de mote para o segundo take desta serie sobre a comemoracao dos 50 Anos do “Ano de Africa”.

Para tanto, dele extraio algumas passagens que me parecem ser merecedoras de uma viagem no tempo desde 1974 ate’ 2010, para servirem de base a algumas interrogacoes sobre a Angola “que estamos com ela” hoje, ou seja, a uma especie de “Estado da Nacao” cerca de 5 decadas desde o inicio da luta armada contra o colonialismo e mais de 3 decadas desde a independencia do pais:

A LUTA DOS COLONIZADORES E DOS COLONIZADOS

Existiram sempre duas posições definidas na vida politica de Angola. Uma, a dos colonizadores, constituída pelos Europeus e seus descendentes. Outra, a dos colonizados constituída pelos an-golanos, tradicionalmente considerados africanos, indígenas, nativos, assimilados.

- Sera’ esta formulacao ainda valida, num contexto em que, especialmente a luz das novas formulacoes ideologico-culturais de uma dita "nacao crioula", falar-se em “Africanos vs. Europeus e seus descendentes”, ou de “indigenas” e “nativos” pode ser considerado “crime de lesa patria”, incluindo por alguns “(ex?) anti-colonialistas”?

NÓS LUTAMOS CONTRA A OCUPAÇÃO

A verdadeira Historia de Angola narra os altos feitos dos angolanos na luta armada contra a ocupação portuguesa nos Dembos, no Congo, no Libolo, no Huambo, no Amboim, no Cuamato, na Lunda, enfim, em toda Angola. As chamadas «guerras de pacificação», durante as quais foram dizimados dezenas de (?) de milhares de angolanos, mostram bem que os indígenas angolanos, os colonizados, sempre lutaram de armas na mão contra o colonialismo, contra os colonizadores.

- Havera' hoje um consenso sobre o que/qual e' a "verdadeira Historia de Angola"?

- Como se contextualiza historica e politicamente essa luta, numa era em que a “recolonizacao” cada vez mais esta’ na ordem do dia?

NÓS LUTAMOS CONTRA O ANALFABETISMO

Noventa por cento do povo angolano (colonizado) é analfabeto. Sistematicamente fomos postos à margem no campo da instrução. Os governos colonizadores só construíram escolas onde hou-vesse europeus que ocupassem, pelo menos, 2/3 da sala. Mesmo existindo sanzalas com mais de 500 crianças indígenas em idade escolar o Estado não abria ai escolas. Estes só eram instruídos onde houvesse escolas das Missões. Os indígenas que podiam estudar nas escolas do Estado só eram aqueles cujos pais possuís-sem «atestado de assimilação» e bilhete de identidade.

- Como esta’ o acesso ao ensino para a maioria da populacao de hoje?

NÓS LUTAMOS CONTRA O CONTRATO

Uma das mais vergonhosas leis da opressão colonialista é o chamado «contrato indígena». Rusgados como animais, os indígenas eram mandados para as plantações (dos colonos), para as pescarias (dos colonos), para as salinas (dos colonos), para as minas ( dos imperialistas), onde sofriam todas as desumanidades do trabalho forçado.

- Ja’ nao ha’ sistema de contrato (pelo menos formalmente), mas nao haverao actualmente outras formas de trabalho igualmente desumanas no pais?

NÓS LUTAMOS CONTRA A HUMILHAÇÃO

Se hoje o indígena é capaz de levantar a cabeça é porque muita luta travámos contra a humilhação. Os colonizadores tratavam- nos como cães, humilharam-nos de todas as maneiras e feitios. Mesmo esbofeteados tínhamos que mostra um sorriso, porque se não apanhávamos mais. Um gesto de revolta contra um atitude injusta era motivo para severos castigos corporais, culpados de insubordinação e falta de respeito. Conhecemos um velho (Apolinário) que foi deportado três vezes, por períodos superiores a 3 anos, só porque respondia ás agressões e insultos dos colonizadores. Estes não admitiam que um indígena lhes tocasse na cara, mesmo em resposta a um agressão. Cão, moleque, miúdo, rapaz, chico macaco, sempre nos chamaram, com o intuito de nos humilhar. (…) Hoje levantamos as cabeças, bem alto, olhamos para a frente, para o futuro, já não baixamos os olhos para o chão quando falamos com um colonizador. Foi uma luta ingente e vencemos.

- Continuamos ainda de “cabecas levantadas”? Confesso que ha’ individuos hoje em Angola que so’ me merecem mesmo que lhes chame "caes, moleques, miudos e rapazes (quando nao sub-rapazes ou rapazitos)" – mas apenas e tao so’ porque, justamente, nao so’ vivem de lamber as botas aos seus novos “capatazes”, como entendem que eu e “todo o mundo” tambem o deve fazer, sob pena de, "sabendo sempre o que nos espera", bem entendido, sermos por eles linchados e literalmente pulverizados (armados que estao agora da "titularidade" de alguns dos principais orgaos formais do dito "quarto poder"...), mesmo e sobretudo quando reagindo a insultos gratuitos, ofensas e agressoes morais e materiais gravissimas, incluindo ameacas de morte (!), que nos sao infligidos, a nos e aos nossos ancestrais e descendentes, por alegadas “insubordinacao e falta de respeito”, hoje mais frequentemente designadas de “atrevimento (de pobres e insignificantes criaturas)”!

NÓS LUTAMOS CONTRA A DISCRIMINAÇÃO

Em Angola existe discriminação racial, embora não oficial. No campo salarial um indígena ganhava, geralmente, um terço do que ganhava um colonizador. Isto em todas as actividades do sector privado. Quando reclamássemos ouvíamos do patrão: «queres ganhar como um branco?». Podíamos saber mais da profissão do que um colonizador mas este era sempre o chefe, o encarregado. (…) Hoje fazemos greves e exigimos salários iguais. Continuaremos a luta.


- “Hoje fazemos greves e exigimos salários iguais”? Ou, ja' agora, "patrocinios" iguais?

- “Continuamos a luta?” Ou, antes, somos acusados por alguns dos “nossos irmaos” gratuita, infundada, insultuosa, irresponsavel e criminosamente, de a nossa dolorosa luta por uma formacao academica e tecnico-profissional reconhecida em qualquer parte do mundo nao ter produzido mais do que “falsos diplomas”, “mestrados em imitacao”, “infiltracoes em reunioes de peritos”, etc., etc., etc.???


Enquanto que, em se tratando de um Europeu ou seu/sua descendente pertencente precisamente aquele grupo de ex-colonizadores que enriqueceram exclusivamente a custa da "arvore das patacas" de Angola e que por isso conseguiu abrir todas as portas do mundo empresarial (especialmente o bancario) e/ou academico, passa a ser considerado/a, por exemplo, especialista em "macroeconomia a prova de balas" (sem que quem o afirma/escreve, por evidentemente nao fazer a minima ideia do que fala, sequer se aperceba da contradicao em termos que isso significa... em particular quando nao se tem qualquer track record de alguma pratica profissional em gestao macroeconomica!), ainda que, e ate' por "defeito de formacao" como publicamente assumido/as "neoclassico/as ou neoliberais", nao possam reclamar qualquer especialismo nessa area, por muito que o tenham noutras areas da economia, nomeadamente a econometria e, possivelmente, a microeconomia...

NÓS LUTAMOS CONTRA A USURPAÇÃO

Os colonizadores usurparam as nossas terras, as nossas riquezas, as nossas lavras, as nossas irmãs e nós sobrevivemos. Os mulatos resultantes da usurpação das nossas irmãs lutaram connosco contra os colonizadores. A reforma agrária contra os latifúndios e monopólios brevemente será levado a cabo por uma Angola Soberana. Lutámos contra todo este sistema de usurpação, durante séculos.

- Sera’ mesmo? “Todos os mulatos” (ou, ja’ agora, “todos os negros”) lutaram contra os colonizadores (ou tera’ sido, mais politicamente-correcto falando, contra o colonialismo?)?

- Nao estarao algumas dessas “irmas usurpadas” por alguns deles sendo “vendidas” ao desbarato por alguns dos “seus irmaos” a alguns dos seus “idolatrados patroes ex-colonizadores” leviana, difamatoria e ultrajantemente como "baratas" e "insuportaveis damas de sapato vermelho”?

- Nao estao agora os “novos engenheiros constitucionalistas da Angola Soberana” defendendo e proclamando que “os unicos donos originarios da nossa terra sao os Khoisan”?

- Nao andam por ai muitos “ex-colonizadores” se dizendo a boca cheia “mais Angolanos que a Angolanidade”?


