Saturday, 29 May 2010

Noticias do meu pais

O Kudibanguela, a partir do momento em que deixou de servir os interesses do MPLA, foi extinto. O Presidente Neto, que havia «assinado por baixo» quando a ideia de criação do programa lhe foi apresentada, não teve de decretar a sua extinção: convidou a equipa para um jantar, no decurso do qual anunciou que, a partir daquele dia… não mais kudibanguela. Ele disse para nós, nesse jantar, cito: «…camaradas, convém ao MPLA que o Kudibanguela não mais vá para o ar…»
(...)
Da equipa do Kudibanguela faziam parte: Manuel Neto (MBala), coordenador e na altura DG da RNA; Adelino Santos (Betinho); Costa Benjamim NGalangandja; Emanuel Costa (Manino); Rui Malaquias (Ngila); Colosso; Evaristo Rocha; Ricardina Rocha (Didina). Na Rádio Nacional fomos assessorados na sonoplastia pelo Fernando Neves, o Artur Arriscado e o Óscar Gourgel, que em momento algum foram tidos como membros da equipa. Do Kudibanguela mesmo restamos quatro para contar a história.

Emanuel de Jesus Conceição Costa «Manino»
(in Semanario Angolense, edicao #369, pp. 7-9)



Manuel Bernardo Neto (MBala) - meu cunhado (marido da minha irma mais velha, que tambem viria a ser presa do 27 de Maio durante cerca de dois anos). Com ele aprendi a jogar xadrez (ele tinha-o aprendido quando esteve preso pela Pide em S. Nicolau no periodo colonial, tendo sido libertado na sequencia do 25 de Abril). Vi-o pela ultima vez no domingo anterior ao 27/05/77, durante um almoco de familia em casa da minha mae, que terminara numa acesa discussao politico-ideologica entre ele e um outro meu cunhado, o Waldemar Parreira, o Dumas, [ligado a OCA - Organizacao Comunista de Angola - e que tambem viria a ser preso durante varios meses na cadeia de Sao Paulo (...onde, ja' depois de regressada do Lubango, fui algumas vezes com a mulher dele, a minha outra irma, a artista plastica Maria Teresa Santana, a.k.a. Mawete vo Teka-Sala, a Tekas, ajuda-la a levar-lhe o farnel - com um volume de Herminios mandados pelo Tirso pelo meio - a que so' a partir de determinada altura alguns prisioneiros passaram a ter direito uma vez por semana, ou de 15 em 15 dias... enquanto aguardavamos a nossa vez de sermos chamadas pela seguranca - que passava tudo a pente fino antes de autorizar a entrada do que quer que fosse la' para dentro - por entre o verdadeiro arraial de fraternidades familiares que ali se reunia em frente a cadeia, eu via como alguns prisioneiros se acotovelavam em algumas celas de onde se podia ver por sobre os muros, para verem quem ali estava, quem tinha vindo... tentava ansiosamente reconhece-los, mas as grades e a distancia nao o permitiam... despedia-me com um adeus, retribuido nao sei por quem - ate' hoje...) e depois expulso para Portugal] ... Esta e' a primeira vez que vejo o nome do MBala mencionado em qualquer relato sobre o 27 de Maio (ressalvando aqui que ainda nao li todos os que ate' agora foram publicados).

[Paz A Sua Alma]



E por falar da minha irma mais velha (tambem mencionada aqui), a (tambem) economista Maria Elisa Santana, a Nanay, foi ela que, com o MBala, trouxe ao mundo o autor deste livro. Foram dela tambem as palavras que se seguem, publicadas ha' 3 anos no espaco de comentarios a este post.



Forca Ana Koluki!

