Friday, 15 May 2009

OLHARES DIVERSOS (III)

«Temos Doutores Com Teses Cabuladas»

O académico Paulo de Carvalho, com uma frontalidade no mínimo espartana, disse o que nunca se ouviu sobre o ensino superior em Angola.

Afinal, a que ritmo anda o país nestes tempos de profunda e intensa febre de doutorismos, quando a Universidade, aparentemente, deixou de ser o patamar último do percurso das elites do saber? Temos um ensino superior que nos encha de orgulho? Para o Professor Doutor Paulo de Carvalho, a resposta é directa: “não temos ensino superior digno desse nome”.

O sociólogo critica, com dureza, a incompetência que campeia pelos corredores das universidades, de professores e estudantes; diz que de cada cem novos licenciados, em média apenas dez têm qualidade aceitável; e mostra-se indignado com as performances de decanos, chefes de departamentos e regentes de cursos que no ano de 2006, num congresso internacional sobre ciências sociais em Luanda, foram incapazes de apresentar uma comunicação que fosse. “Alguns foram até lá passear a sua banga, outros foram fazer relações públicas”.


(...)


Para ser reitor, vice-reitor ou decano não bastará ter um doutoramento, até porque se sabe que existem doutoramentos cujas teses nunca foram depositadas na biblioteca da universidade, como manda a regra académica.

Porquê? Porque foram teses cabuladas ou foram teses escritas por outras pessoas que não os autores cujos nomes aparecem na capa. Para que alguém chegue a decano, vice-reitor ou reitor tem de ter mais que um doutoramento – tem de ter trabalhos de investigação e tem de apresentar conferências e comunicações de qualidade em congressos e outros fóruns académicos, em Angola e no estrangeiro. Temos casos de pessoas que não têm nada disso e nem sequer têm perfil académico, mas que já dirigiram faculdades, devido exactamente ao processo de suposta eleição que havia por cá.


O resultado disso foi o combate à competência, o combate à seriedade, o combate ao rigor académico, a aversão à investigação científica por todo o país, bem como a promoção da mediocridade, da incompetência, da corrupção e da maledicência. É preciso acautelar isso nas novas instituições logo à partida, se quisermos que elas cumpram realmente a sua missão. E é preciso deixar de querer fazer política em universidades – a política faz-se em partidos políticos e não nas universidades.


(...)

Há algumas faculdades estatais visadas, mas ultimamente ouve-se realmente falar também de algumas universidades privadas, onde praticamente toda a gente aprova e onde a maioria dos docentes tem somente licenciatura e não são acompanhados por graduados, como a lei determina.

(...)

Para ter uma ideia do que se passa, digo-lhe apenas que sei de docentes que se ajoelham diante de estudantes, pedindo-lhes para não denunciarem a sua incompetência… Há-os, sim. E olhe que, hoje, alguns desses docentes sem o mínimo de competência dirigem departamentos e alguns outros já dirigiram até faculdades…

(...)

Sempre defendi a ideia segundo a qual temos de formar pessoas ao nível do mestrado e do doutoramento. Mesmo antes de ter o doutoramento defendia essa ideia, da mesma forma como defendo a ideia segundo a qual existem funções para as quais se tem necessariamente de exigir o doutoramento. É isso que acontece pelo mundo e não podemos continuar a achar-nos excepção, porque são as excepções que promovem a baixa qualidade do ensino superior. Sobre haver doutoramentos, vou citar um caso que me foi relatado por um colega (o Dr. Víctor Kajibanga) e que está até escrito numa revista de sociologia. Quando surgiu a ideia de criação do primeiro curso de Sociologia em Angola, quem se opôs foram (ao contrário do que se possa imaginar) sociólogos. Porquê? Por temerem concorrência.

Só os incompetentes receiam que os seus estudantes os possam superar. Da mesma forma, quem rejeita a ideia de dever haver hoje doutoramentos em Angola são pessoas que receiam ser ultrapassadas pelos novos doutorados.