NÓS LUTAMOS CONTRA A ALIENAÇÃO CULTURAL

Foi uma luta titânica Impingiram-nos os heróis, os reis, as tradições, os nomes, a geografia, a historia dos colonizadores. Falar em língua indígena era indigno para um «assimilado». Os nossos heróis eram selvagens, inimigos de Angola. Os colonizadores não queriam os nossos nomes nos registos e eram motivo de achincalhamento. Mas nós lutámos contra todo este sistema de alienação. Basta ver que conseguimos ainda falar e escrever em línguas indígenas, falar Ngola Kiluanje, Jinga, Ndunduma e outros heróis da luta contra a ocupação colonial. Comemos funje sem vergonha e sem medo de não nos darem o bilhete de identidade. Ainda usamos panos à moda indígena. No interior do nosso país ainda sobrevive a cultura tradicional indígena.

- O que se passa agora com a polemica a volta da estatua da Rainha Nzinga Mbandi vs. a da Maria da Fonte no Kinaxixe?

- Que tratamento se reserva a alguns de nos que, tendo sido vitimas do sistema assimilacionista, contra ele nos rebelamos e tentamos, ainda que um tanto “tardiamente” aprender ou aperfeicoar o nosso conhecimento das linguas dos nossos ancestrais (os quais, alias, tambem ja' passaram a "pertencer de pleno direito" a algun(ma)s ex-colonizadores Europeus e seus descendentes!) e adoptar os seus nomes? A resposta e’: mais frequentemente do que nao, acusam-nos perversamente de “complexos de colonizado”! Ao passo que se se tratar de um Europeu ou seu/sua descendente - em particular se exerce(u) historicamente um papel activo como agente de implementacao daquela mesma politica cultural assimilacionista - passa, mesmo sem o ser, a categoria de “antropologo/a” ou “investigador/a cientifico/a” e, por acumulo de funcoes, "premio nacional de cultura", "coreografa-em-chefe", "mae da danca contemporaneoa em Africa", etc, etc, etc!...

- “Comemos 'todos' funje sem vergonha e sem medo de nao nos darem o bilhete de identidade”? Quando eu tenho sido fustigada sem fim por mencionar, inclusive em artigos academicos, algumas das “minhas funjadas” em Angola? E, de resto, como aparentemente a Africa “sempre importou tudo, incluindo todos os ingredientes da sua culinaria tradicional” e’ melhor mesmo comecarmos a comer funje clandestinamente, porque senao nao nos dao o novo BI (sem racas - o qual, alias, nao tarda muito passara' a ser apenas B porque entretanto a palavra Identidade passou a ser uma 'blasfemia'...) sob a acusacao de sermos "estrangeiros importados" e "nao merecermos ser angolanos"!...

- “Lutamos contra todo este sistema de alienacao”?
Quando hoje isso e’ taxado por certos “clarividentes novo-jornaleiros a quem o quarto p(h)oder subiu a cabeca” de “monstro racial e tara tribal”? Quando hoje “temos que nos deixar dos semba, kizomba e kuduro, pois so’ assim progrediremos”? A este proposito, devo dizer que, nao sendo aderente incondicional ou acritica dos novos estilos musicais angolanos, como o kuduro, mesmo porque ainda nao os conheco suficientemente (e, ja' agora, tambem nunca ainda os dancei), entendo e valorizo a forma como alguns dos novos artistas de que aos poucos vou tomando conhecimento, os teem usado como musica de intervencao, protesto e afirmacao cultural nacional.

NÓS LUTAMOS PARA CONSTRUIR ANGOLA

Para a construção do que Angola é hoje os indígenas deram muito do seu suor e muitos a pró-pria vida. Nós construímos as estradas (no tempo em que éramos rusgados e obrigados a levar as nossas próprias enxadas e a nossa comida ficando verbas do Estado nos bolsos dos chefes de posto colonizadores). Nós construímos os prédios, com salários de miséria. Nós fizemos as grandes plantações de café, palmar e sisal, que enriqueceram os colonizadores, sob desumanidades sem fim. Nós cultivamos o algodão coercivamente para enriquecer as grandes companhias, abandonando as nossas culturas e passamos fome. Nós trabalhamos nas minas, para enriquecer os imperialistas, sofrendo desumanidades e descriminações sem fim. Nós cuidamos dos «meninos», filhos dos colonizadores, acompanhamo-los à escola, enquanto nós éramos mantidos na ignorância. Para construir Angola muito sofremos, muitos morremos. Lutá-mos contra tudo: sevicias, fome, discriminações, doenças, etc.,

- Sera’ que “todos” ainda hoje nos reconhecem esses meritos e nos concedem esses creditos?

EM SUMA

Os partidecos que surgiram depois do 25 de Abril dizem representar a maioria silenciosa, aque-les que não lutaram, aqueles que construíram Angola. Já verificamos que a maioria da população angolana é indígena e esta nunca esteve silenciosa. Manifestou-se sempre contra todas formas de opressão colonial. Esta maioria oprimida lutou de armas na mão contra os colonizadores; intermitentemente, é certo, mas lutou. O remate dessa luta intermitente culminou nos 14 anos de luta contínua dos nossos Movimento de Libertação, Movimentos estes saídos desta Angolana. Esta maioria construiu Angola chicoteada nas costas nuas, passando fome, seviciada, para tornar ricos os colonizadores, que por sinal pontificam naqueles partidecos. (…) Para eles Angola não é uma colónia, é sim um «El Dourado», à «árvore das patacas». Mas agora acabou ou vai acabar brevemente.


- Havera' alguma semelhanca/diferenca entre os partidecos de 1974 e "os de hoje"?

- “«El Dourado», a «arvore das patacas». Mas agora acabou ou vai acabar brevemente.”?

Quao brevemente?


"A RAZAO DA NOSSA LUTA" 50 ANOS DEPOIS...

Este historico texto (historico, tanto no sentido temporal – porque escrito em 1974; como no sentido reflexivo – na medida em que nos permite uma avaliacao, nao so’ dos seus fundamentos argumentativos a altura em que foi escrito, como da sua validade e relevancia actual) de M.M. de Brito Junior, serve-me de mote para o segundo take desta serie sobre a comemoracao dos 50 Anos do “Ano de Africa”.

Para tanto, dele extraio algumas passagens que me parecem ser merecedoras de uma viagem no tempo desde 1974 ate’ 2010, para servirem de base a algumas interrogacoes sobre a Angola “que estamos com ela” hoje, ou seja, a uma especie de “Estado da Nacao” cerca de 5 decadas desde o inicio da luta armada contra o colonialismo e mais de 3 decadas desde a independencia do pais:

A LUTA DOS COLONIZADORES E DOS COLONIZADOS

Existiram sempre duas posições definidas na vida politica de Angola. Uma, a dos colonizadores, constituída pelos Europeus e seus descendentes. Outra, a dos colonizados constituída pelos an-golanos, tradicionalmente considerados africanos, indígenas, nativos, assimilados.

- Sera’ esta formulacao ainda valida, num contexto em que, especialmente a luz das novas formulacoes ideologico-culturais de uma dita "nacao crioula", falar-se em “Africanos vs. Europeus e seus descendentes”, ou de “indigenas” e “nativos” pode ser considerado “crime de lesa patria”, incluindo por alguns “(ex?) anti-colonialistas”?

NÓS LUTAMOS CONTRA A OCUPAÇÃO

A verdadeira Historia de Angola narra os altos feitos dos angolanos na luta armada contra a ocupação portuguesa nos Dembos, no Congo, no Libolo, no Huambo, no Amboim, no Cuamato, na Lunda, enfim, em toda Angola. As chamadas «guerras de pacificação», durante as quais foram dizimados dezenas de (?) de milhares de angolanos, mostram bem que os indígenas angolanos, os colonizados, sempre lutaram de armas na mão contra o colonialismo, contra os colonizadores.

- Havera' hoje um consenso sobre o que/qual e' a "verdadeira Historia de Angola"?

- Como se contextualiza historica e politicamente essa luta, numa era em que a “recolonizacao” cada vez mais esta’ na ordem do dia?

NÓS LUTAMOS CONTRA O ANALFABETISMO

Noventa por cento do povo angolano (colonizado) é analfabeto. Sistematicamente fomos postos à margem no campo da instrução. Os governos colonizadores só construíram escolas onde hou-vesse europeus que ocupassem, pelo menos, 2/3 da sala. Mesmo existindo sanzalas com mais de 500 crianças indígenas em idade escolar o Estado não abria ai escolas. Estes só eram instruídos onde houvesse escolas das Missões. Os indígenas que podiam estudar nas escolas do Estado só eram aqueles cujos pais possuís-sem «atestado de assimilação» e bilhete de identidade.

- Como esta’ o acesso ao ensino para a maioria da populacao de hoje?