Acho que estas a encaminhar o assunto super bem, contudo depois de checkar o blog em quest~ao, ja ha uns dias e mesmo agora, nao posso deixar de sentir uma raiva enorme pelo facto de a situacao social/cultural/historica/economica do pais estar de tal modo distorcida que intrusos e usurpadores como e' claramente o caso dessa criatura ou aberracao da natureza, se possam arrogar nao so a intrometer-se e banalizar assuntos ta~o profundamente nossos e sagrados, como e' o caso 27Maio,"fraccionismo" , a tragedia Nacional,que roubou a Nacao Angolana de mais de 40 mil jovens (estimativas da Amnistia Internacional), numero que pessoalmente nao disputo, porque so' eu e mais duas pessoas proximas em 1991 compilamos de entre os nossos conhecimentos pessoais uma lista de mais de 200 nomes isso foi para uma entrevista que eu dei nesse ano para essa organizacao AI, se considerarmos que esses jovens na sua grande maioria eram justamente os que mais activamente e abertamente continuavam a bater-se pela independencia de Angola no seu sentido mais amplo, jovens esses que incondicionalmente se dedicaram e profundamente acreditaram no MPLA e seu Lider A.Neto, que de facto foram a pedra angular para o MPLA ascender ao poder nas condico~es em que o fez, porque sem eles, sua determinacao e dedicacao combinada com inexperiencia+ingenuidade de que so' jovens sao capazes(celulas urbanas e gerrilha da primeira regi~ao), nem com dez vezes mais apoio da esquerda Portuguesa Rosas ou Gagos Coutinhos, O Sr. "M" , face a sua desarticulacao interna e campanha militar UNITA/FNLA e atitude de nao reconciliacao, nao teria a menor chance!

O facto 'e que o MPLA com este, "fracionismo" que de facto so, fracionismo 'e um anocronismo endemico do grande "M", o 27 de Maio foi apenas o mais visivel, porque conseguiu nao deixar uma unica familia Angolana, nem mesmo a familia do presidende Neto, de facto foi uma das mais proficuas, com pelo menos 3 viti'mas, todas as familias Angolanas com ligacoes urbanas foram afectadas = perca de familiar, amigo ou conhecido morto=desaparecido, preso ou desempregado (lembrar que o Estado era o unico empregador em 1977) consumou de facto em grande medida o "Wipe off" de uma geracao. Os anacronismos do grande "M" com os seus efeitos de devastacao no tecido politico, social e cultural do Pais, nao fica por ai, continua com a desafectacao dos jovens DISAS utilisados, que na sua maioria sucumbiram ou estao mentalmente desarticulados, do exodo de jovens para as pedreiras portuguesas, ngundas Britanicas e so' NGana Zambi sabe para que paises mais, o talento angolano de todos tamanhos e graus porque o facto e' que Angola independente produz mais emigrantes que Angola colonisada e em contra-partida nutre e acolhe aberracoes como a criatura em causa, que enquanto, paga a peso de ouro com os recursos petroliferos do Pais, dos Angolanos certamente deve apreciar deleitada enquanto acessa a internet,como so' ela sabe e pode... com ar condicionado ligado, jantar de 5 estrelas feito pelo cozinheiro Mavunga casa limpa pela servente Massanga... ao longe ela deve ver da janela do quarto dela e achar muito romantico o bambolear das labaredas, feitas de lenha de pau preto, rosa ou ferro, que sao a unica fonte de energia possivel para cozinhar a unica refeicao do dia da familia do Mavunga e a melhor oportunidade de escolarizacao da filha da Massanga, que passou dia na Lavra, porque o programa da FESA ainda nao chegou ate a sanzala dela para construir uma escola ou coisa alguma, e entao pode ver o rosto da avo dela Mbembo, iluminado pelas labaredas, chorar os contos de antigamente de quando Angola era colonia...que devem provocar na miuda Ufolo um desejo de conhecer tal "maravilha".
Enquanto isso a Internauta do Malongo certamente que se cruza nos corredores da petrolifera com o engenheiro NVunda, que ha 5 mais anos esta a tentar construir uma casa de blocos no Jacare, que
deve ser casado com a Dra Luegi, formada em Cuba e continua desempregada, porque ainda na~o conseguiu fundos suficientes para abrir a propria clinica nem foi aceite em nenhuma das parcerias de saude privada, porque nao e de nenhuma das "familias".

