Thursday, 24 May 2012

Sobre o Movimento Estudantil (V)



A democratização das escolas não era a única preocupação. O consumo de drogas colocava‐se na sociedade angolana, como chamou a atenção o Movimento Jovem (MJ), de Nova Lisboa. O MJ pediu ao governo no dia 17 de Agosto de 1974 que abolisse a lei da droga em vigor, por condenar severamente os seus utilizadores. Nesse documento, o presidente António de Oliveira Porto advogava “sanatórios especializados” para os “irrecuperáveis” viverem “livremente”. A proposta levantou polémica. Dias depois o MJ esclarecia que condenava “o uso e a venda” de droga, mas a repressão devia ser dirigida aos vendedores. O MJ achava que a droga iria afectar  “um índice assustador de viciados” e daí a necessidade de cuidados de saúde especializados, para os irrecuperáveis receberem a droga “doseada” por médicos.
[a província de Angola, 24 de Agosto de 1974, p. 5.]




 A cannabis, que crescia espontaneamente, era fumada por alguns africanos e por alguns estudantes. A reitora do Liceu Feminino foi um dia surpreendida com a presença de agentes da Polícia Judiciária. “(…) Apareceram para nos multar, dizendo que tínhamos lá cannabis. Nenhuma das professoras da direcção sabia o que era (…). Havia bastantes nos canteiros do liceu. Claro, fomos obrigadas a arranca‐las. Isto passou‐se em 1970. A Polícia Judiciária fez‐nos uma prelecção. Explicaram‐nos como detectar pelas pupilas, se uma jovem se drogava. Esse foi um problema angolano. (…) Havia drogadas no liceu, casos em que tivemos de intervir, chamar os pais. Não eram muitos, mas havia. Muitos jovens deram umas passas, mas poucos ficaram viciados (…)”
[Entrevista à Reitora do Liceu Feminino, Darcília Salgado Zenha M. Correia]

COMENTARIO: Desconhecia esse longo historial de cultivo, uso e abuso de drogas no ‘meu liceu’ e entre a populacao estudantil em geral, em Luanda e nao so’.
Mas, obviamente, nao me passou despercebido (e disso dou conta aqui) o facto de a Pro-AEESL ter ficado associada ao consumo de drogas, mesmo se muitos estudantes, como eu, nunca sequer as tenham visto antes ou durante o Movimento Estudantil.
Seria apenas alguns anos mais tarde que me viria a dar conta do uso mais ou menos generalizado de drogas em Luanda, sobretudo em alguns circulos de artistas e intelectuais, tendo tido, infelizmente, que lidar com dois deles (este e este) com os resultados que “se conhecem”… Consegui, no entanto, resistir a tentacao (ou, dito de outro modo, consegui gerir os apelos) de mergulhar no mundo das drogas.




Lúcio Lara, que na juventude iniciou a sua formação política nas associações de estudantes metropolitanos, contou décadas depois: “(…) quando a delegação que eu chefiei chegou (…) encontrámos uma juventude agitada pra burro, como nós dizemos, uma juventude dinâmica, altamente agitada e muito mais marxista do que nós pensávamos, porque não tínhamos ideia semelhante e nem sequer falávamos muito no marxismo, embora por princípio de comportamento muitos de nós fossemos marxistas, mas não falávamos nisso nessa altura, mas quando chegámos a Luanda até albaneses eu vim encontrar (…) os grupos extremistas eram tantos e tão diversos, que até albaneses! (…) o MPLA passava por um movimento moderado no meio dessa juventude, alguns dos quais foram elementos que compuseram o que se chamou depois o fraccionismo (…)”
 [Drumond Jaime e Helder Barber, Angola: Depoimentos para a História Recente, edição dos autores, Luanda, 1999, entrevista a Lúcio Lara pp. 52‐53. O “fraccionismo” eclodiu em Angola com os acontecimentos de 27 de Maio de 1977]




COMENTARIO: Disso nao tenho qualquer duvida! Quanto mais nao seja porque, desde aquela altura, continuo a ser alvo dos golpes de (aka)martelo e das cicatrizes no cerebro desferidas pelos ditos “albaneses”... "unicas e verdadeiras intelectuais"... "vanguardistas" e outros “iluminados”!... 