NÓS LUTAMOS CONTRA O CONTRATO

Uma das mais vergonhosas leis da opressão colonialista é o chamado «contrato indígena». Rusgados como animais, os indígenas eram mandados para as plantações (dos colonos), para as pescarias (dos colonos), para as salinas (dos colonos), para as minas ( dos imperialistas), onde sofriam todas as desumanidades do trabalho forçado.

- Ja’ nao ha’ sistema de contrato (pelo menos formalmente), mas nao haverao actualmente outras formas de trabalho igualmente desumanas no pais?

NÓS LUTAMOS CONTRA A HUMILHAÇÃO

Se hoje o indígena é capaz de levantar a cabeça é porque muita luta travámos contra a humilhação. Os colonizadores tratavam- nos como cães, humilharam-nos de todas as maneiras e feitios. Mesmo esbofeteados tínhamos que mostra um sorriso, porque se não apanhávamos mais. Um gesto de revolta contra um atitude injusta era motivo para severos castigos corporais, culpados de insubordinação e falta de respeito. Conhecemos um velho (Apolinário) que foi deportado três vezes, por períodos superiores a 3 anos, só porque respondia ás agressões e insultos dos colonizadores. Estes não admitiam que um indígena lhes tocasse na cara, mesmo em resposta a um agressão. Cão, moleque, miúdo, rapaz, chico macaco, sempre nos chamaram, com o intuito de nos humilhar. (…) Hoje levantamos as cabeças, bem alto, olhamos para a frente, para o futuro, já não baixamos os olhos para o chão quando falamos com um colonizador. Foi uma luta ingente e vencemos.

- Continuamos ainda de “cabecas levantadas”? Confesso que ha’ individuos hoje em Angola que so’ me merecem mesmo que lhes chame "caes, moleques, miudos e rapazes (quando nao sub-rapazes ou rapazitos)" – mas apenas e tao so’ porque, justamente, nao so’ vivem de lamber as botas aos seus novos “capatazes”, como entendem que eu e “todo o mundo” tambem o deve fazer, sob pena de, "sabendo sempre o que nos espera", bem entendido, sermos por eles linchados e literalmente pulverizados (armados que estao agora da "titularidade" de alguns dos principais orgaos formais do dito "quarto poder"...), mesmo e sobretudo quando reagindo a insultos gratuitos, ofensas e agressoes morais e materiais gravissimas, incluindo ameacas de morte (!), que nos sao infligidos, a nos e aos nossos ancestrais e descendentes, por alegadas “insubordinacao e falta de respeito”, hoje mais frequentemente designadas de “atrevimento (de pobres e insignificantes criaturas)”!

NÓS LUTAMOS CONTRA A DISCRIMINAÇÃO

Em Angola existe discriminação racial, embora não oficial. No campo salarial um indígena ganhava, geralmente, um terço do que ganhava um colonizador. Isto em todas as actividades do sector privado. Quando reclamássemos ouvíamos do patrão: «queres ganhar como um branco?». Podíamos saber mais da profissão do que um colonizador mas este era sempre o chefe, o encarregado. (…) Hoje fazemos greves e exigimos salários iguais. Continuaremos a luta.


- “Hoje fazemos greves e exigimos salários iguais”? Ou, ja' agora, "patrocinios" iguais?

- “Continuamos a luta?” Ou, antes, somos acusados por alguns dos “nossos irmaos” gratuita, infundada, insultuosa, irresponsavel e criminosamente, de a nossa dolorosa luta por uma formacao academica e tecnico-profissional reconhecida em qualquer parte do mundo nao ter produzido mais do que “falsos diplomas”, “mestrados em imitacao”, “infiltracoes em reunioes de peritos”, etc., etc., etc.???


Enquanto que, em se tratando de um Europeu ou seu/sua descendente pertencente precisamente aquele grupo de ex-colonizadores que enriqueceram exclusivamente a custa da "arvore das patacas" de Angola e que por isso conseguiu abrir todas as portas do mundo empresarial (especialmente o bancario) e/ou academico, passa a ser considerado/a, por exemplo, especialista em "macroeconomia a prova de balas" (sem que quem o afirma/escreve, por evidentemente nao fazer a minima ideia do que fala, sequer se aperceba da contradicao em termos que isso significa... em particular quando nao se tem qualquer track record de alguma pratica profissional em gestao macroeconomica!), ainda que, e ate' por "defeito de formacao" como publicamente assumido/as "neoclassico/as ou neoliberais", nao possam reclamar qualquer especialismo nessa area, por muito que o tenham noutras areas da economia, nomeadamente a econometria e, possivelmente, a microeconomia...

NÓS LUTAMOS CONTRA A USURPAÇÃO

Os colonizadores usurparam as nossas terras, as nossas riquezas, as nossas lavras, as nossas irmãs e nós sobrevivemos. Os mulatos resultantes da usurpação das nossas irmãs lutaram connosco contra os colonizadores. A reforma agrária contra os latifúndios e monopólios brevemente será levado a cabo por uma Angola Soberana. Lutámos contra todo este sistema de usurpação, durante séculos.

- Sera’ mesmo? “Todos os mulatos” (ou, ja’ agora, “todos os negros”) lutaram contra os colonizadores (ou tera’ sido, mais politicamente-correcto falando, contra o colonialismo?)?

- Nao estarao algumas dessas “irmas usurpadas” por alguns deles sendo “vendidas” ao desbarato por alguns dos “seus irmaos” a alguns dos seus “idolatrados patroes ex-colonizadores” leviana, difamatoria e ultrajantemente como "baratas" e "insuportaveis damas de sapato vermelho”?

- Nao estao agora os “novos engenheiros constitucionalistas da Angola Soberana” defendendo e proclamando que “os unicos donos originarios da nossa terra sao os Khoisan”?

- Nao andam por ai muitos “ex-colonizadores” se dizendo a boca cheia “mais Angolanos que a Angolanidade”?


NÓS LUTAMOS CONTRA A ALIENAÇÃO CULTURAL

Foi uma luta titânica Impingiram-nos os heróis, os reis, as tradições, os nomes, a geografia, a historia dos colonizadores. Falar em língua indígena era indigno para um «assimilado». Os nossos heróis eram selvagens, inimigos de Angola. Os colonizadores não queriam os nossos nomes nos registos e eram motivo de achincalhamento. Mas nós lutámos contra todo este sistema de alienação. Basta ver que conseguimos ainda falar e escrever em línguas indígenas, falar Ngola Kiluanje, Jinga, Ndunduma e outros heróis da luta contra a ocupação colonial. Comemos funje sem vergonha e sem medo de não nos darem o bilhete de identidade. Ainda usamos panos à moda indígena. No interior do nosso país ainda sobrevive a cultura tradicional indígena.

- O que se passa agora com a polemica a volta da estatua da Rainha Nzinga Mbandi vs. a da Maria da Fonte no Kinaxixe?

- Que tratamento se reserva a alguns de nos que, tendo sido vitimas do sistema assimilacionista, contra ele nos rebelamos e tentamos, ainda que um tanto “tardiamente” aprender ou aperfeicoar o nosso conhecimento das linguas dos nossos ancestrais (os quais, alias, tambem ja' passaram a "pertencer de pleno direito" a algun(ma)s ex-colonizadores Europeus e seus descendentes!) e adoptar os seus nomes? A resposta e’: mais frequentemente do que nao, acusam-nos perversamente de “complexos de colonizado”! Ao passo que se se tratar de um Europeu ou seu/sua descendente - em particular se exerce(u) historicamente um papel activo como agente de implementacao daquela mesma politica cultural assimilacionista - passa, mesmo sem o ser, a categoria de “antropologo/a” ou “investigador/a cientifico/a” e, por acumulo de funcoes, "premio nacional de cultura", "coreografa-em-chefe", "mae da danca contemporaneoa em Africa", etc, etc, etc!...

- “Comemos 'todos' funje sem vergonha e sem medo de nao nos darem o bilhete de identidade”? Quando eu tenho sido fustigada sem fim por mencionar, inclusive em artigos academicos, algumas das “minhas funjadas” em Angola? E, de resto, como aparentemente a Africa “sempre importou tudo, incluindo todos os ingredientes da sua culinaria tradicional” e’ melhor mesmo comecarmos a comer funje clandestinamente, porque senao nao nos dao o novo BI (sem racas - o qual, alias, nao tarda muito passara' a ser apenas B porque entretanto a palavra Identidade passou a ser uma 'blasfemia'...) sob a acusacao de sermos "estrangeiros importados" e "nao merecermos ser angolanos"!...

- “Lutamos contra todo este sistema de alienacao”?
Quando hoje isso e’ taxado por certos “clarividentes novo-jornaleiros a quem o quarto p(h)oder subiu a cabeca” de “monstro racial e tara tribal”? Quando hoje “temos que nos deixar dos semba, kizomba e kuduro, pois so’ assim progrediremos”? A este proposito, devo dizer que, nao sendo aderente incondicional ou acritica dos novos estilos musicais angolanos, como o kuduro, mesmo porque ainda nao os conheco suficientemente (e, ja' agora, tambem nunca ainda os dancei), entendo e valorizo a forma como alguns dos novos artistas de que aos poucos vou tomando conhecimento, os teem usado como musica de intervencao, protesto e afirmacao cultural nacional.

