Monday 6 December 2010

Como veias finas na terra [Updated]




Novo livro de uma das poetisas mais reconhecidas de Angola. Os referentes temáticos são africanos, mas são tratados de uma forma universal e intimista, através de uma escrita delicada, depurada, imagética.


Assim publicitam os seus editores este novo livro de Ana Paula Tavares, a ser lancado amanha em Lisboa.

Trata-se de mais uma obra de uma Mulher serena, culta e madura, com personalidade e identidade proprias bem vincadas, que, recentemente, depois de longos anos sem nos vermos e sem termos tido qualquer contacto, por razoes alheias a vontade de ambas, muito profunda e agradavelmente me surpreendeu com uma mensagem por e-mail, a que se seguiu (como aqui ha' tempos referi de passagem) o retomar de uma Amizade que, malgre' tout, nunca se perdeu pelas vias finas na terra.

Aqui deixo, em sua homenagem e com a devida venia, um registo de algumas das palavras que me dirigiu nessa correspondencia:




Querida Ana,
Há muito que queria escrever-te, lembrar uma amizade antiga e
saudar-te pelo magnifico blog. Bem hajas por tão apurado trabalho e um abraço da
Ana paula tavares.
(...)
Vida de muitas voltas que terás que escrever
para os nossos filhos e para memória futura. a nossa terra tem uma tal
vitalidade que as coisas do Antigamente na vida tendem a esquecer-se depressa.
(...)
Mas acho que não andas longe da história e a tua formação será
contributo de primeira água.
(...)
Quanto a ti uma economista que gosta
e sabe a história é mais importante que o historiador preso nos seus papéis.
Acredita. Quanto à escrita entendo as tuas preocupações e sei que vai chegar o
momento. Ser contra a corrente é ser escritor a sério, é saber quando se fala e
quando se reune no silêncio a ciência certa da escrita. Um abraço da Ana paula



Enfim, como diria o Mais Velho Raul David, e eu subscreveria, "uma Mulher muito educada e que sabe estar"!


Bem Hajas, Ana Paula Tavares, porque, a seres "unica", es de facto a unica Mulher que respeito o suficiente para nao deixar de estimar e desejar todo o sucesso do mundo, mesmo quando, ocasionalmente, a natural divergencia de opinioes sobre questoes pontuais entre duas pessoas naturalmente diferentes e com trajectorias diferentes, mas com um "chao comum", nos parecem distanciar...
Ou quando quem nunca connosco partilhou esse "chao comum", por longinquo que agora possa parecer, nos tenta a todo o custo distanciar e "enclausurar-te" em seus, ainda que apenas psicopaticamente imaginarios, "circulos restritos", como aconteceu quando (... numa "estorieta infantil" que hoje, infelizmente, mais uma vez se repete...) me vi compelida a tecer este comentario (que sei que sabes bem que, em circunstancias normais, nao faria - certamente nao da forma, ou no local, em que o fiz...), muito anterior a correspondencia que hoje aqui decidi "ecoar" a bem, como referes, de uma memoria futura para os nossos filhos que seja, acima de tudo e de todos, verdadeira e saudavel.


Um abraco (sempre) amigo da (outra) Ana Paula.


[Mais detalhes sobre o lancamento do livro aqui]




ADENDA


No seguimento da minha resposta ao "Poeta Amigo", abaixo, decidi tecer aqui as seguintes observacoes adicionais:


Devo dizer que sempre aceitei TODO o tipo de criticas razoaveis ao meu trabalho, embora em alguns casos mais "duvidosos", como dizem os ingleses, “with a pinch of salt”... Isso porque, em primeiro lugar, nunca fui “auto-convencida” em relacao a minha poesia ao ponto de ignorar, ou mesmo deixar de solicitar, a opiniao de outros sobre ela e, em segundo lugar, porque, pelo menos ate’ muito recentemente, sempre me permiti ser “ingenua” o suficiente para acreditar que alguem que se de ao trabalho de ditar “sentencas lapidares” sobre algo sempre tao pessoal e delicado como a poesia, teria sensibilidade e sagacidade suficientes para nao se deixar cair no flagrante delito do ataque pessoal!