Por outro lado, essas afirmacoes de Lucio Lara talvez permitam perceber melhor o que aqui referi:

(...)

"- Eu tinha 16 anos quando se deu o 27 de Maio. Na altura, era estudante e trabalhava part-time no MPLA, no DOM na Vila Alice e depois no DORGAN no ‘Kremlin’, tendo algum tempo depois partido para esta 'aventura'. Nunca tive, portanto, qualquer “envolvimento”, directo ou indirecto, nos acontecimentos que rodearam aquela data fatidica, antes ou depois dela – certamente nao fui eu quem matou Saidi Mingas - NUNCA MATEI NINGUEM!!!...




E, ja' agora, vem a proposito esta memoria: nunca tive qualquer propensao para ser professora primaria e muito menos teorica do marxismo - mesmo porque isso pode ter o condao de atrair ameacas de morte, quando nao morte mesmo! - mas, no DOM/DORGAN eu fazia parte de um grupo de estudo do Marxismo-Leninismo, em que eu era a mais nova por varios anos em relacao a todos os outros participantes e que era orientado pelo Kota Lara, e como infelizmente a memoria dele ja' nao o pode ajudar nesse sentido, talvez algum dos outros participantes possa confirmar que ocasioes houve em que ele me deixava responder a questoes que lhe eram colocadas e no fim so' concordava, modestamente, com a cabeca em sinal de aprovacao do que eu acabara de explicar... mas nao fui por isso "promovida a teorica do marxismo", nem "perdida em 1977"!... Embora alguns ecos daquelas "aulas" possam, sem muito esforco, ser detectados aqui, aqui, aqui... E, quanto "ao resto", especialmente as feridas ainda por sarar, a minha memoria continua a servir-me suficientemente bem... Gracas a Deus!"

 (...)

Devo, no entanto, referir - porque algumas passagens do livro a isso podem induzir -, que o meu trabalho no DOM/DORGAN nao tinha nenhuma relacao com o Movimento Estudantil (mesmo porque este ja' estava, como aqui referi, praticamente auto-extinto) e, embora (como aqui e aqui mencionei) tivesse uma vertente ocasionalmente ligada as estruturas organizativas juvenis nas provincias do pais, nem mesmo ja' com a JMPLA.



A democratização das escolas não era a única preocupação. O consumo de drogas colocava‐se na sociedade angolana, como chamou a atenção o Movimento Jovem (MJ), de Nova Lisboa. O MJ pediu ao governo no dia 17 de Agosto de 1974 que abolisse a lei da droga em vigor, por condenar severamente os seus utilizadores. Nesse documento, o presidente António de Oliveira Porto advogava “sanatórios especializados” para os “irrecuperáveis” viverem “livremente”. A proposta levantou polémica. Dias depois o MJ esclarecia que condenava “o uso e a venda” de droga, mas a repressão devia ser dirigida aos vendedores. O MJ achava que a droga iria afectar  “um índice assustador de viciados” e daí a necessidade de cuidados de saúde especializados, para os irrecuperáveis receberem a droga “doseada” por médicos.
[a província de Angola, 24 de Agosto de 1974, p. 5.]




 A cannabis, que crescia espontaneamente, era fumada por alguns africanos e por alguns estudantes. A reitora do Liceu Feminino foi um dia surpreendida com a presença de agentes da Polícia Judiciária. “(…) Apareceram para nos multar, dizendo que tínhamos lá cannabis. Nenhuma das professoras da direcção sabia o que era (…). Havia bastantes nos canteiros do liceu. Claro, fomos obrigadas a arranca‐las. Isto passou‐se em 1970. A Polícia Judiciária fez‐nos uma prelecção. Explicaram‐nos como detectar pelas pupilas, se uma jovem se drogava. Esse foi um problema angolano. (…) Havia drogadas no liceu, casos em que tivemos de intervir, chamar os pais. Não eram muitos, mas havia. Muitos jovens deram umas passas, mas poucos ficaram viciados (…)”
[Entrevista à Reitora do Liceu Feminino, Darcília Salgado Zenha M. Correia]

COMENTARIO: Desconhecia esse longo historial de cultivo, uso e abuso de drogas no ‘meu liceu’ e entre a populacao estudantil em geral, em Luanda e nao so’.
Mas, obviamente, nao me passou despercebido (e disso dou conta aqui) o facto de a Pro-AEESL ter ficado associada ao consumo de drogas, mesmo se muitos estudantes, como eu, nunca sequer as tenham visto antes ou durante o Movimento Estudantil.
Seria apenas alguns anos mais tarde que me viria a dar conta do uso mais ou menos generalizado de drogas em Luanda, sobretudo em alguns circulos de artistas e intelectuais, tendo tido, infelizmente, que lidar com dois deles (este e este) com os resultados que “se conhecem”… Consegui, no entanto, resistir a tentacao (ou, dito de outro modo, consegui gerir os apelos) de mergulhar no mundo das drogas.