NÓS LUTAMOS PARA CONSTRUIR ANGOLA

Para a construção do que Angola é hoje os indígenas deram muito do seu suor e muitos a pró-pria vida. Nós construímos as estradas (no tempo em que éramos rusgados e obrigados a levar as nossas próprias enxadas e a nossa comida ficando verbas do Estado nos bolsos dos chefes de posto colonizadores). Nós construímos os prédios, com salários de miséria. Nós fizemos as grandes plantações de café, palmar e sisal, que enriqueceram os colonizadores, sob desumanidades sem fim. Nós cultivamos o algodão coercivamente para enriquecer as grandes companhias, abandonando as nossas culturas e passamos fome. Nós trabalhamos nas minas, para enriquecer os imperialistas, sofrendo desumanidades e descriminações sem fim. Nós cuidamos dos «meninos», filhos dos colonizadores, acompanhamo-los à escola, enquanto nós éramos mantidos na ignorância. Para construir Angola muito sofremos, muitos morremos. Lutá-mos contra tudo: sevicias, fome, discriminações, doenças, etc.,

- Sera’ que “todos” ainda hoje nos reconhecem esses meritos e nos concedem esses creditos?

EM SUMA

Os partidecos que surgiram depois do 25 de Abril dizem representar a maioria silenciosa, aque-les que não lutaram, aqueles que construíram Angola. Já verificamos que a maioria da população angolana é indígena e esta nunca esteve silenciosa. Manifestou-se sempre contra todas formas de opressão colonial. Esta maioria oprimida lutou de armas na mão contra os colonizadores; intermitentemente, é certo, mas lutou. O remate dessa luta intermitente culminou nos 14 anos de luta contínua dos nossos Movimento de Libertação, Movimentos estes saídos desta Angolana. Esta maioria construiu Angola chicoteada nas costas nuas, passando fome, seviciada, para tornar ricos os colonizadores, que por sinal pontificam naqueles partidecos. (…) Para eles Angola não é uma colónia, é sim um «El Dourado», à «árvore das patacas». Mas agora acabou ou vai acabar brevemente.


- Havera' alguma semelhanca/diferenca entre os partidecos de 1974 e "os de hoje"?

- “«El Dourado», a «arvore das patacas». Mas agora acabou ou vai acabar brevemente.”?

Quao brevemente?


A Tarefa de Substituir JES (II)



Dizia aqui no outro dia que "substituir JES nao e’ tarefa facil"… "Desde logo porque o corrente embroglio politico-constitucional (aparentemente de sua inteira criacao) a torna mais complexa do que ja’ o seria por natureza."

Pois bem, o dito embroglio entretanto foi resolvido como e’ do conhecimento geral (dizem algumas mas linguas que em perfeito "timming" - como alguns fazem muita questao de escrever -, enquanto o povo era entretido com "bailes de mascaras", "can-cans" e "fogos de artificio" - mas ja' diziam outras mas linguas que "o futebol e' o opio do povo", nao e'?...), num desfecho (que tambem poderia ser lido como os "dois passos a retaguarda" a que aqui me referia) que vem provocando as mais diversas reaccoes – desde acusacoes de “golpe de estado constitucional” ou “palaciano” a apelos ao sempre prestavel "patriotismo" dos cidadaos para que o aceitem incondicionalmente.

A tal desfecho seguiram-se uma serie de decisoes em catadupa, das quais se destacam a nomeacao de um novo governo, de um Vice-Presidente (tomado ‘putativamente’ como substituto de JES) e do anuncio de eleicoes gerais para 2012.

Pois… olhem, se por aqui ainda estiver nessa altura, talvez volte a esta serie que aqui dou por suspensa e adiada sine die. Por enquanto, ainda estou naquela do “nao, ou a va gloria de (nao) mandar”

[Para outros olhares sobre esta questao, ver aqui]


Dizia aqui no outro dia que "substituir JES nao e’ tarefa facil"… "Desde logo porque o corrente embroglio politico-constitucional (aparentemente de sua inteira criacao) a torna mais complexa do que ja’ o seria por natureza."

Pois bem, o dito embroglio entretanto foi resolvido como e’ do conhecimento geral (dizem algumas mas linguas que em perfeito "timming" - como alguns fazem muita questao de escrever -, enquanto o povo era entretido com "bailes de mascaras", "can-cans" e "fogos de artificio" - mas ja' diziam outras mas linguas que "o futebol e' o opio do povo", nao e'?...), num desfecho (que tambem poderia ser lido como os "dois passos a retaguarda" a que aqui me referia) que vem provocando as mais diversas reaccoes – desde acusacoes de “golpe de estado constitucional” ou “palaciano” a apelos ao sempre prestavel "patriotismo" dos cidadaos para que o aceitem incondicionalmente.

A tal desfecho seguiram-se uma serie de decisoes em catadupa, das quais se destacam a nomeacao de um novo governo, de um Vice-Presidente (tomado ‘putativamente’ como substituto de JES) e do anuncio de eleicoes gerais para 2012.

Pois… olhem, se por aqui ainda estiver nessa altura, talvez volte a esta serie que aqui dou por suspensa e adiada sine die. Por enquanto, ainda estou naquela do “nao, ou a va gloria de (nao) mandar”

[Para outros olhares sobre esta questao, ver aqui]

Saturday 6 February 2010

La Sape, Les Sapeurs et La Sapologie

@ Kongo Blues

Just Poetry (XI)



Castelo de Areia

[desculpa amigo
é que eu gosto sempre
de voltar,
não precisaria sequer
de gostar,
acabo sempre por voltar]

vamos ser amigos?
brincar fazendo um castelo
de areia e
sem dar conta
nele acabar por viver

desencantar o cimento
e a pedra
a acabar dentro de uma casa
de verdade
vamos ser amigos?

talvez daqui
a mais uns anos,
talvez agora não seja oportuno
a amizade, como construir?

[não faz mal
vamos acabar fazendo essa casa
com amizade
vamos ser amigos.]


A.S. in S.O.S.





Castelo de Areia

Atestar de palavras
o muro de silencio.

Breyten Breytenbach

Friday 5 February 2010

Theft By False Accounting

(It's not 'exclusive to Africa'...)



Three Labour MPs and a Tory Peer face charges of false accounting and dishonesty under the Theft Act, in the fallout from the expenses scandal.
Director of public prosecutions Keir Starmer announced prosecutions were being brought against former Environment and Fisheries minister Elliot Morley, David Chaytor, Jim Devine and Lord Hanningfield.
The charges follow the damning report on MPs' expenses by Commons auditor Sir Thomas Legg, who condemned the system of support for MPs requiring a second home in London which he protested was flawed by lack of audit, self certification by "sovereign" MPs and Commons Fees Office officials who frequently felt it was their job to help MPs rather than police the system.
Files on the six were passed first to the police and then to the Crown Prosecution Service and were excluded from the scope of Legg's enquiries.
He revealed the defendants' lawyers had raised issues of parliamentary privilege which he said should be determined by the courts.
All three MPs are barred by Labour for standing for re-election representing the party.
Tory leader David Cameron has ordered the suspension of Hanningfield from his party in the Lords, where he has resigned as Opposition business spokesman.
The peer said he was "extremely disappointed" to have been charged and claimed he had acted in good faith.
A statement issued by the three MPs said they "totally refute" the charges.

[More here]

(... What seems to be exclusive to Africa, though, is the widespread lack of accountability and corresponding punishment - what some call "zero tolerance" - both at party and government levels, for all sorts of thieves of public funds!)

(It's not 'exclusive to Africa'...)



Three Labour MPs and a Tory Peer face charges of false accounting and dishonesty under the Theft Act, in the fallout from the expenses scandal.
Director of public prosecutions Keir Starmer announced prosecutions were being brought against former Environment and Fisheries minister Elliot Morley, David Chaytor, Jim Devine and Lord Hanningfield.
The charges follow the damning report on MPs' expenses by Commons auditor Sir Thomas Legg, who condemned the system of support for MPs requiring a second home in London which he protested was flawed by lack of audit, self certification by "sovereign" MPs and Commons Fees Office officials who frequently felt it was their job to help MPs rather than police the system.
Files on the six were passed first to the police and then to the Crown Prosecution Service and were excluded from the scope of Legg's enquiries.
He revealed the defendants' lawyers had raised issues of parliamentary privilege which he said should be determined by the courts.
All three MPs are barred by Labour for standing for re-election representing the party.
Tory leader David Cameron has ordered the suspension of Hanningfield from his party in the Lords, where he has resigned as Opposition business spokesman.
The peer said he was "extremely disappointed" to have been charged and claimed he had acted in good faith.
A statement issued by the three MPs said they "totally refute" the charges.