Mas a verdade e’ que, se a minha entrada na blogosfera teve algum merito, ele foi o de me abrir completa e definitivamente os olhos para o quao baixo certas pessoas sao capazes de descer, frequentemente movidas apenas pelo despeito e o ressaibo, ou pela inveja, o ciume e o odio, quando nao apenas pelo racismo puro e duro!... Ou, tao so’, para se “vingarem e ressarcirem” da sua incapacidade de defenderem coerente, congruente, racional e inteligentemente as 'suas ideias e posicionamentos' em debates abertos comigo sobre outras questoes (o tal de "convem sabermos sempre o que nos espera"!) ... E so’ tenho pena que muito desse “trash” acabe por passar por “critica construtiva e honesta”... Muita pena mesmo!

Mas, chegada a este estagio da minha vida, ja’ nao e’ por mim, nem pela minha poesia, que sinto pena, mas apenas por quem produz tal “trash” e por quem eventualmente o consuma... Ja’ para nao mencionar as outras poetas angolanas (...continuo a preferir “ignorar” aqui, em nome do conceito de “genero”, o masculino/feminino que continua a ter outra/os a tratar as mulheres que escrevem poesia como “poetisas”...) aparentemente “esquecidas” no meio de tudo isso.

Diria apenas que, quaisquer que sejam as “driving forces” por detras dos nossos respectivos processos criativos e por diversos que sejam os nossos “outputs” literarios, tanto qualitativa como quantitativamente, e quaisquer que tenham sido as motivacoes de quem decidiu publicar os nossos primeiros livros simultaneamente [*], creio ser certo e seguro que nem eu, nem a Paula Tavares, decidimos comecar (ou continuar, ou nao) a escrever para emular (certamente nao para “hostilizar” ou “eclipsar”) a outra e muito menos para que a nossa poesia fosse usada como "arma de arremesso" por outra(o)s em guerras intestinas, quentes ou frias, com motivacoes racicas que nada teem a ver com poesia (algo que, de resto, deixei aqui bem claro!) ... e mesmo que eu tambem tivesse publicado tanto quanto, ou mesmo mais do que ela, haveria sempre “gostos e desgostos para todos os gostos” em relacao a poesia de uma e de outra... e isto pressupondo um ambiente literario, cultural, social e politico circundante “sadio, calmo e tranquilo” e nao aquele que constitui o nosso “chao comum”, como aqui se pode constatar!

Anyway, creio nao valer a pena dizer muito mais sobre tudo isso, excepto talvez uma breve nota sobre a “credibilidade da critica literaria”: nos extractos que acima tomei a liberdade de transcrever, a Paula Tavares fala em “ciencia certa da escrita” – um conceito certamente nao pacifico (!), mas que aceito provisoriamente.

Pois bem, em toda a ciencia, o criterio de validacao de qualquer “veredicto” e’ estabelecido pela objectividade e racionalidade dos seus fundamentos, os quais nao podem, em nenhuma circunstancia, ser baseados apenas em criterios de subjectividade pessoal (como a afectividade ou a amizade - e, a este proposito, recordo uma conhecida doutorada em letras/ critica literaria (?) que, numa cronica publicada no SA, se declarou abertamente suspeita por, juntamente com outra proeminente sua congenere brasileira, ser "amiga da Paula Tavares"...), preferencias esteticas individuais (como a cor da pele), ou conviccoes politico-ideologicas ou religiosas e muito menos em comparacoes e ilacoes aleatorias e arbitrarias completamente abstraidas do contexto especifico e das condicoes concretas em que a "ciencia" (neste caso a "escrita") se produz, condicoes essas em que se incluem factores historicos, sociais, culturais, psicologicos e etico-morais, entre outros (como os, mais obvios, "marcadores (etno)linguisticos e/ou geograficos") ...

Assim, o estabelecimento de qualquer veredicto sobre o que, ou quem, e’ “unico”, pressupoe a existencia, ou o estabelecimento, de um padrao, ou canone, igualmente “unico”, extremamente dificil (senao impossivel!) de estabelecer “cientificamente” em literatura e muito mais ainda em poesia... - uma questao, alias, amplamente evidenciada por este kibeto.

