O titulo desta mukanda poderia bem ser, mais uma vez, "Amizade, amizade, para que te quero?"...
Hoje a amizade e familia sao manobradas pelo contexto, cantava Bonga numa cancao ja' entradota nos anos, mas que se mantem perfeitamente aplicavel a sociedade angolana dos dias de hoje. Yannick Ngombo, o Afroman, tem uma cancao sobre o "amigo" que pede emprestado dinheiro e que depois nao paga, nem quer pagar e ainda se acha afrontado quando o credor lhe cobra... Numa outra cancao, o mesmo Yannick diz: "aqui (Angola) nao vale a pena voce ficar muito simpatico, senao te apanham a pata!..."
Ao que vem isto? Um pouco a proposito de este blog ser, desde o inicio, dedicado a "deitar contas a vida" (aqui gostaria de sugerir fortemente aos interessados a leitura deste post e, muito especialmente, do "amigavel aviso a navegacao" a ele anexo) e de, ironicamente, a experiencia e as 'descobertas' que com ele adquiri me terem forcado (naquilo que referi aqui ha dias como sendo possivelmente um novo ciclo de vida) a repensar todas as minhas perspectivas de futuro e relacoes pessoais, em particular as de amizade e familia - o que tambem passa por algumas "contas de deve e haver".
Nao me proponho aqui estender-me demasiado sobre tudo isso, mas ha' pelo menos uma coisa que se me impoe dizer: sempre pautei a minha vida por assumir plenamente todas as minhas responsabilidades e por seguir, entre outras, estas tres regras de conduta fundamentais: i) nunca me relacionar com quem quer que seja meramente na base do 'status social' ou do interesse material e/ou financeiro; ii) pagar escrupulosamente, e tanto quanto possivel em tempo util, todas as minhas dividas; iii) jamais fazer alarde do que, social, material, financeira, ou de qualquer outro modo, alguem me possa dever - esta, em particular, e' para mim uma regra de ouro que pratico como se de "sigilo bancario" se tratasse e que sempre pensei fosse tambem seguida por "todo o mundo"... ledo engano o meu, como me tenho vindo a dar conta recentemente atraves, entre outras, de mencoes por parte de gente oportunista com quem nunca privei e a quem muito menos devo alguma coisa, a "cuspir nos pratos em que debiquei"!
Uma das facetas mais perturbadoras da vida de dificuldades e carencias de toda a ordem que se vivem na sociedade angolana actual e' que ja' nao ha' principios, valores ou regras de conduta nao subvertidos: tudo e' manipulavel, e em particular a amizade e a familia... e em particular as vias de acesso a 'ascensao social', ao dinheiro e aos bens materiais de toda a ordem! E a manipulacao e' feita tanto pelos orgaos e titulares do poder publico aos mais diversos niveis, quanto pelos amigos e familiares nas mais diversas circunstancias.
E os manipulados sao potencialmente todos os membros da sociedade, mas muito especialmente os mais vulneraveis por uma razao ou por outra, que se veem assim praticamente impossibilitados de viver a sua vida com a estabilidade, dignidade e integridade por que sempre pugnaram e pelas quais sempre se pautaram. Esses sao geralmente, como aqui nota Julianne Malveaux (numa referencia a sociedade americana que pode perfeitamente ser aplicada a sociedade angolana - e aqui faco uma especial chamada de atencao para os preconceitos e estereotipos por detras do facto, por vezes revoltante na forma como se manifesta, de perante uma relacao familiar ou de amizade entre pessoas de cores diferentes, a tendencia ser invariavelmente para o outsider assumir a priori que "quem deve" e' invitavelmente a de "cor mais escura"...), para quem a questao real e' economica, sobre quem tem e quem nao tem, com questoes de raca (e eu acrescentaria 'e de etnia') sempre presentes no background, "aqueles cujas vozes raramente sao ouvidas: 'pais (maes) sozinho(a)s em casa' (e.g. maes solteiras), 'criancas descartaveis' (e.g. por pais irresponsaveis e seus "amigos e familiares") e quem quer que seja cuja cor, status economico ou genero os mantenha sem qualquer poder na sociedade."
Dai a minha devocao a causa do pleno funcionamento e transparencia das instituicoes publicas (a que me refiro, por exemplo, aqui), como forma de libertar os cidadaos (e em particular as cidadas; impondo-se-me aqui uma referencia muito especial a um grupo especialmente vulneravel em qualquer sociedade: os orfaos e viuvas) de relacoes de dependencia ao nivel particular que, talvez mais do que quaisquer outras (sem contudo descurar o papel que certa imprensa tem jogado no meu caso especifico...), tendem verdadeiramente a degradar a condicao humana e a corroer a amizade, a familia e, consequentemente, a sociedade.
E sobre este tema fico-me por aqui, por enquanto, nao deixando porem de reiterar uma afirmacao que ja' antes aqui fiz:
(...) Nao sao, portanto, capazes de perceber que haja gente por esse mundo fora, que no periodo pos-independencia, nunca contou, ou nao contou durante grande parte das suas vidas, com o estado (e, portanto, com o partido da "situacao") a que eles, salvo rarissimas excepcoes, devem praticamente tudo o que sao e teem em Angola e no mundo. E muito menos que gente da minha “geracao R”, como me, myself and I (que, apesar de “menor”, “insignificante” e “rejeitada”, se orgulha de nunca ter "lambido botas" de ninguem e muito menos de alguma vez ter “debicado” em pratos de quem quer que seja e de, quanto muito, ter visto “muito boa gente” debicar no seu prato e depois ingrata, descarada, arrogante e despudoradamete cuspir nele “de cima”, apenas para depois se arrependerem amargamente…), possa “pensar pela sua propria cabeca” e ter a dignidade de expressar imparcialmente opinioes, ou posicionar-se politica e culturalmente, segundo logicas absolutamente nao partidarias ou estatais e que, quando fala em "democracia", “sociedade civil”, “direitos humanos” ou “cidadania”, e’ exactamente disso, e apenas disso, que esta’ a falar!
Post (posterior) relacionado: "A Minha Amiga"
ADENDA
Ha’ certas experiencias da minha vida sobre as quais nunca confidenciei sequer com os meus familiares e amigos mais proximos e que muito menos alguma vez me ocorreu abordar num espaco como este, ainda que a titulo informal e privado, como e’ o caso. Mas o certo e’ que, e esta e’ tambem uma das ‘descobertas’ que me veem sendo reveladas pela experiencia adquirida com este blog, eu tenho sido frequentemente vitima do meu proprio silencio sobre certas questoes. E’ o caso do episodio que a seguir relato.
[Aqui]
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