[More here]

(... What seems to be exclusive to Africa, though, is the widespread lack of accountability and corresponding punishment - what some call "zero tolerance" - both at party and government levels, for all sorts of thieves of public funds!)

INTONATIONS: A NEW PUBLICATION ON ANGOLAN SOCIAL HISTORY THROUGH MUSIC (R)*

From the presentation:

Intonations tells the story of how Angola's urban residents in the late colonial period (roughly 1945-74) used music to talk back to their colonial oppressors and, more importantly, to define what it meant to be Angolan and what they hoped to gain from independence. Author Marissa J. Moorman presents a social and cultural history of the relationship between Angolan culture and politics. She argues that it was in and through popular urban music, produced mainly in the capital city of Luanda's musseques (urban shantytowns), that Angolans forged the nation and developed expectations about nationalism. Through careful archival work and extensive interviews with musicians and those who attend performances in bars, community centers, and cinemas, Moorman explores the ways in which the urban poor imagined the nation. The spread of radio technology and the establishment of a recording industry in the early 1970s reterritorialized an urban-produced sound and cultural ethos by transporting music throughout the country. When the formerly exiled independent movements returned to Angola in 1975, they found a population receptive to their nationalist message but with different expectations about the promises of independence. In producing and consuming music, Angolans formed a new image of independence and nationalist politics. A compilation of Angolan music is included in CD format.

[More details here]


* First published on 26/11/08. Republished today to note a review of this book by Angolan Antonio Tomas, based at Columbia University. You can read it here.
From the presentation:

Intonations tells the story of how Angola's urban residents in the late colonial period (roughly 1945-74) used music to talk back to their colonial oppressors and, more importantly, to define what it meant to be Angolan and what they hoped to gain from independence. Author Marissa J. Moorman presents a social and cultural history of the relationship between Angolan culture and politics. She argues that it was in and through popular urban music, produced mainly in the capital city of Luanda's musseques (urban shantytowns), that Angolans forged the nation and developed expectations about nationalism. Through careful archival work and extensive interviews with musicians and those who attend performances in bars, community centers, and cinemas, Moorman explores the ways in which the urban poor imagined the nation. The spread of radio technology and the establishment of a recording industry in the early 1970s reterritorialized an urban-produced sound and cultural ethos by transporting music throughout the country. When the formerly exiled independent movements returned to Angola in 1975, they found a population receptive to their nationalist message but with different expectations about the promises of independence. In producing and consuming music, Angolans formed a new image of independence and nationalist politics. A compilation of Angolan music is included in CD format.

[More details here]


* First published on 26/11/08. Republished today to note a review of this book by Angolan Antonio Tomas, based at Columbia University. You can read it here.

Thursday 4 February 2010

Sobre o 4 de Fevereiro



[Aqui]

A Tarefa de Emagrecer o Governo (2)

Apenas algumas breves notas resultantes de uma comparacao preliminar entre a composicao do anterior elenco governativo e a do que acaba de ser anunciado:

1. Regista-se um ligeiro “emagrecimento” do executivo em termos do numero de Ministerios: 27 no actual (excluindo os novos cargos de Ministros de Estado – supondo-se que estes, bem como os respectivos Secretarios de Estado, exercerao apenas um papel de “coordenacao e supervisao” e, neste particular, sendo de notar a potencial eliminacao de sobreposicao de funcoes entre o anterior Ministerio da Economia e os das Financas e do Planeamento, com a criacao do Ministerio de Estado da Coordenacao Economica) contra 33 no anterior.
No entanto, em termos gerais, incluindo os Vice-Ministros e Secretarios de Estado ora nomeados, tal “emagrecimento” nao parece suficientemente substantivo para os efeitos da pretendida reducao da macrocefalia do governo e dos respectivos encargos financeiros.

2. Parece haver, no entanto, uma melhor articulacao entre as valencias dos Ministerios e respectivas Secretarias de Estado.
Mantenho, porem, as minhas reticencias quanto a separacao do Ensino Superior do Ministerio da Educacao. Isto por me parecer que, no actual estagio de desenvolvimento do pais, a necessidade de criacao e fomento de sinergias entre o Ensino Superior e os outros niveis de ensino se apresenta mais premente do que entre aquele e a Ciencia e a Tecnologia, as quais e’ vinculado separadamente na estrutura governativa.
Por outro lado, sendo a Ciencia e a Tecnologia, em particular nos paises mais desenvolvidos (onde, by and large, do que se trata ao nivel do Ensino Superior e’ de “alta” e “altissima” Ciencia e Tecnologia), tidas como naturalmente vinculadas ao Ensino Superior, ja’ em termos de desenvolvimento economico endogeno e sustentavel cada vez mais se advoga a sua articulacao aos niveis intermedios de ensino.
Assim, parecer-me-ia mais adequado ao actual estagio de desenvolvimento do pais um Ministerio da Educacao que integrasse, ao nivel de Secretarias de Estado, o Ensino Superior e a Ciencia e Tecnologia.

3. Finalmente, duas notas de particular realce: i) a criacao de uma Secretaria de Estado para os Direitos Humanos (embora nao resulte muito transparente o perfil politico do seu titular em justaposicao a actual crise no dominio dos direitos humanos em Cabinda); ii) um notavel aumento relativo do numero de mulheres em cargos ao nivel de Ministro e Vice-Ministro (sendo, no entanto, tambem de notar a “descontinuacao” do titulo de “Ministro Sem Pasta” para a Governadora de Luanda, embora talvez nao seja de se lhe atribuir qualquer significado politico de maior relevancia).

Apenas algumas breves notas resultantes de uma comparacao preliminar entre a composicao do anterior elenco governativo e a do que acaba de ser anunciado:

1. Regista-se um ligeiro “emagrecimento” do executivo em termos do numero de Ministerios: 27 no
actual (excluindo os novos cargos de Ministros de Estado – supondo-se que estes, bem como os respectivos Secretarios de Estado, exercerao apenas um papel de “coordenacao e supervisao” e, neste particular, sendo de notar a potencial eliminacao de sobreposicao de funcoes entre o anterior Ministerio da Economia e os das Financas e do Planeamento, com a criacao do Ministerio de Estado da Coordenacao Economica) contra 33 no anterior.
No entanto, em termos gerais, incluindo os Vice-Ministros e Secretarios de Estado ora nomeados, tal “emagrecimento” nao parece suficientemente substantivo para os efeitos da pretendida reducao da macrocefalia do governo e dos respectivos encargos financeiros.

2. Parece haver, no entanto, uma melhor articulacao entre as valencias dos Ministerios e respectivas Secretarias de Estado.
Mantenho, porem, as minhas reticencias quanto a separacao do Ensino Superior do Ministerio da Educacao. Isto por me parecer que, no actual estagio de desenvolvimento do pais, a necessidade de criacao e fomento de sinergias entre o Ensino Superior e os outros niveis de ensino se apresenta mais premente do que entre aquele e a Ciencia e a Tecnologia, as quais e’ vinculado separadamente na estrutura governativa.
Por outro lado, sendo a Ciencia e a Tecnologia, em particular nos paises mais desenvolvidos (onde, by and large, do que se trata ao nivel do Ensino Superior e’ de “alta” e “altissima” Ciencia e Tecnologia), tidas como naturalmente vinculadas ao Ensino Superior, ja’ em termos de desenvolvimento economico endogeno e sustentavel cada vez mais se advoga a sua articulacao aos niveis intermedios de ensino.
Assim, parecer-me-ia mais adequado ao actual estagio de desenvolvimento do pais um Ministerio da Educacao que integrasse, ao nivel de Secretarias de Estado, o Ensino Superior e a Ciencia e Tecnologia.

3. Finalmente, duas notas de particular realce: i) a criacao de uma Secretaria de Estado para os Direitos Humanos (embora nao resulte muito transparente o perfil politico do seu titular em justaposicao a actual crise no dominio dos direitos humanos em Cabinda); ii) um notavel aumento relativo do numero de mulheres em cargos ao nivel de Ministro e Vice-Ministro (sendo, no entanto, tambem de notar a “descontinuacao” do titulo de “Ministro Sem Pasta” para a Governadora de Luanda, embora talvez nao seja de se lhe atribuir qualquer significado politico de maior relevancia).

