Tuesday, 20 March 2007

CORACAO DOS BOSQUES




"CORACAO DOS BOSQUES" de Jose Eduardo Agualusa EM 'BOOKS OF LIFE'


E’ assim nos bosques: ha' olhares que se espreitam por entre folhagens... bocas que se desdizem por entre o oco dos troncos... coracoes que se desdobram por entre o vazio dos corpos... maos que se tocam por entre intersticios de alma... sombras que se atropelam por entre luzes difusas... passos que se entrecruzam por entre picadas esconsas... sons que se sussurram por entre palavras indiziveis... aguas que se separam por entre caminhos do rio. Coracoes. E’ assim.
(A.S. Mar 20, 07)

Coracao dos Bosques (1991): consta da obra de Jose’ Eduardo Agualusa como o seu unico volume de poesia. Foi-me dedicado. Por isso o seu lugar em ‘Books of Life’.





“A poesia acerta mais que a ciência. Na natureza, por exemplo, a beleza é utilitária, isto é, não existe no universo fulgor sem serventia. Se os cientistas fossem à procura da beleza ao invés da funcionalidade chegariam mais depressa à funcionalidade.”

José Eduardo Agualusa
(“Discurso sobre o fulgor da língua” in “Catálogo de sombras”)


Uma Voz Que Canta Convoca A Terra Perdida

Uma voz que canta convoca a terra perdida.
Quase em surdina, evoca os secretos lugares
da infância;
o sítio onde pousavam os pássaros
o quintal cheio de estórias
e - lembras-te?- a tarde em chamas.

A voz murmura:
O exílio é onde nada se recorda de ti
Nada te diz:
sou teu/és meu




O Homem Que Vinha Ao Entardecer

(Ouvindo “Sonho de Um Camponês”, por Teta Lando)

Falava com devagar, ajeitando
as palavras. Falava com cuidado,
houvesse lume entre as palavras.

Chegava ao entardecer, os sapatos
cheios de terra vermelha e do perfume
dos matos.

Cumpria rigorosamente os rituais.

Batia primeiro as palmas (junto
ao peito)

Depois falava.
Dos bois, das lavras, das coisas
simples do seu dia-a-dia. E todavia
era tal o mistério das tardes quando
assim falava
que doía.



Os Rios Atónitos

(Ouvindo "Kongo", por Miriam Makeba)


Há palavras a dormir sobre o seu largo
assombro
Por exemplo, se dizes Quanza ou dizes Congo
é como se houvesse pronunciado os próprios
rios
Ou seja, as águas
pesadas de lama, os peixes todos e os perigos
inumeráveis
O musgo das margens, o escuro
mistério em movimento.

Dizes Quanza ou dizes Congo e um rio corre
Lento
em tua boca.

Dizes Quanza
e o ar se preenche de perfumes perplexos.

E dizes Congo
e onde o dizes há grandes aves
e súbitos sons redondos e convexos.

E dizes Quanza, ou dizes Congo
e sempre que o dizes acorda em torno
um turbilhão de águas:
a vida, em seu inteiro e infinito assombro.




"CORACAO DOS BOSQUES" de Jose Eduardo Agualusa EM 'BOOKS OF LIFE'


E’ assim nos bosques: ha' olhares que se espreitam por entre folhagens... bocas que se desdizem por entre o oco dos troncos... coracoes que se desdobram por entre o vazio dos corpos... maos que se tocam por entre intersticios de alma... sombras que se atropelam por entre luzes difusas... passos que se entrecruzam por entre picadas esconsas... sons que se sussurram por entre palavras indiziveis... aguas que se separam por entre caminhos do rio. Coracoes. E’ assim.
(A.S. Mar 20, 07)

Coracao dos Bosques (1991): consta da obra de Jose’ Eduardo Agualusa como o seu unico volume de poesia. Foi-me dedicado. Por isso o seu lugar em ‘Books of Life’.





“A poesia acerta mais que a ciência. Na natureza, por exemplo, a beleza é utilitária, isto é, não existe no universo fulgor sem serventia. Se os cientistas fossem à procura da beleza ao invés da funcionalidade chegariam mais depressa à funcionalidade.”

José Eduardo Agualusa
(“Discurso sobre o fulgor da língua” in “Catálogo de sombras”)


Uma Voz Que Canta Convoca A Terra Perdida

Uma voz que canta convoca a terra perdida.
Quase em surdina, evoca os secretos lugares
da infância;
o sítio onde pousavam os pássaros
o quintal cheio de estórias
e - lembras-te?- a tarde em chamas.

A voz murmura:
O exílio é onde nada se recorda de ti
Nada te diz:
sou teu/és meu




O Homem Que Vinha Ao Entardecer

(Ouvindo “Sonho de Um Camponês”, por Teta Lando)

Falava com devagar, ajeitando
as palavras. Falava com cuidado,
houvesse lume entre as palavras.

Chegava ao entardecer, os sapatos
cheios de terra vermelha e do perfume
dos matos.

Cumpria rigorosamente os rituais.

Batia primeiro as palmas (junto
ao peito)

Depois falava.
Dos bois, das lavras, das coisas
simples do seu dia-a-dia. E todavia
era tal o mistério das tardes quando
assim falava
que doía.



Os Rios Atónitos

(Ouvindo "Kongo", por Miriam Makeba)


Há palavras a dormir sobre o seu largo
assombro
Por exemplo, se dizes Quanza ou dizes Congo
é como se houvesse pronunciado os próprios
rios
Ou seja, as águas
pesadas de lama, os peixes todos e os perigos
inumeráveis
O musgo das margens, o escuro
mistério em movimento.

Dizes Quanza ou dizes Congo e um rio corre
Lento
em tua boca.

Dizes Quanza
e o ar se preenche de perfumes perplexos.

E dizes Congo
e onde o dizes há grandes aves
e súbitos sons redondos e convexos.

E dizes Quanza, ou dizes Congo
e sempre que o dizes acorda em torno
um turbilhão de águas:
a vida, em seu inteiro e infinito assombro.

2 comments:

Raquel Sabino Pereira said...

Happy Springtime, Koluki!!!
Kandando!!!

Koluki said...

Same to you SG!
Kandando!!!