O EQUIVOCO MATA PORQUE AS INOCÊNCIAS CONTINUAM
Por Eugénio Monteiro Ferreira
04/02/2009
Tentando mostrar porventura que os exercícios intelectuais não são para todos, isto é , tentando demonstrar que não podem ter a opinião livre dos habituais situacionistas que, consoante os tempos vão mudando, eles e elas mudam logo de ideias em nome do actualismo, nomeadamente quando passam a ter alguma visibilidade, Inocência Mata lembrou-se de retirar da "gaveta" do seu pensamento o mais "puro" e felizmente curto, discurso estruturalmente racista. Que, como é bom desde logo ver, tem o seu caminho bloqueado pela história, devido ao simples facto de, após a análise científica se impôr, certamente que todo o situacionista, dependendo logicamente da perspectiva dominante do lugar geográfico que pretende sobrevalorizar, admitirá que o facciosismo é, por vezes bem menos temerário, bem mais performativo na sua ideologia, e bem menos idealista quanto ao processo histórico concreto. Diz a Catedrática num texto sobre a eleição de Barak Obama que "a realidade concreta, histórica, é que as pessoas são discriminadas pelas suas diferenças fenotípicas". Começa mal o texto e começa mal o seu mal-estar por causa disso mesmo porventura, pois não se sente bem certamente quem pretende, ainda hoje, encobrir uma ideologia que defende o anti-racismo teórico. Senão vejamos.
1º A professora doutora sabe que não pode afirmar "realidade concreta, histórica", porque está a confundir o dia de hoje com o dia de ontem e os dias dos séculos anteriores. Se tal é propositado ou não só a sua própria prática o poderá demonstrar. E está a confundir os dias porque sabe muito bem que nem a realidade moçambicana é igual à realidade angolana, nem tão pouco a realidade estadunidense é equivalente à realidade japonesa, a um plano; tão pouco a história do apartheid pode ser idêntica à história das relações entre africanos e europeus de origem em São Tomé, por um lado, no Princípe, por outro, a outro plano. É certamente motivo de mal-estar falar em "realidade africana" e logo confundir Angola e Moçambique, colocando à moda do nacionalismo do MPLA e da Frelimo, ambos os países no "mesmo saco". Mesmo na literatura, tivesse estudado a realidade de ambos os espaços sociais em profundidade, e tinha chegado á conclusão, simples, de que não eram só os vários componentes de naturalidade angolana e moçambicana que eram diferentes entre si, eram os próprios colonos e era a própria minoria branca que era completamente diferente no seu modo de ser e lidar com a "questão rácica". Não o admitir, é sintomático de quem é pelo menos ignorante do processo histórico de ambos os países.
2º Barak Hussein Obama é mulato, palavra "feia" na origem mas nem por isso historicamente verdadeira. E porquê? Porque é filho de um homem negro e de uma mulher branca. Como muito bem é sabido a relação entre os iniciais elementos do comércio longínquo - que se transformou em comércio escravista históriamente - levou a que o nacionalismo "rácico" e de cor da pele se andasse a defender pelo mundo em nome da "Mãe África". Essa foi a justificação emepelista para em vez de lutar contra o colonialismo em 1975 tivesse incentivado a luta contra os Colonizadores em Angola, contra aqueles, milhares, que "fabricaram mulatos" e nem sequer os perfilharam, etc. Ou seja, mesmo não se aceitando, compreende- se o juizo de valor contra o Pai "Europeu". Ora , como muito bem se sabe, não é bem a mesma coisa ser colonialista e ser colono, filho de colono ou até ...descendente de filho de colono. Nem academica, nem socialmente. Se se insiste em que Barak Obama é negro e não mulato, é porque não se entende de todo que, no caso concreto, é a "Mãe América" (ou Mãe Europa?) que deve ser sobrevalorizada e não o Pai "Africano". Ou então há manipulação de dados. Num rasgo individualista, no entanto com a pretensão legítima de conhecer a realidade objectiva gostaria de compreender qual a razão pela qual o meu filho é conhecido nas ruas periféricas da casa familiar em Luanda como Pula ou como Branco e Barak Obama é Negro? Será por causa daquela impossibilidade da ciência em "atingir" o facto de as "pessoas" e as "coisas" serem aquilo que os outros pensam ou entendem que elas são? Ou será que nos dias que correm os Catedráticos se andam a guiar cientificamente por critérios desses ou por categorias dessas ?
3º Certamente porque haverá muitas formas de pensar e muitas formas de julgar, a ciência, a prática científica, não deve ir atrás de noções sistematicamente situacionistas, do género ser "fascista" no tempo do fascismo, ser democrata no tempo dos democratas, ser racista no tempo do racismo, nem tão pouco ir atrás de hábitos regionalizados neste mundo que é só um. Por isso, do sopé da minha não academicidade, venho implorar a quem de direito... ou de mérito, que me dê umas explicações, pagas é claro pois certamente por divida histórica o merecerá, sobre a questão "racial" dado haver quem, no seu afâ de defender até aos limites os "seus", ao mesmo tempo que os "outros" ainda não sairam de uma fase de atacar os "seus" deles, confunde no pequeno texto, simultaneamente política, discriminação social, e história.
Finalmente, porque acredito que "o grande perigo de uma ideia repetida até à exaustão é ela começar a acreditar-se verdadeira" há que defintivamente não pretender igualdade naquilo que só a partir de agora, historicamente, vai ser possível: o paralelismo entre África e Europa. E porquê? Porque as "memórias de tempos de discriminação biológica, interdição cultural e proscrição política" são mesmo apagáveis. Sejam eles de longo termo ou de pequeno e médio termo. Por exemplo, em Angola, um dirigente do MPLA, dizia há tempos atrás que os angolanos tinham feito mais em 4 anos do que os portugueses (ou os colonos ?) durante o colonialismo. Será que não conta a afectação de recursos respectivos para se comparar o trabalho dos "colonos" , dos "naturais da terra" , dos "angolenses" e dos " indigenas" se comparados com o parasitismo da classe dominante actual ... de mãos dadas com o estrangeiro eficaz (quando havia uma administração competentissima de gente da terra antes da independência) , e em cadeia, de todo o tipo de produção sequente por parte dos trabalhadores actuais? O racismo estrutural de quem considera Barak Obama como negro é da parte de quem, catedrático inclusivé, não consegue ultrapassar a diferença artificial entre "brancos" e "não brancos", construida pelos apartheids deste mundo, utilizando a nacionalidade portuguesa e porventura tendo ajudado, historicamente, a que, ao nível dos poderes de decisão política directa, um país multirracial como Angola se transformasse num pais de negros com muitos brancos lá dentro; e Portugal se transforme, a custo, num país multirracial ... À revelia, inclusivé da história catedrática, pois, felizmente, foi a competência e o mérito que acabaram sempre, até hoje, por vir ao de cima na aventura que é a história da Humanidade.
(Sobre Obama, a «questão racial» e o esplendor do equívoco, Inocência Mata,
Angolense 24 a 31 de Janeiro, 2009)
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1 comment:
... uma análise inteligente, com perguntas e afirmações bem pertinentes. Sabe bem ler textos assim, pois me dão garantias de que "papagaios" e "pseudos qualquer coisa" sofrem resistências.
xaxuaxo
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