Wednesday 3 February 2010

OLHARES DIVERSOS (XIX)

IMACULADA MELO E O "NÃO"
OU
"A VÃ GLÓRIA DE (NÃO) MANDAR"

A Juíza Conselheira do Tribunal Constitucional, Dra. Imaculada Melo, votou contra o Acórdão do Tribunal Constitucional adoptado por maioria na sequência da avaliação (fiscalização preventiva) feita por esta instância ao texto da nova Constituição aprovado no passado dia 21 de Janeiro pela Assembleia Constituinte. Este voto deu-lhe direito de elaborar e divulgar uma declaração com as motivações da sua recusa. Aqui ficam elas:

"Votei vencida porque entendo que a nova Constituição não respeita inteiramente os limites materiais do artigo 159º, em outros casos, contrariamente ao que dispõe o Acórdão.

São os seguintes, em síntese, os fundamentos da posição:

1- Os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos alínea b) do art.º 159º da Lei Constitucional.

Estou de acordo que a nova Constituição apresenta, efectivamente, um avanço na medida em que para além do aumento do leque dos direitos assegura-se a garantia e protecção dos mesmos pelo Estado. No entanto, considero que foi violado este limite na nova Constituição quando se restringe a possibilidade de candidatos independentes à Presidência da República de poder fazê-lo dessa forma, uma vez que apenas se podem candidatar se enquadrados num partido político ou integrados na lista de uma coligação de partidos políticos (artigo 111º, n.º2).

Considero por isso que há uma diminuição das garantias constitucionais e, consequentemente, há a violação dos princípios de igualdade, da proporcionalidade e da segurança jurídica e da protecção da confiança, todos subsumíveis no princípio do estado de direito que “desenvolve toda uma dimensão garantística que para além de protecção da liberdade individual, projecta exigências diferenciadas sobre a actuação do poder que, de alguma forma, possa afectar os particulares”. Nestes termos considero que a nova Constituição viola a alínea b) e c) do artigo 159º.

1.1-Para além disso, considero que as disposições finais e transitórias dão ao actual Presidente da República competência para que assuma a plena titularidade do poder executivo na Constituição aprovada até à realização de novas eleições.
É verdade que com esta norma resolvem-se, desde logo, duas questões constitucionais que são fundamentais, como sejam, a de assegurar a legitimidade constitucional do Presidente da República em funções e a de evitar que exista um vazio de poder.

Ora, do ponto de vista jurídico é questionável a atribuição deste poder ao Presidente da República uma vez que o actual Chefe de Estado está a exercer as suas funções num quadro de anormalidade constitucional surgida da guerra civil de 1992.
A normalização constitucional do país passa necessariamente pelo desempenho das funções dos órgãos de soberania de acordo com o estipulado na lei fundamental em vigor.

Este processo foi efectivado com a eleição da Assembleia Nacional, em Setembro de 2008 e deveria, igualmente, passar pela eleição do Presidente da República, o que estava previsto para 2009. Assim sendo, temos que a não realização da eleição presidencial na data acordada pelos Partidos Políticos, Governo e Presidente da República e a alteração da forma de eleição do Presidente da República na nova Constituição levanta, de imediato, um problema sério de legitimidade constitucional.

Por isso, entendo que o artigo 241º da nova Constituição está eivado de inconstitucionalidade uma vez que põe em causa o princípio democrático do Estado de direito que dispõe que o poder apenas pode ser exercido em conformidade com o princípio da legitimação popular do poder pela via do sufrágio universal, secreto e directo (Violação da alínea c) do artigo 159º). (cont)

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IMACULADA MELO E O "NÃO"
OU
"A VÃ GLÓRIA DE (NÃO) MANDAR"

A Juíza Conselheira do Tribunal Constitucional, Dra. Imaculada Melo, votou contra o Acórdão do Tribunal Constitucional adoptado por maioria na sequência da avaliação (fiscalização preventiva) feita por esta instância ao texto da nova Constituição aprovado no passado dia 21 de Janeiro pela Assembleia Constituinte. Este voto deu-lhe direito de elaborar e divulgar uma declaração com as motivações da sua recusa. Aqui ficam elas:

"Votei vencida porque entendo que a nova Constituição não respeita inteiramente os limites materiais do artigo 159º, em outros casos, contrariamente ao que dispõe o Acórdão.

São os seguintes, em síntese, os fundamentos da posição:

1- Os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos alínea b) do art.º 159º da Lei Constitucional.

Estou de acordo que a nova Constituição apresenta, efectivamente, um avanço na medida em que para além do aumento do leque dos direitos assegura-se a garantia e protecção dos mesmos pelo Estado. No entanto, considero que foi violado este limite na nova Constituição quando se restringe a possibilidade de candidatos independentes à Presidência da República de poder fazê-lo dessa forma, uma vez que apenas se podem candidatar se enquadrados num partido político ou integrados na lista de uma coligação de partidos políticos (artigo 111º, n.º2).

Considero por isso que há uma diminuição das garantias constitucionais e, consequentemente, há a violação dos princípios de igualdade, da proporcionalidade e da segurança jurídica e da protecção da confiança, todos subsumíveis no princípio do estado de direito que “desenvolve toda uma dimensão garantística que para além de protecção da liberdade individual, projecta exigências diferenciadas sobre a actuação do poder que, de alguma forma, possa afectar os particulares”. Nestes termos considero que a nova Constituição viola a alínea b) e c) do artigo 159º.

1.1-Para além disso, considero que as disposições finais e transitórias dão ao actual Presidente da República competência para que assuma a plena titularidade do poder executivo na Constituição aprovada até à realização de novas eleições.
É verdade que com esta norma resolvem-se, desde logo, duas questões constitucionais que são fundamentais, como sejam, a de assegurar a legitimidade constitucional do Presidente da República em funções e a de evitar que exista um vazio de poder.

Ora, do ponto de vista jurídico é questionável a atribuição deste poder ao Presidente da República uma vez que o actual Chefe de Estado está a exercer as suas funções num quadro de anormalidade constitucional surgida da guerra civil de 1992.
A normalização constitucional do país passa necessariamente pelo desempenho das funções dos órgãos de soberania de acordo com o estipulado na lei fundamental em vigor.

Este processo foi efectivado com a eleição da Assembleia Nacional, em Setembro de 2008 e deveria, igualmente, passar pela eleição do Presidente da República, o que estava previsto para 2009. Assim sendo, temos que a não realização da eleição presidencial na data acordada pelos Partidos Políticos, Governo e Presidente da República e a alteração da forma de eleição do Presidente da República na nova Constituição levanta, de imediato, um problema sério de legitimidade constitucional.

Por isso, entendo que o artigo 241º da nova Constituição está eivado de inconstitucionalidade uma vez que põe em causa o princípio democrático do Estado de direito que dispõe que o poder apenas pode ser exercido em conformidade com o princípio da legitimação popular do poder pela via do sufrágio universal, secreto e directo (Violação da alínea c) do artigo 159º). (cont)

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Tuesday 2 February 2010

Kundera's "Ignorance" [R]*

IGNORÂNCIA, OU A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO REGRESSO



- O que é que ainda estás aqui a fazer? Perguntou S. indignada.
- Mas tu não vês que eu tenho aqui o meu trabalho, o meu apartamento, a minha vida?, I. retorquiu.
- Meu Deus, I.! O que se está a passar no teu país é tão fascinante! Numa situação como aquela tudo se pode resolver!
- Mas S., não são só as questões práticas, o trabalho, o apartamento. Eu tenho estado aqui a viver há 20 anos. A minha vida está aqui!
- Será o teu grande regresso, respondeu S. depois de um longo silêncio.

Repetidas, as palavras adquiriram um tal poder que, no fundo de si, I. via-as escritas em letras capitais: GRANDE REGRESSO. Abandonou a sua resistência e deixou-se captivar por imagens súbitamente emergindo de livros lidos há muito tempo, de filmes, da sua própria memória e talvez da sua memória ancestral: o lar que todos carregamos dentro de nós; Odysseus vislumbrando a sua ilha depois de anos de vagueação; o regresso, o regresso, a grande magia do regresso.

A palavra grega para regresso é nostos. Algos significa sofrimento. Portanto, nostalgia é o sofrimento causado por um insaciado desejo de regressar. Para expressar essa noção fundamental, a maior parte dos europeus utiliza a palavra derivada do grego (nostalgia) assim como outras palavras com raízes nos seus idiomas nacionais: anoranza, dizem os espanhóis; saudade, dizem os portugueses. Em cada língua estas palavras têm uma diferente nuance semântica. Frequentemente elas significam apenas a tristeza causada pela impossibilidade de regressar ao país a que se pertence: o anseio pela terra, pelo lar. O que em Inglês se chama homesickness. Em espanhol anoranza vem do verbo anorar (sentir nostalgia), que vem do catalão enyorar, por sua vez derivado da palavra latina ignorare. Sob essa luz etimológica, nostalgia parece algo assim como a dor da ignorância, do não saber. Tu estás longe e eu não sei o que é feito de ti. O meu país está longe e eu não sei o que por lá se passa.