Mas, talvez mais determinante dalguns desses "veredictos" (e aqui refiro-me apenas aqueles que podem com propriedade reclamar alguma “objectividade e isencao” e, consequentemente, alguma "credibilidade"...) e’ que, como aqui recentemente observei, o “mundo lusofono” e’, sempre foi desde Camoes, um “mundo de poetas” (veja-se, por exemplo, o sucesso que fazem os blogs de poesia na lusosfera...), em que a ciencia sempre foi “subalternizada” relativamente a literatura, e em particular a poesia, e a pratica simultanea de ambas vista como "antagonica" (...mas, veja-se a este proposito o caso de Fernando Pessoa...), sendo, em particular, disciplinas/profissoes como a economia vistas geralmente como "frias e calculistas" ou "insensiveis e a-sociais" (algo reflectido de algum modo, embora nao explicitamente, aqui e aqui) ... Mas, sobre isso, lembro-me de, ha’ ja’ varios anos, ainda em Lisboa, ter concedido uma entrevista a uma jornalista/escritora brasileira em que lhe dizia algo como isto: “Os poetas (ou pelo menos alguns) teem o sonho de mudar o mundo para melhor, os economistas (ou pelo menos alguns) tambem (e o espirito do velho Marx por ai ainda paira para o provar) ... apenas com uma diferenca: estes podem faze-lo por outros (quica mais eficazes...) meios e metodos!”

E isso sem qualquer demerito para os poetas em geral, e menos ainda para a regularidade, a proficuidade e a qualidade da producao poetica da Paula Tavares – sobre a qual, devo aqui enfatizar, nunca teci qualquer comentario menos abonatorio: a referencia a “divergencias de opiniao” que faco acima prende-se a algumas questoes pontuais emanentes de algumas das suas cronicas - duas para ser mais precisa - sobre as quais comentei noutros posts aqui neste blog. O unico comentario um tanto “mais problematico” que fiz, e foi apenas a um dos seus poemas e, acrescente-se, “forcadamente”, foi ao seu uso da “sua mascara da Pwo”, mas o contexto em que o fiz revela claramente que nao o fiz por razoes estritamente poeticas, mas por razoes mais amplamente historicas e socio-culturais - as quais podem ser identificadas aqui...

Tendo dito tudo isso, resta-me apenas pedir, mais uma vez, desculpas a Ana Paula Tavares por ter assim “violado a nossa correspondencia”, que preferiria ter mantido, como deveria, privada – mas... como soi dizer-se, “para grandes males, grandes remedios!”





[*] Torna-se meu dever registar aqui que ouvi diversas vezes, por diversas pessoas e de diversas formas, que "eu so' fui 'promovida' para a UEA (... o tal "porque promover uns e nao outros?"...) e o meu livro publicado simultaneamente, numa especie de "accao afirmativa", para 'cobrir' o lancamento da Paula Tavares pela mesma UEA e 'precaver' as previsiveis acusacoes de racismo com que na altura aquela instituicao vivia cercada... Certo ou errado, o facto e' que, infelizmente, madames como esta e, mais recentemente, esta e estas, apenas teem corroborado essa versao... Mas, tambem sera' de notar que a mensagem de um dos postais, incluido aqui, que recebi de quem foi responsavel por tal lancamento simultaneo, Luandino Vieira, talvez possa sugerir algo diferente...


Uma outra nota digna de registo e' a seguinte: havia uma pessoa amiga a quem eu por vezes dava a ler os meus poemas e a reaccao dela era, quase sempre, zombar deles... ate' que no dia em que o Luandino me deu a ler os pareceres do painel que ele tinha consultado para avaliacao eu lhe contei do que tinha escrito Ndunduma ("... depois de Alda Lara, eis que surge Ana Santana...") e a reaccao imediata daquela pessoa foi: "nao... depois de Alda Lara e' a Paula Tavares"! E isso sem que ela conhecesse bem pessoalmente a Paula Tavares ou a sua poesia e muito antes de os nossos livros terem sido publicados...





ADENDA 2

Veem certamente a proposito as seguintes palavras de Paula Tavares, de que apenas tive conhecimento depois da publicacao deste post:

P- É normalmente apontada como a referência da poesia contemporânea angolana no feminino. O que significa isso, na verdade?

R - Não, não é verdade. Isso seria de uma injustiça extrema para com Ana de Santana, Liza Castel e Maria Alexandre Dáskalos, para só citar três nomes de criadoras intensas, originais no universo da poesia angolana. O número de títulos publicados não invalida outras contribuições de grande qualidade. Procuro um lugar no universo da poesia angolana, porque é de Angola a minha fala. Não sou muito dada a concursos, lugares cimeiros, comendas.