Acho que a minha raiva diminuiu, mas algem tem de repor a
legalidade, a dignidade, o nacionalismo, recuperar a Historia a Nacao para os
Angolanos e nao deixar brecha nem clima para Desgracas abjectas como a criatura em causa possam nem mesmo conjecturar, que quando lhes e dada a oportunidade de trabalhar/viver nababescamente em Angola tenham qualquer outro assunto com Angola ou Angolanos, para alem de prestar o servico para o qual sao pagos anyway....

I did flag the thing, but did not get the sense that it is
effective!”

O Kudibanguela, a partir do momento em que deixou de servir os interesses do MPLA, foi extinto. O Presidente Neto, que havia «assinado por baixo» quando a ideia de criação do programa lhe foi apresentada, não teve de decretar a sua extinção: convidou a equipa para um jantar, no decurso do qual anunciou que, a partir daquele dia… não mais kudibanguela. Ele disse para nós, nesse jantar, cito: «…camaradas, convém ao MPLA que o Kudibanguela não mais vá para o ar…»
(...)
Da equipa do Kudibanguela faziam parte: Manuel Neto (MBala), coordenador e na altura DG da RNA; Adelino Santos (Betinho); Costa Benjamim NGalangandja; Emanuel Costa (Manino); Rui Malaquias (Ngila); Colosso; Evaristo Rocha; Ricardina Rocha (Didina). Na Rádio Nacional fomos assessorados na sonoplastia pelo Fernando Neves, o Artur Arriscado e o Óscar Gourgel, que em momento algum foram tidos como membros da equipa. Do Kudibanguela mesmo restamos quatro para contar a história.

Emanuel de Jesus Conceição Costa «Manino»
(in Semanario Angolense, edicao #369, pp. 7-9)



Manuel Bernardo Neto (MBala) - meu cunhado (marido da minha irma mais velha, que tambem viria a ser presa do 27 de Maio durante cerca de dois anos). Com ele aprendi a jogar xadrez (ele tinha-o aprendido quando esteve preso pela Pide em S. Nicolau no periodo colonial, tendo sido libertado na sequencia do 25 de Abril). Vi-o pela ultima vez no domingo anterior ao 27/05/77, durante um almoco de familia em casa da minha mae, que terminara numa acesa discussao politico-ideologica entre ele e um outro meu cunhado, o Waldemar Parreira, o Dumas, [ligado a OCA - Organizacao Comunista de Angola - e que tambem viria a ser preso durante varios meses na cadeia de Sao Paulo (...onde, ja' depois de regressada
do Lubango, fui algumas vezes com a mulher dele, a minha outra irma, a artista plastica Maria Teresa Santana, a.k.a. Mawete vo Teka-Sala, a Tekas, ajuda-la a levar-lhe o farnel - com um volume de Herminios mandados pelo Tirso pelo meio - a que so' a partir de determinada altura alguns prisioneiros passaram a ter direito uma vez por semana, ou de 15 em 15 dias... enquanto aguardavamos a nossa vez de sermos chamadas pela seguranca - que passava tudo a pente fino antes de autorizar a entrada do que quer que fosse la' para dentro - por entre o verdadeiro arraial de fraternidades familiares que ali se reunia em frente a cadeia, eu via como alguns prisioneiros se acotovelavam em algumas celas de onde se podia ver por sobre os muros, para verem quem ali estava, quem tinha vindo... tentava ansiosamente reconhece-los, mas as grades e a distancia nao o permitiam... despedia-me com um adeus, retribuido nao sei por quem - ate' hoje...) e depois expulso para Portugal] ... Esta e' a primeira vez que vejo o nome do MBala mencionado em qualquer relato sobre o 27 de Maio (ressalvando aqui que ainda nao li todos os que ate' agora foram publicados).