(…)

A alvorada da antiga cultura grega trouxe consigo o nascimento da Odisseia, o épico fundador da nostalgia. Enfatizemos: Odysseus, o maior aventureiro de todos os tempos, é também o maior nostálgico. Ele partira (não muito contente) para a guerra de Tróia e por lá ficara durante 10 anos. Depois tentou regressar à sua Ithaca nativa, mas as intrigas dos deuses prolongaram-lhe a viagem, primeiro durante 3 anos encalacrado no meio dos mais inusitados acontecimentos, depois por mais 7 anos que passou como refém e amante de Calypso, que na sua paixão não o deixava sair da ilha. Muito diferente da vida de pobre emigrada que I. tem levado por já bastante tempo. Odysseus viveu a verdadeira dolce vita lá na terra de Calypso, uma vida fácil, uma vida de delícias. No entanto, entre a dolce vita num lugar estrangeiro e o arriscado regresso a casa, ele escolheu o regresso.

Desde as primeiras semanas depois de ter emigrado, I. começou a ter estranhos sonhos: ela está num avião que muda de direcção e aterra num aeroporto desconhecido; homens armados e de uniforme esperam-na; num suor frio, ela reconhece a polícia. Noutra ocasião, ela está a caminhar numa pequena cidade quando vê um estranho grupo de mulheres, cada uma com uma caneca de cerveja, correndo em direcção a ela, chamando-a na sua língua com uma falsa cordialidade e, aterrorizada, I. realiza que está na sua terra. Ela grita e acorda.

Depois, durante uma conversa com um compatriota também emigrado, I. dá-se conta de que todos os emigrados tinham esses sonhos, todos, sem excepção; primeiro ela ficou comovida pela fraternidade nocturna de pessoas desconhecidas umas das outras, mas depois ficou um tanto irritada: como é possível que uma experiência tão privada como um sonho seja um acontecimento colectivo? O que é que, então, é unico à nossa alma?

Mas chega de perguntas que não têm resposta! Uma coisa era certa: em qualquer noite, milhares de emigrados sonhavam o mesmo sonho num sem número de variantes. O sonho-emigração: um dos fenómenos mais estranhos da segunda metade do século vinte. Esses sonhos-pesadelos pareciam-lhe tanto mais estranhos quanto o facto de que ela era assaltada simultâneamente por uma incontrolável nostalgia e outra experiência completamente oposta: paisagens da sua terra não paravam de passar pela sua mente durante o dia. Durante todo o dia essas fugidias imagens visitavam-na para atenuar o anseio pela sua terra perdida. O dia era iluminado pela beleza da terra abandonada, a noite pelo horror de a ela regressar. O dia mostrava-lhe o paraíso que perdera; a noite, o inferno de que fugira.

Leais à tradição da revolução francesa, os países comunistas excomungavam a emigração, considerada a mais odiosa traição. Todos os que permanecessem no exterior eram condenados in absencia no seu país de origem e os seus compatriotas não se atreviam a ter qualquer contacto com eles. J. relembrou-se de uma antiga idéia sua, que na altura ele próprio considerara blasfema: a aderência ao comunismo não tinha nada a ver com Marx e as suas teorias, mas simplesmente com o facto de que proporcionava às pessoas uma forma de satisfazerem as suas mais diversas necessidades psicológicas: a necessidade de parecer não-conformista, ou de obedecer, ou de punir os maus, ou de ser útil, ou de ter uma grande família à volta.

A razão pela qual as pessoas estão agora a abandonar o comunismo não se deve às suas idéias terem mudado ou a terem sofrido um choque, mas ao facto de o credo comunista já não responder a nenhuma necessidade. Tornou-se tão inútil, que toda a gente o deixa fácilmente cair, sem sequer se dar conta.

(…)

J. pergunta: se um país não é independente e nem sequer o quer ser, quererá alguém ainda morrer por ele?
– Querer morrer não é bem o que eu desejo para os meus filhos, N. retorquiu.
– Ponho a pergunta de outro modo, voltou J.: haverá alguém que ainda ame esse país?
- Como é que foste capaz de emigrar J.?! Tu és um patriota! Morrer pelo país – isso já acabou! Talvez para ti o tempo tenha parado durante a tua emigração. Mas eles, eles ja não pensam como tu, eles estão noutra!, exclamou N.

(...)

I. lamenta que os seus compatriotas pensem que todos os emigrados saem em busca de uma vida fácil: não sabem como é duro lutar por um lugar ao sol num país estrangeiro; deixar o país com crianças; perder o marido; criar as crianças sem dinheiro... Mas M. adverte-a: não vale a pena dizer-lhes isso. Até há pouco tempo toda a gente discutia sobre quem tinha passado pior sob o antigo regime. Todos queriam ser reconhecidos como vítimas. Mas esses concursos de sofrimento já passaram de moda. Agora as pessoas gabam-se do seu sucesso, não do seu sofrimento. Portanto, se eles decidirem conceder-te algum respeito, não será pela vida dura que tiveste, mas porque terás arranjado um homem rico!

(…)

I. sempre tomara como um dado que emigrar era uma desgraça. Mas agora ela interroga-se se isso não seria uma ilusão sugestionada pela forma como as pessoas avaliam um emigrado. Não estaria ela a interpretar a sua própria vida de acordo com as instruções operativas de outros? Ocorre-lhe que, embora lhe tenha sido imposta de fora e contra a sua vontade, a sua emigração era talvez, sem ela se ter apercebido, a melhor coisa que lhe tinha acontecido na vida. As implacáveis forças da história que tinham atacado a sua liberdade tinham-na, de facto, libertado.

(...)

Durante os 20 anos da ausência de Odysseus, o povo de Ithaca retivera muitas recordações dele, mas nunca sentira nostalgia por ele. Por seu lado, Odysseus sofria de nostalgia mas não se lembrava de quase nada. Podemos compreender esta curiosa contradição se realizarmos que para que a memória funcione bem precisa de constante prática: se as recordações não são evocadas repetidamente, em conversas com amigos, desaparecem. Quanto maior a nostalgia, mais vazia de recordações ela se torna. Durante 20 anos, Odysseus não pensara em mais nada senão no seu regresso. Mas uma vez regressado, espantou-se com a realização de que a sua vida, a verdadeira essência da sua vida, o seu centro, o seu tesouro, estava fora de Ithaca, nos 20 anos das suas deambulações.



Os parágrafos precedentes constituem uma ‘colagem’ de extractos de “Ignorance” (Faber & Faber, Londres, 2002), a última obra de Milan Kundera, que tomei a liberdade de traduzir da versão inglesa. Não lia Kundera há mais de dez anos, desde “A Insustentável Leveza do Ser” – quando havia mais tempo para leituras não acadêmicas; mais tempo para partilhar leituras com amigos. Tal como então, (re)descubro a extraordinária capacidade do Checo de nos surpreender com ficções que sub-repticiamente se insinuam nos nossos próprios factos. Como se ele tivesse seguido de perto o percurso das nossas pulsões, memórias, sonhos, desencantos. De alguns de nós. Ou será de todos nós? Haverá mesmo essa coisa chamada “memória colectiva”? Ignoro. Mas sei de quantas vezes uma certa ‘arrogância ignorante’ nos persegue com bizarras noções de poder ou “patriotismo”, mais não visando que expulsar-nos do nosso espaço de pertença natural; mais não visando, de facto, que dele se usurpar. Regressamos, então, ao centro de nós, onde nos redescobrimos, reinventamos ou perdemos, mas permanecemos irrevogávelmente iguais a nós próprios.


A.S. (Publicado em "Factos & Ficções", Semanário Angolense - Luanda, Dezembro, 2002)


*[First posted 12/01/07]
IGNORÂNCIA, OU A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO REGRESSO



- O que é que ainda estás aqui a fazer? Perguntou S. indignada.
- Mas tu não vês que eu tenho aqui o meu trabalho, o meu apartamento, a minha vida?, I. retorquiu.
- Meu Deus, I.! O que se está a passar no teu país é tão fascinante! Numa situação como aquela tudo se pode resolver!
- Mas S., não são só as questões práticas, o trabalho, o apartamento. Eu tenho estado aqui a viver há 20 anos. A minha vida está aqui!
- Será o teu grande regresso, respondeu S. depois de um longo silêncio.

Repetidas, as palavras adquiriram um tal poder que, no fundo de si, I. via-as escritas em letras capitais: GRANDE REGRESSO. Abandonou a sua resistência e deixou-se captivar por imagens súbitamente emergindo de livros lidos há muito tempo, de filmes, da sua própria memória e talvez da sua memória ancestral: o lar que todos carregamos dentro de nós; Odysseus vislumbrando a sua ilha depois de anos de vagueação; o regresso, o regresso, a grande magia do regresso.