[Aqui]







Novo livro de uma das poetisas mais reconhecidas de Angola. Os referentes temáticos são africanos, mas são tratados de uma forma universal e intimista, através de uma escrita delicada, depurada, imagética.


Assim publicitam os seus editores este novo livro de Ana Paula Tavares, a ser lancado amanha em Lisboa.

Trata-se de mais uma obra de uma Mulher serena, culta e madura, com personalidade e identidade proprias bem vincadas, que, recentemente, depois de longos anos sem nos vermos e sem termos tido qualquer contacto, por razoes alheias a vontade de ambas, muito profunda e agradavelmente me surpreendeu com uma mensagem por e-mail, a que se seguiu (como aqui ha' tempos referi de passagem) o retomar de uma Amizade que, malgre' tout, nunca se perdeu pelas vias finas na terra.

Aqui deixo, em sua homenagem e com a devida venia, um registo de algumas das palavras que me dirigiu nessa correspondencia:




Querida Ana,
Há muito que queria escrever-te, lembrar uma amizade antiga e
saudar-te pelo magnifico blog. Bem hajas por tão apurado trabalho e um abraço da
Ana paula tavares.
(...)
Vida de muitas voltas que terás que escrever
para os nossos filhos e para memória futura. a nossa terra tem uma tal
vitalidade que as coisas do Antigamente na vida tendem a esquecer-se depressa.
(...)
Mas acho que não andas longe da história e a tua formação será
contributo de primeira água.
(...)
Quanto a ti uma economista que gosta
e sabe a história é mais importante que o historiador preso nos seus papéis.
Acredita. Quanto à escrita entendo as tuas preocupações e sei que vai chegar o
momento. Ser contra a corrente é ser escritor a sério, é saber quando se fala e
quando se reune no silêncio a ciência certa da escrita. Um abraço da Ana paula



Enfim, como diria o Mais Velho Raul David, e eu subscreveria, "uma Mulher muito educada e que sabe estar"!


Bem Hajas, Ana Paula Tavares, porque, a seres "unica", es de facto a unica Mulher que respeito o suficiente para nao deixar de estimar e desejar todo o sucesso do mundo, mesmo quando, ocasionalmente, a natural divergencia de opinioes sobre questoes pontuais entre duas pessoas naturalmente diferentes e com trajectorias diferentes, mas com um "chao comum", nos parecem distanciar...
Ou quando quem nunca connosco partilhou esse "chao comum", por longinquo que agora possa parecer, nos tenta a todo o custo distanciar e "enclausurar-te" em seus, ainda que apenas psicopaticamente imaginarios, "circulos restritos", como aconteceu quando (... numa "estorieta infantil" que hoje, infelizmente, mais uma vez se repete...) me vi compelida a tecer este comentario (que sei que sabes bem que, em circunstancias normais, nao faria - certamente nao da forma, ou no local, em que o fiz...), muito anterior a correspondencia que hoje aqui decidi "ecoar" a bem, como referes, de uma memoria futura para os nossos filhos que seja, acima de tudo e de todos, verdadeira e saudavel.


Um abraco (sempre) amigo da (outra) Ana Paula.


[Mais detalhes sobre o lancamento do livro aqui]




ADENDA


No seguimento da minha resposta ao "Poeta Amigo", abaixo, decidi tecer aqui as seguintes observacoes adicionais:


Devo dizer que sempre aceitei TODO o tipo de criticas razoaveis ao meu trabalho, embora em alguns casos mais "duvidosos", como dizem os ingleses, “with a pinch of salt”... Isso porque, em primeiro lugar, nunca fui “auto-convencida” em relacao a minha poesia ao ponto de ignorar, ou mesmo deixar de solicitar, a opiniao de outros sobre ela e, em segundo lugar, porque, pelo menos ate’ muito recentemente, sempre me permiti ser “ingenua” o suficiente para acreditar que alguem que se de ao trabalho de ditar “sentencas lapidares” sobre algo sempre tao pessoal e delicado como a poesia, teria sensibilidade e sagacidade suficientes para nao se deixar cair no flagrante delito do ataque pessoal!