[Paz A Sua Alma]



E por falar da minha irma mais velha (tambem mencionada aqui), a (tambem) economista Maria Elisa Santana, a Nanay, foi ela que, com o MBala, trouxe ao mundo o autor deste livro. Foram dela tambem as palavras que se seguem, publicadas ha' 3 anos no espaco de comentarios a este post.



Forca Ana Koluki!

Acho que estas a encaminhar o assunto super bem, contudo depois de checkar o blog em quest~ao, ja ha uns dias e mesmo agora, nao posso deixar de sentir uma raiva enorme pelo facto de a situacao social/cultural/historica/economica do pais estar de tal modo distorcida que intrusos e usurpadores como e' claramente o caso dessa criatura ou aberracao da natureza, se possam arrogar nao so a intrometer-se e banalizar assuntos ta~o profundamente nossos e sagrados, como e' o caso 27Maio,"fraccionismo" , a tragedia Nacional,que roubou a Nacao Angolana de mais de 40 mil jovens (estimativas da Amnistia Internacional), numero que pessoalmente nao disputo, porque so' eu e mais duas pessoas proximas em 1991 compilamos de entre os nossos conhecimentos pessoais uma lista de mais de 200 nomes isso foi para uma entrevista que eu dei nesse ano para essa organizacao AI, se considerarmos que esses jovens na sua grande maioria eram justamente os que mais activamente e abertamente continuavam a bater-se pela independencia de Angola no seu sentido mais amplo, jovens esses que incondicionalmente se dedicaram e profundamente acreditaram no MPLA e seu Lider A.Neto, que de facto foram a pedra angular para o MPLA ascender ao poder nas condico~es em que o fez, porque sem eles, sua determinacao e dedicacao combinada com inexperiencia+ingenuidade de que so' jovens sao capazes(celulas urbanas e gerrilha da primeira regi~ao), nem com dez vezes mais apoio da esquerda Portuguesa Rosas ou Gagos Coutinhos, O Sr. "M" , face a sua desarticulacao interna e campanha militar UNITA/FNLA e atitude de nao reconciliacao, nao teria a menor chance!

O facto 'e que o MPLA com este, "fracionismo" que de facto so, fracionismo 'e um anocronismo endemico do grande "M", o 27 de Maio foi apenas o mais visivel, porque conseguiu nao deixar uma unica familia Angolana, nem mesmo a familia do presidende Neto, de facto foi uma das mais proficuas, com pelo menos 3 viti'mas, todas as familias Angolanas com ligacoes urbanas foram afectadas = perca de familiar, amigo ou conhecido morto=desaparecido, preso ou desempregado (lembrar que o Estado era o unico empregador em 1977) consumou de facto em grande medida o "Wipe off" de uma geracao. Os anacronismos do grande "M" com os seus efeitos de devastacao no tecido politico, social e cultural do Pais, nao fica por ai, continua com a desafectacao dos jovens DISAS utilisados, que na sua maioria sucumbiram ou estao mentalmente desarticulados, do exodo de jovens para as pedreiras portuguesas, ngundas Britanicas e so' NGana Zambi sabe para que paises mais, o talento angolano de todos tamanhos e graus porque o facto e' que Angola independente produz mais emigrantes que Angola colonisada e em contra-partida nutre e acolhe aberracoes como a criatura em causa, que enquanto, paga a peso de ouro com os recursos petroliferos do Pais, dos Angolanos certamente deve apreciar deleitada enquanto acessa a internet,como so' ela sabe e pode... com ar condicionado ligado, jantar de 5 estrelas feito pelo cozinheiro Mavunga casa limpa pela servente Massanga... ao longe ela deve ver da janela do quarto dela e achar muito romantico o bambolear das labaredas, feitas de lenha de pau preto, rosa ou ferro, que sao a unica fonte de energia possivel para cozinhar a unica refeicao do dia da familia do Mavunga e a melhor oportunidade de escolarizacao da filha da Massanga, que passou dia na Lavra, porque o programa da FESA ainda nao chegou ate a sanzala dela para construir uma escola ou coisa alguma, e entao pode ver o rosto da avo dela Mbembo, iluminado pelas labaredas, chorar os contos de antigamente de quando Angola era colonia...que devem provocar na miuda Ufolo um desejo de conhecer tal "maravilha".
Enquanto isso a Internauta do Malongo certamente que se cruza nos corredores da petrolifera com o engenheiro NVunda, que ha 5 mais anos esta a tentar construir uma casa de blocos no Jacare, que
deve ser casado com a Dra Luegi, formada em Cuba e continua desempregada, porque ainda na~o conseguiu fundos suficientes para abrir a propria clinica nem foi aceite em nenhuma das parcerias de saude privada, porque nao e de nenhuma das "familias".