[Aqui]

«Temos Doutores Com Teses Cabuladas»

O académico Paulo de Carvalho, com uma frontalidade no mínimo espartana, disse o que nunca se ouviu sobre o ensino superior em Angola.

Afinal, a que ritmo anda o país nestes tempos de profunda e intensa febre de doutorismos, quando a Universidade, aparentemente, deixou de ser o patamar último do percurso das elites do saber? Temos um ensino superior que nos encha de orgulho? Para o Professor Doutor Paulo de Carvalho, a resposta é directa: “não temos ensino superior digno desse nome”.

O sociólogo critica, com dureza, a incompetência que campeia pelos corredores das universidades, de professores e estudantes; diz que de cada cem novos licenciados, em média apenas dez têm qualidade aceitável; e mostra-se indignado com as performances de decanos, chefes de departamentos e regentes de cursos que no ano de 2006, num congresso internacional sobre ciências sociais em Luanda, foram incapazes de apresentar uma comunicação que fosse. “Alguns foram até lá passear a sua banga, outros foram fazer relações públicas”.


(...)


Para ser reitor, vice-reitor ou decano não bastará ter um doutoramento, até porque se sabe que existem doutoramentos cujas teses nunca foram depositadas na biblioteca da universidade, como manda a regra académica.

Porquê? Porque foram teses cabuladas ou foram teses escritas por outras pessoas que não os autores cujos nomes aparecem na capa. Para que alguém chegue a decano, vice-reitor ou reitor tem de ter mais que um doutoramento – tem de ter trabalhos de investigação e tem de apresentar conferências e comunicações de qualidade em congressos e outros fóruns académicos, em Angola e no estrangeiro. Temos casos de pessoas que não têm nada disso e nem sequer têm perfil académico, mas que já dirigiram faculdades, devido exactamente ao processo de suposta eleição que havia por cá.


O resultado disso foi o combate à competência, o combate à seriedade, o combate ao rigor académico, a aversão à investigação científica por todo o país, bem como a promoção da mediocridade, da incompetência, da corrupção e da maledicência. É preciso acautelar isso nas novas instituições logo à partida, se quisermos que elas cumpram realmente a sua missão. E é preciso deixar de querer fazer política em universidades – a política faz-se em partidos políticos e não nas universidades.


(...)

Há algumas faculdades estatais visadas, mas ultimamente ouve-se realmente falar também de algumas universidades privadas, onde praticamente toda a gente aprova e onde a maioria dos docentes tem somente licenciatura e não são acompanhados por graduados, como a lei determina.

(...)

Para ter uma ideia do que se passa, digo-lhe apenas que sei de docentes que se ajoelham diante de estudantes, pedindo-lhes para não denunciarem a sua incompetência… Há-os, sim. E olhe que, hoje, alguns desses docentes sem o mínimo de competência dirigem departamentos e alguns outros já dirigiram até faculdades…

(...)

Sempre defendi a ideia segundo a qual temos de formar pessoas ao nível do mestrado e do doutoramento. Mesmo antes de ter o doutoramento defendia essa ideia, da mesma forma como defendo a ideia segundo a qual existem funções para as quais se tem necessariamente de exigir o doutoramento. É isso que acontece pelo mundo e não podemos continuar a achar-nos excepção, porque são as excepções que promovem a baixa qualidade do ensino superior. Sobre haver doutoramentos, vou citar um caso que me foi relatado por um colega (o Dr. Víctor Kajibanga) e que está até escrito numa revista de sociologia. Quando surgiu a ideia de criação do primeiro curso de Sociologia em Angola, quem se opôs foram (ao contrário do que se possa imaginar) sociólogos. Porquê? Por temerem concorrência.

Só os incompetentes receiam que os seus estudantes os possam superar. Da mesma forma, quem rejeita a ideia de dever haver hoje doutoramentos em Angola são pessoas que receiam ser ultrapassadas pelos novos doutorados.


[Aqui]

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