Thursday, 20 September 2007

PILHAGEM DAS COLONIAS*


Os historiadores habituaram-se a passar ao lado de um argumento que, por parecer razoável, se impôs como um critério de reconstrução da realidade sobre o que foi a acção do império colonial português. Tal argumento, já repetido em várias ocasiões e mais recentemente por Vasco Pulido Valente, sustenta ser grosseiro considerar o colonialismo uma empresa de rapina, porque para haver pilhagem era necessário haver riqueza e esta simplesmente não existiu nas colónias. Como toda a linguagem, este argumento traduz talvez o ponto de vista de uma boa parte dos estudiosos portugueses, mas não o olhar dos
historiadores africanos. Para estes, e para mim em particular, a pilhagem foi uma realidade inquestionável. Ela aconteceu não de forma episódica e sim como um fenómeno sistémico que atravessou todos os períodos do processo colonial.
(...)
A partir de 1820, esta situação descambou de todo. Os governadores mal chegavam ao seu destino caíam adormentados nos braços dos negociantes locais. Tornavam-se acessíveis a todo o tipo de ofertas e até navios aceitavam, contanto que fechassem os olhos a negociatas de vulto. (…) Quer a administração da Alfândega, quer a Fazenda Pública jaziam então no maior aviltamento e desmoralização de costumes, ao arbítrio de um sem-número de infracções. Entre os seus prevaricadores contava-se o próprio governador, bandeado com um grupo de altos funcionários [europeus e nativos], todos venais e integrantes do seu círculo mais reservado.
(...)
Os domínios ultramarinos efectivamente achavam-se desamparados, vergados à “estupidez atrevida” [conforme expressão de Meneses] de quem dirigia o pelouro dos negócios ultramarinos. E outrossim ao arbítrio de “funcionários mesquinhos, ávidos e insaciáveis”. O permanente descontrolo financeiro e administrativo resultante da má-gestão, delapidação de dinheiros e descaminho das receitas do Estado acabou por fazer desperdiçar todas as riquezas por influência da política nefasta de Lisboa, controlada por grupos ineptos e corruptos.
(...)
Inútil. Ninguém lhe deu ouvidos. Era mais fácil esbanjar o Tesouro e logo a seguir recorrer aos empréstimos do Banco Rothschild, de Londres. A cupidez e o “imbecil amolecimento de cérebros”, na luminosa observação de Ramalho Ortigão, marcavam a cadência no Portugal libertino do século XIX.

(Ler artigo completo AQUI)


*Artigo publicado pelo Historiador Angolano Carlos Pacheco no Jornal Publico - Lisboa, 08/01/07
N.B.: Para uma analise comparativa das ideias e factos aqui expressos, conviria ler tambem ESTE outro artigo.

Os historiadores habituaram-se a passar ao lado de um argumento que, por parecer razoável, se impôs como um critério de reconstrução da realidade sobre o que foi a acção do império colonial português. Tal argumento, já repetido em várias ocasiões e mais recentemente por Vasco Pulido Valente, sustenta ser grosseiro considerar o colonialismo uma empresa de rapina, porque para haver pilhagem era necessário haver riqueza e esta simplesmente não existiu nas colónias. Como toda a linguagem, este argumento traduz talvez o ponto de vista de uma boa parte dos estudiosos portugueses, mas não o olhar dos
historiadores africanos. Para estes, e para mim em particular, a pilhagem foi uma realidade inquestionável. Ela aconteceu não de forma episódica e sim como um fenómeno sistémico que atravessou todos os períodos do processo colonial.
(...)
A partir de 1820, esta situação descambou de todo. Os governadores mal chegavam ao seu destino caíam adormentados nos braços dos negociantes locais. Tornavam-se acessíveis a todo o tipo de ofertas e até navios aceitavam, contanto que fechassem os olhos a negociatas de vulto. (…) Quer a administração da Alfândega, quer a Fazenda Pública jaziam então no maior aviltamento e desmoralização de costumes, ao arbítrio de um sem-número de infracções. Entre os seus prevaricadores contava-se o próprio governador, bandeado com um grupo de altos funcionários [europeus e nativos], todos venais e integrantes do seu círculo mais reservado.
(...)
Os domínios ultramarinos efectivamente achavam-se desamparados, vergados à “estupidez atrevida” [conforme expressão de Meneses] de quem dirigia o pelouro dos negócios ultramarinos. E outrossim ao arbítrio de “funcionários mesquinhos, ávidos e insaciáveis”. O permanente descontrolo financeiro e administrativo resultante da má-gestão, delapidação de dinheiros e descaminho das receitas do Estado acabou por fazer desperdiçar todas as riquezas por influência da política nefasta de Lisboa, controlada por grupos ineptos e corruptos.
(...)
Inútil. Ninguém lhe deu ouvidos. Era mais fácil esbanjar o Tesouro e logo a seguir recorrer aos empréstimos do Banco Rothschild, de Londres. A cupidez e o “imbecil amolecimento de cérebros”, na luminosa observação de Ramalho Ortigão, marcavam a cadência no Portugal libertino do século XIX.

(Ler artigo completo
AQUI)


*Artigo publicado pelo Historiador Angolano Carlos Pacheco no Jornal Publico - Lisboa, 08/01/07
N.B.: Para uma analise comparativa das ideias e factos aqui expressos, conviria ler tambem ESTE outro artigo.

3 comments:

Muadiê Maria said...

Sem dúvida nenhuma a pilhagem foi uma realidade inquestionável. E sofremos as consequências disso até hoje.

Anonymous said...

Bem, se realmente Angola foi inventada por quem dizem que foi, é caso para se dizer que “quem sai aos seus não degenera”!

Koluki said...

Maria Muadie': absolutamente de acordo. Mas parece que temos um problema adicional as consequencias da pilhagem colonial: a sua negacao como forma de justificar a pilhagem post-colonial que neste momento assume proporcoes e dimensoes inacreditaveis.


Diasporo: Ora nem mais! Acontece porem que os que se consideram "unicos inventores" de Angola - que de facto nao existia como tal antes da colonizacao, o que nao significa que os seus povos "indigenas" e respectivas culturas, linguas e instituicoes nao existissem - esquecem-se que "ainda" nao conseguiram fazer dela "um so' povo, uma so' nacao" e ha' quem nao esteja realmente para os aturar, pelo menos enquanto mantiverem as suas arrogancias ilimitadas...