Acho que a minha raiva diminuiu, mas algem tem de repor a
legalidade, a dignidade, o nacionalismo, recuperar a Historia a Nacao para os
Angolanos e nao deixar brecha nem clima para Desgracas abjectas como a criatura em causa possam nem mesmo conjecturar, que quando lhes e dada a oportunidade de trabalhar/viver nababescamente em Angola tenham qualquer outro assunto com Angola ou Angolanos, para alem de prestar o servico para o qual sao pagos anyway....

I did flag the thing, but did not get the sense that it is
effective!”

2 comments:

Koluki said...

A proposito do passamento de Saramago e a sua exaltacao da Filosofia “como espaco, lugar, metodo de reflexao” (vide http://koluki.blogspot.com/2010/06/jose-saramago-rip.html), lembrei-me de uma “longa conversa” havida em finais de 2005 no espaco do Angonoticias (aqui: http://www.angonoticias.com/full_headlines.php?id=7831), na qual participei, sob o pseudonimo “Kalu Pura”, com os seguintes dois comentarios; o primeiro em resposta a um comentario (tambem reproduzido abaixo) supostamente assinado por Saramago (ou apenas de alguem citando-o):


Kalu Pura

Nao fosse o assunto que e’ e nao estivesse nele envolvido o nome de um premio Camoes, duvidaria da autenticidade da assinatura de um premio Nobel aposta a um dos comentarios nestas humildes paginas. Mas quaisquer duvidas que porventura ainda me sobrassem seriam desvanecidas pelo conteudo de tal comentario. Saramago faz jus a espinha dorsal do pensamento filosofico que partilha com Pepetela: o materialismo (historico e dialectico) e a negacao da verdade como conceito absoluto (“toda a verdade e’ relativa”). E’ nessa dialectica marxista-leninista que ambos assentam a sua ficcao narrativa, com relativo sucesso literario (aceita a relatividade da critica literaria?), mas com um enorme custo real do ponto de vista humanistico: o da negacao da realidade objectiva do ser humano concreto (este foi, alias, o pecado capital do “socialismo cientifico”). Foi na relativizacao, compartimentacao e atomizacao da VERDADE que lhes permitiu a negacao de “algumas verdades” em favor de “outras” mais suportaveis, que alguns dos nossos intelectuais encontraram respaldo para o que de outro modo seriam, no minimo, sentimentos de culpa insuportaveis. Mas, queira-se ou nao, a VERDADE EXISTE - em particular para os orfaos, pais e irmaos a quem nao se pode simplesmente dizer: e’ mentira, os vossos pais, filhos e irmaos nao foram presos, nem torturados e muito menos mortos! A verdade existe sim e, como diz o ditado popular, tal como o azeite vem sempre ao de cima! Por isso nao me posso conformar com a ideia de que um acontecimento que teve um impacto tao traumatico e devastador sobre a sociedade angolana seja simplesmente enterrado com os seus principais protagonistas, quando centenas, senao milhares, de orfaos, viuvas e um grande numero de familias angolanas continuam sem saber o que e porque realmente aconteceu com os seus entes queridos, ou sequer onde estao os seus ossos, ja para nao falar na simples admissao oficial da sua liquidacao sumaria e na emissao das respectivas certidoes de obito, que sao basicos direitos humanos e de cidadania de todos nos! Para mim, eh precisamente o respeito que devemos a TODOS os mortos do 27 de Maio que exige que a verdade e nada menos do que a verdade venha completamente ao de cima. E nao so o respeito pelos mortos: a construcao de um futuro de paz e harmonia para nos os ainda vivos e para as geracoes dos nossos filhos, netos e bisnetos exige que todos os fantasmas do nosso passado sejam completamente exorcisados e as suas cinzas completamente varridas, sob pena de as almas dos nossos mortos jamais virem a gozar da paz eterna que lhes eh devida! Como nos aconselha o senso comum, ha que enterrar os nossos mortos condignamente, mas a nossa prioridade deve ser cuidar apropriadamente dos vivos, senao viveremos para sempre como mortos-vivos em eterno estado de luto num pais mal assombrado… Agora que a paz institucional entre o MPLA e a UNITA parece ser irreversivel, os acontecimentos do 27 de Maio e todos os contenciosos ainda pendentes da guerra que devastou o pais por decadas que pareciam nao ter fim deveriam sim ser objecto de algo assim como a ‘Comissao para a Verdade e Reconciliacao’ que tanto ajudou a Africa do Sul a enfrentar o seu futuro com optimismo e com espiritos mais ou menos pacificados. E tal evento, que deveria assumir foros de um verdadeiro Komba Ditokwa Nacional, deveria realizar-se mais cedo do que tarde!