A palavra grega para regresso é nostos. Algos significa sofrimento. Portanto, nostalgia é o sofrimento causado por um insaciado desejo de regressar. Para expressar essa noção fundamental, a maior parte dos europeus utiliza a palavra derivada do grego (nostalgia) assim como outras palavras com raízes nos seus idiomas nacionais: anoranza, dizem os espanhóis; saudade, dizem os portugueses. Em cada língua estas palavras têm uma diferente nuance semântica. Frequentemente elas significam apenas a tristeza causada pela impossibilidade de regressar ao país a que se pertence: o anseio pela terra, pelo lar. O que em Inglês se chama homesickness. Em espanhol anoranza vem do verbo anorar (sentir nostalgia), que vem do catalão enyorar, por sua vez derivado da palavra latina ignorare. Sob essa luz etimológica, nostalgia parece algo assim como a dor da ignorância, do não saber. Tu estás longe e eu não sei o que é feito de ti. O meu país está longe e eu não sei o que por lá se passa.

(…)

A alvorada da antiga cultura grega trouxe consigo o nascimento da Odisseia, o épico fundador da nostalgia. Enfatizemos: Odysseus, o maior aventureiro de todos os tempos, é também o maior nostálgico. Ele partira (não muito contente) para a guerra de Tróia e por lá ficara durante 10 anos. Depois tentou regressar à sua Ithaca nativa, mas as intrigas dos deuses prolongaram-lhe a viagem, primeiro durante 3 anos encalacrado no meio dos mais inusitados acontecimentos, depois por mais 7 anos que passou como refém e amante de Calypso, que na sua paixão não o deixava sair da ilha. Muito diferente da vida de pobre emigrada que I. tem levado por já bastante tempo. Odysseus viveu a verdadeira dolce vita lá na terra de Calypso, uma vida fácil, uma vida de delícias. No entanto, entre a dolce vita num lugar estrangeiro e o arriscado regresso a casa, ele escolheu o regresso.

Desde as primeiras semanas depois de ter emigrado, I. começou a ter estranhos sonhos: ela está num avião que muda de direcção e aterra num aeroporto desconhecido; homens armados e de uniforme esperam-na; num suor frio, ela reconhece a polícia. Noutra ocasião, ela está a caminhar numa pequena cidade quando vê um estranho grupo de mulheres, cada uma com uma caneca de cerveja, correndo em direcção a ela, chamando-a na sua língua com uma falsa cordialidade e, aterrorizada, I. realiza que está na sua terra. Ela grita e acorda.

Depois, durante uma conversa com um compatriota também emigrado, I. dá-se conta de que todos os emigrados tinham esses sonhos, todos, sem excepção; primeiro ela ficou comovida pela fraternidade nocturna de pessoas desconhecidas umas das outras, mas depois ficou um tanto irritada: como é possível que uma experiência tão privada como um sonho seja um acontecimento colectivo? O que é que, então, é unico à nossa alma?

Mas chega de perguntas que não têm resposta! Uma coisa era certa: em qualquer noite, milhares de emigrados sonhavam o mesmo sonho num sem número de variantes. O sonho-emigração: um dos fenómenos mais estranhos da segunda metade do século vinte. Esses sonhos-pesadelos pareciam-lhe tanto mais estranhos quanto o facto de que ela era assaltada simultâneamente por uma incontrolável nostalgia e outra experiência completamente oposta: paisagens da sua terra não paravam de passar pela sua mente durante o dia. Durante todo o dia essas fugidias imagens visitavam-na para atenuar o anseio pela sua terra perdida. O dia era iluminado pela beleza da terra abandonada, a noite pelo horror de a ela regressar. O dia mostrava-lhe o paraíso que perdera; a noite, o inferno de que fugira.

Leais à tradição da revolução francesa, os países comunistas excomungavam a emigração, considerada a mais odiosa traição. Todos os que permanecessem no exterior eram condenados in absencia no seu país de origem e os seus compatriotas não se atreviam a ter qualquer contacto com eles. J. relembrou-se de uma antiga idéia sua, que na altura ele próprio considerara blasfema: a aderência ao comunismo não tinha nada a ver com Marx e as suas teorias, mas simplesmente com o facto de que proporcionava às pessoas uma forma de satisfazerem as suas mais diversas necessidades psicológicas: a necessidade de parecer não-conformista, ou de obedecer, ou de punir os maus, ou de ser útil, ou de ter uma grande família à volta.

A razão pela qual as pessoas estão agora a abandonar o comunismo não se deve às suas idéias terem mudado ou a terem sofrido um choque, mas ao facto de o credo comunista já não responder a nenhuma necessidade. Tornou-se tão inútil, que toda a gente o deixa fácilmente cair, sem sequer se dar conta.

(…)

J. pergunta: se um país não é independente e nem sequer o quer ser, quererá alguém ainda morrer por ele?
– Querer morrer não é bem o que eu desejo para os meus filhos, N. retorquiu.
– Ponho a pergunta de outro modo, voltou J.: haverá alguém que ainda ame esse país?
- Como é que foste capaz de emigrar J.?! Tu és um patriota! Morrer pelo país – isso já acabou! Talvez para ti o tempo tenha parado durante a tua emigração. Mas eles, eles ja não pensam como tu, eles estão noutra!, exclamou N.

(...)

I. lamenta que os seus compatriotas pensem que todos os emigrados saem em busca de uma vida fácil: não sabem como é duro lutar por um lugar ao sol num país estrangeiro; deixar o país com crianças; perder o marido; criar as crianças sem dinheiro... Mas M. adverte-a: não vale a pena dizer-lhes isso. Até há pouco tempo toda a gente discutia sobre quem tinha passado pior sob o antigo regime. Todos queriam ser reconhecidos como vítimas. Mas esses concursos de sofrimento já passaram de moda. Agora as pessoas gabam-se do seu sucesso, não do seu sofrimento. Portanto, se eles decidirem conceder-te algum respeito, não será pela vida dura que tiveste, mas porque terás arranjado um homem rico!

(…)

I. sempre tomara como um dado que emigrar era uma desgraça. Mas agora ela interroga-se se isso não seria uma ilusão sugestionada pela forma como as pessoas avaliam um emigrado. Não estaria ela a interpretar a sua própria vida de acordo com as instruções operativas de outros? Ocorre-lhe que, embora lhe tenha sido imposta de fora e contra a sua vontade, a sua emigração era talvez, sem ela se ter apercebido, a melhor coisa que lhe tinha acontecido na vida. As implacáveis forças da história que tinham atacado a sua liberdade tinham-na, de facto, libertado.

(...)

Durante os 20 anos da ausência de Odysseus, o povo de Ithaca retivera muitas recordações dele, mas nunca sentira nostalgia por ele. Por seu lado, Odysseus sofria de nostalgia mas não se lembrava de quase nada. Podemos compreender esta curiosa contradição se realizarmos que para que a memória funcione bem precisa de constante prática: se as recordações não são evocadas repetidamente, em conversas com amigos, desaparecem. Quanto maior a nostalgia, mais vazia de recordações ela se torna. Durante 20 anos, Odysseus não pensara em mais nada senão no seu regresso. Mas uma vez regressado, espantou-se com a realização de que a sua vida, a verdadeira essência da sua vida, o seu centro, o seu tesouro, estava fora de Ithaca, nos 20 anos das suas deambulações.



Os parágrafos precedentes constituem uma ‘colagem’ de extractos de “Ignorance” (Faber & Faber, Londres, 2002), a última obra de Milan Kundera, que tomei a liberdade de traduzir da versão inglesa. Não lia Kundera há mais de dez anos, desde “A Insustentável Leveza do Ser” – quando havia mais tempo para leituras não acadêmicas; mais tempo para partilhar leituras com amigos. Tal como então, (re)descubro a extraordinária capacidade do Checo de nos surpreender com ficções que sub-repticiamente se insinuam nos nossos próprios factos. Como se ele tivesse seguido de perto o percurso das nossas pulsões, memórias, sonhos, desencantos. De alguns de nós. Ou será de todos nós? Haverá mesmo essa coisa chamada “memória colectiva”? Ignoro. Mas sei de quantas vezes uma certa ‘arrogância ignorante’ nos persegue com bizarras noções de poder ou “patriotismo”, mais não visando que expulsar-nos do nosso espaço de pertença natural; mais não visando, de facto, que dele se usurpar. Regressamos, então, ao centro de nós, onde nos redescobrimos, reinventamos ou perdemos, mas permanecemos irrevogávelmente iguais a nós próprios.


A.S. (Publicado em "Factos & Ficções", Semanário Angolense - Luanda, Dezembro, 2002)


*[First posted 12/01/07]