Mas a verdade e’ que, se a minha entrada na blogosfera teve algum merito, ele foi o de me abrir completa e definitivamente os olhos para o quao baixo certas pessoas sao capazes de descer, frequentemente movidas apenas pelo despeito e o ressaibo, ou pela inveja, o ciume e o odio, quando nao apenas pelo racismo puro e duro!... Ou, tao so’, para se “vingarem e ressarcirem” da sua incapacidade de defenderem coerente, congruente, racional e inteligentemente as 'suas ideias e posicionamentos' em debates abertos comigo sobre outras questoes (o tal de "convem sabermos sempre o que nos espera"!) ... E so’ tenho pena que muito desse “trash” acabe por passar por “critica construtiva e honesta”... Muita pena mesmo!

Mas, chegada a este estagio da minha vida, ja’ nao e’ por mim, nem pela minha poesia, que sinto pena, mas apenas por quem produz tal “trash” e por quem eventualmente o consuma... Ja’ para nao mencionar as outras poetas angolanas (...continuo a preferir “ignorar” aqui, em nome do conceito de “genero”, o masculino/feminino que continua a ter outra/os a tratar as mulheres que escrevem poesia como “poetisas”...) aparentemente “esquecidas” no meio de tudo isso.

Diria apenas que, quaisquer que sejam as “driving forces” por detras dos nossos respectivos processos criativos e por diversos que sejam os nossos “outputs” literarios, tanto qualitativa como quantitativamente, e quaisquer que tenham sido as motivacoes de quem decidiu publicar os nossos primeiros livros simultaneamente [*], creio ser certo e seguro que nem eu, nem a Paula Tavares, decidimos comecar (ou continuar, ou nao) a escrever para emular (certamente nao para “hostilizar” ou “eclipsar”) a outra e muito menos para que a nossa poesia fosse usada como "arma de arremesso" por outra(o)s em guerras intestinas, quentes ou frias, com motivacoes racicas que nada teem a ver com poesia (algo que, de resto, deixei aqui bem claro!) ... e mesmo que eu tambem tivesse publicado tanto quanto, ou mesmo mais do que ela, haveria sempre “gostos e desgostos para todos os gostos” em relacao a poesia de uma e de outra... e isto pressupondo um ambiente literario, cultural, social e politico circundante “sadio, calmo e tranquilo” e nao aquele que constitui o nosso “chao comum”, como aqui se pode constatar!

Anyway, creio nao valer a pena dizer muito mais sobre tudo isso, excepto talvez uma breve nota sobre a “credibilidade da critica literaria”: nos extractos que acima tomei a liberdade de transcrever, a Paula Tavares fala em “ciencia certa da escrita” – um conceito certamente nao pacifico (!), mas que aceito provisoriamente.

Pois bem, em toda a ciencia, o criterio de validacao de qualquer “veredicto” e’ estabelecido pela objectividade e racionalidade dos seus fundamentos, os quais nao podem, em nenhuma circunstancia, ser baseados apenas em criterios de subjectividade pessoal (como a afectividade ou a amizade - e, a este proposito, recordo uma conhecida doutorada em letras/ critica literaria (?) que, numa cronica publicada no SA, se declarou abertamente suspeita por, juntamente com outra proeminente sua congenere brasileira, ser "amiga da Paula Tavares"...), preferencias esteticas individuais (como a cor da pele), ou conviccoes politico-ideologicas ou religiosas e muito menos em comparacoes e ilacoes aleatorias e arbitrarias completamente abstraidas do contexto especifico e das condicoes concretas em que a "ciencia" (neste caso a "escrita") se produz, condicoes essas em que se incluem factores historicos, sociais, culturais, psicologicos e etico-morais, entre outros (como os, mais obvios, "marcadores (etno)linguisticos e/ou geograficos") ...

Assim, o estabelecimento de qualquer veredicto sobre o que, ou quem, e’ “unico”, pressupoe a existencia, ou o estabelecimento, de um padrao, ou canone, igualmente “unico”, extremamente dificil (senao impossivel!) de estabelecer “cientificamente” em literatura e muito mais ainda em poesia... - uma questao, alias, amplamente evidenciada por este kibeto.