Lúcio Lara, que na juventude iniciou a sua formação política nas associações de estudantes metropolitanos, contou décadas depois: “(…) quando a delegação que eu chefiei chegou (…) encontrámos uma juventude agitada pra burro, como nós dizemos, uma juventude dinâmica, altamente agitada e muito mais marxista do que nós pensávamos, porque não tínhamos ideia semelhante e nem sequer falávamos muito no marxismo, embora por princípio de comportamento muitos de nós fossemos marxistas, mas não falávamos nisso nessa altura, mas quando chegámos a Luanda até albaneses eu vim encontrar (…) os grupos extremistas eram tantos e tão diversos, que até albaneses! (…) o MPLA passava por um movimento moderado no meio dessa juventude, alguns dos quais foram elementos que compuseram o que se chamou depois o fraccionismo (…)”
 [Drumond Jaime e Helder Barber, Angola: Depoimentos para a História Recente, edição dos autores, Luanda, 1999, entrevista a Lúcio Lara pp. 52‐53. O “fraccionismo” eclodiu em Angola com os acontecimentos de 27 de Maio de 1977]




COMENTARIO: Disso nao tenho qualquer duvida! Quanto mais nao seja porque, desde aquela altura, continuo a ser alvo dos golpes de (aka)martelo e das cicatrizes no cerebro desferidas pelos ditos “albaneses”... "unicas e verdadeiras intelectuais"... "vanguardistas" e outros “iluminados”!... 

Por outro lado, essas afirmacoes de Lucio Lara talvez permitam perceber melhor o que aqui referi:

(...)

"- Eu tinha 16 anos quando se deu o 27 de Maio. Na altura, era estudante e trabalhava part-time no MPLA, no DOM na Vila Alice e depois no DORGAN no ‘Kremlin’, tendo algum tempo depois partido para esta 'aventura'. Nunca tive, portanto, qualquer “envolvimento”, directo ou indirecto, nos acontecimentos que rodearam aquela data fatidica, antes ou depois dela – certamente nao fui eu quem matou Saidi Mingas - NUNCA MATEI NINGUEM!!!...




E, ja' agora, vem a proposito esta memoria: nunca tive qualquer propensao para ser professora primaria e muito menos teorica do marxismo - mesmo porque isso pode ter o condao de atrair ameacas de morte, quando nao morte mesmo! - mas, no DOM/DORGAN eu fazia parte de um grupo de estudo do Marxismo-Leninismo, em que eu era a mais nova por varios anos em relacao a todos os outros participantes e que era orientado pelo Kota Lara, e como infelizmente a memoria dele ja' nao o pode ajudar nesse sentido, talvez algum dos outros participantes possa confirmar que ocasioes houve em que ele me deixava responder a questoes que lhe eram colocadas e no fim so' concordava, modestamente, com a cabeca em sinal de aprovacao do que eu acabara de explicar... mas nao fui por isso "promovida a teorica do marxismo", nem "perdida em 1977"!... Embora alguns ecos daquelas "aulas" possam, sem muito esforco, ser detectados aqui, aqui, aqui... E, quanto "ao resto", especialmente as feridas ainda por sarar, a minha memoria continua a servir-me suficientemente bem... Gracas a Deus!"

 (...)

Devo, no entanto, referir - porque algumas passagens do livro a isso podem induzir -, que o meu trabalho no DOM/DORGAN nao tinha nenhuma relacao com o Movimento Estudantil (mesmo porque este ja' estava, como aqui referi, praticamente auto-extinto) e, embora (como aqui e aqui mencionei) tivesse uma vertente ocasionalmente ligada as estruturas organizativas juvenis nas provincias do pais, nem mesmo ja' com a JMPLA.

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