Wednesday, 24 January 2007

CRÓNICA DE UMA DECISÃO DOCE E AMARGA (II)

Por José Cardoso Jr.

Dezembro, 2006

O fim do ano é, também, um tempo excelente para reflectir sobre aquilo que é parte de nós e que contribui para a paz e felicidade: as relações humanas. Com o aumento das dificuldades sociais, aumenta o desrespeito por coisas que eram sagradas entre nós. Aumenta a prostituição, aumenta o descaso para com os pobres, aumentam as mortes desnecessárias, aumentam as casas de lata, e, com tudo isso, aumenta a desconfiança e o descaso para com aqueles que outrora eram os pilares das comunidades, os governantes, os vizinhos, e, em muitos casos, os familiares. Mas tudo isso tende a diminuir paulatinamente. A criminalidade diminui quando a polícia se organiza humana e tecnologicamente; as mazelas sociais diminuem quando há um aumento da oferta de trabalho, quando a indústria, agricultura, saúde e educação são tratadas como sectores essências e recebem o devido apoio para seu desenvolvimento; a desordem social tende a diminuir à medida que o sistema judicial se torna independente, a oportunidade para educação se estenda a todo território nacional e as condições de vida do país permitem que muitos cidadãos regressem às províncias do interior e aos e seus municípios. A reconstrução da Europa levou 7 a 10 anos dependendo da referência que se usa, a do Japão levou quase uma década (meados dos anos 50), a de Angola levará mais tempo, porque o conflito angolano foi em muito mais devastador. Não temos o nível de desenvolvimento que a Europa e o Japão já tinham na altura. Além disso, somos africanos. Estes normalmente não recebem tão prontamente o apoio necessário para os seus programas de desenvolvimento. Mas lá se há-de chegar. É nisso que acredito neste Dezembro frio de Londres. O fim de ano é o tempo em que as pessoas se sentam, reavaliam as suas prioridades e, às vezes, mudam o rumo das suas vidas. Alguns deixam de fumar, outros passam a ir ao ginásio. Eu decidi voltar a Angola por algum tempo, na primeira oportunidade. Mas esta é uma decisão de grande impacto na minha vida. Depois de tantos anos, voltar não é fácil. A vida tornou-se confortável. Os pequenos já não são bebés. O emprego é estável e nele sinto-me em casa. A esposa não parece tão entusiasmada. Ela tem carreira e aspirações próprias. Os miúdos perguntam por isto e aquilo e a resposta nem sempre é a mais convincente. Mas somos angolanos vivendo em terra emprestada e quando é este o caso, o corpo pode estar satisfeito, mas a alma chora. Quando se olha para os vencimentos praticados no mercado de trabalho, vacila-se pois com estes é impossível viver. Mas continua a esperança de que algo se pode arranjar. Assim é o angolano, que anda com a esperança no bolso.
Por José Cardoso Jr.

Dezembro, 2006

O fim do ano é, também, um tempo excelente para reflectir sobre aquilo que é parte de nós e que contribui para a paz e felicidade: as relações humanas. Com o aumento das dificuldades sociais, aumenta o desrespeito por coisas que eram sagradas entre nós. Aumenta a prostituição, aumenta o descaso para com os pobres, aumentam as mortes desnecessárias, aumentam as casas de lata, e, com tudo isso, aumenta a desconfiança e o descaso para com aqueles que outrora eram os pilares das comunidades, os governantes, os vizinhos, e, em muitos casos, os familiares. Mas tudo isso tende a diminuir paulatinamente. A criminalidade diminui quando a polícia se organiza humana e tecnologicamente; as mazelas sociais diminuem quando há um aumento da oferta de trabalho, quando a indústria, agricultura, saúde e educação são tratadas como sectores essências e recebem o devido apoio para seu desenvolvimento; a desordem social tende a diminuir à medida que o sistema judicial se torna independente, a oportunidade para educação se estenda a todo território nacional e as condições de vida do país permitem que muitos cidadãos regressem às províncias do interior e aos e seus municípios. A reconstrução da Europa levou 7 a 10 anos dependendo da referência que se usa, a do Japão levou quase uma década (meados dos anos 50), a de Angola levará mais tempo, porque o conflito angolano foi em muito mais devastador. Não temos o nível de desenvolvimento que a Europa e o Japão já tinham na altura. Além disso, somos africanos. Estes normalmente não recebem tão prontamente o apoio necessário para os seus programas de desenvolvimento. Mas lá se há-de chegar. É nisso que acredito neste Dezembro frio de Londres. O fim de ano é o tempo em que as pessoas se sentam, reavaliam as suas prioridades e, às vezes, mudam o rumo das suas vidas. Alguns deixam de fumar, outros passam a ir ao ginásio. Eu decidi voltar a Angola por algum tempo, na primeira oportunidade. Mas esta é uma decisão de grande impacto na minha vida. Depois de tantos anos, voltar não é fácil. A vida tornou-se confortável. Os pequenos já não são bebés. O emprego é estável e nele sinto-me em casa. A esposa não parece tão entusiasmada. Ela tem carreira e aspirações próprias. Os miúdos perguntam por isto e aquilo e a resposta nem sempre é a mais convincente. Mas somos angolanos vivendo em terra emprestada e quando é este o caso, o corpo pode estar satisfeito, mas a alma chora. Quando se olha para os vencimentos praticados no mercado de trabalho, vacila-se pois com estes é impossível viver. Mas continua a esperança de que algo se pode arranjar. Assim é o angolano, que anda com a esperança no bolso.

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