[Segue no proximo comentario]

Koluki said...

Kalu Pura

Nas ultimas 2 semanas a Namibia tem sido assolada por uma onda de descoberta de valas comuns (por sinal muito perto da fronteira com Angola) datadas dos anos 80, do periodo deles de "luta de libertacao"... Ha varios anos que varias organizacoes da sociedade civil namibiana vinham reclamando ao governo a instituicao de uma comissao de verdade e reconciliacao, mas este sempre se recusou, em nome de nao "reavivar fantasmas do passado"... A verdade e' que entre as ossadas descobertas ocasionalmente por construtores, ha vitimas de todos os lados e mais alguns: da SWAPO contra militantes seus, do exercito sul-africano contra a SWAPO e tudo a volta, do grupo etnico maioritario da SWAPO contra grupos etnicos minoritarios... enfim! Resultado, a paz podre que tentaram instaurar em vez de abrirem o processo da verdade acabou por rebentar-lhes aos pes e a vista desarmada: alguns jornais publicaram fotografias de ossadas humanas a serem exumadas em praias sob o olhar estupefacto e horrorizado de turistas... os tais que pretendiam atrair varrendo todo o tipo de "lixo" para debaixo dos tapetes! Um espectaculo que poderia bem ter sido evitado, tivesse o governo ouvido o clamor da nacao! Agora, perante a evidencia indesmentivel, a SWAPO ja comeca a dar sinais de comecar a aquiescer a inevitabilidade da VERDADE HISTORICA...


VERDADE

A verdade não existe. Se a verdade existisse, teria de existir sempre e então ter-nos-íamos apercebido de que, além das mudanças de todo o tipo que acontecem, e continuarão a acontecer, haveria qualquer coisa que se manteria imutável, constante, e essa seria a verdade. Não há nenhuma verdade dessas; há muitas verdades e, como eu creio ter escrito alguma vez, as verdades são muitas e têm que lutar umas com as outras e depois logo se vê o que resulta. Resultará uma ou outra verdade mas sempre serão verdades transitórias, que abrem ou fecham caminhos. A verdade com maiúscula, com letra grande, isso não é coisa que exista, embora algumas pessoas, creio, acreditem que sim e vivam ou tentem viver em função disso. Para mim, a verdade não existe... não há verdades históricas e acabou. JOSE SARAMAGO