Mas, talvez mais determinante dalguns desses "veredictos" (e aqui refiro-me apenas aqueles que podem com propriedade reclamar alguma “objectividade e isencao” e, consequentemente, alguma "credibilidade"...) e’ que, como aqui recentemente observei, o “mundo lusofono” e’, sempre foi desde Camoes, um “mundo de poetas” (veja-se, por exemplo, o sucesso que fazem os blogs de poesia na lusosfera...), em que a ciencia sempre foi “subalternizada” relativamente a literatura, e em particular a poesia, e a pratica simultanea de ambas vista como "antagonica" (...mas, veja-se a este proposito o caso de Fernando Pessoa...), sendo, em particular, disciplinas/profissoes como a economia vistas geralmente como "frias e calculistas" ou "insensiveis e a-sociais" (algo reflectido de algum modo, embora nao explicitamente, aqui e aqui) ... Mas, sobre isso, lembro-me de, ha’ ja’ varios anos, ainda em Lisboa, ter concedido uma entrevista a uma jornalista/escritora brasileira em que lhe dizia algo como isto: “Os poetas (ou pelo menos alguns) teem o sonho de mudar o mundo para melhor, os economistas (ou pelo menos alguns) tambem (e o espirito do velho Marx por ai ainda paira para o provar) ... apenas com uma diferenca: estes podem faze-lo por outros (quica mais eficazes...) meios e metodos!”

E isso sem qualquer demerito para os poetas em geral, e menos ainda para a regularidade, a proficuidade e a qualidade da producao poetica da Paula Tavares – sobre a qual, devo aqui enfatizar, nunca teci qualquer comentario menos abonatorio: a referencia a “divergencias de opiniao” que faco acima prende-se a algumas questoes pontuais emanentes de algumas das suas cronicas - duas para ser mais precisa - sobre as quais comentei noutros posts aqui neste blog. O unico comentario um tanto “mais problematico” que fiz, e foi apenas a um dos seus poemas e, acrescente-se, “forcadamente”, foi ao seu uso da “sua mascara da Pwo”, mas o contexto em que o fiz revela claramente que nao o fiz por razoes estritamente poeticas, mas por razoes mais amplamente historicas e socio-culturais - as quais podem ser identificadas aqui...

Tendo dito tudo isso, resta-me apenas pedir, mais uma vez, desculpas a Ana Paula Tavares por ter assim “violado a nossa correspondencia”, que preferiria ter mantido, como deveria, privada – mas... como soi dizer-se, “para grandes males, grandes remedios!”





[*] Torna-se meu dever registar aqui que ouvi diversas vezes, por diversas pessoas e de diversas formas, que "eu so' fui 'promovida' para a UEA (... o tal "porque promover uns e nao outros?"...) e o meu livro publicado simultaneamente, numa especie de "accao afirmativa", para 'cobrir' o lancamento da Paula Tavares pela mesma UEA e 'precaver' as previsiveis acusacoes de racismo com que na altura aquela instituicao vivia cercada... Certo ou errado, o facto e' que, infelizmente, madames como esta e, mais recentemente, esta e estas, apenas teem corroborado essa versao... Mas, tambem sera' de notar que a mensagem de um dos postais, incluido aqui, que recebi de quem foi responsavel por tal lancamento simultaneo, Luandino Vieira, talvez possa sugerir algo diferente...


Uma outra nota digna de registo e' a seguinte: havia uma pessoa amiga a quem eu por vezes dava a ler os meus poemas e a reaccao dela era, quase sempre, zombar deles... ate' que no dia em que o Luandino me deu a ler os pareceres do painel que ele tinha consultado para avaliacao eu lhe contei do que tinha escrito Ndunduma ("... depois de Alda Lara, eis que surge Ana Santana...") e a reaccao imediata daquela pessoa foi: "nao... depois de Alda Lara e' a Paula Tavares"! E isso sem que ela conhecesse bem pessoalmente a Paula Tavares ou a sua poesia e muito antes de os nossos livros terem sido publicados...





ADENDA 2

Veem certamente a proposito as seguintes palavras de Paula Tavares, de que apenas tive conhecimento depois da publicacao deste post:

P- É normalmente apontada como a referência da poesia contemporânea angolana no feminino. O que significa isso, na verdade?

R - Não, não é verdade. Isso seria de uma injustiça extrema para com Ana de Santana, Liza Castel e Maria Alexandre Dáskalos, para só citar três nomes de criadoras intensas, originais no universo da poesia angolana. O número de títulos publicados não invalida outras contribuições de grande qualidade. Procuro um lugar no universo da poesia angolana, porque é de Angola a minha fala. Não sou muito dada a concursos, lugares cimeiros, comendas.

[Aqui]




3 comments:

Poeta Amigo said...

Bem hajam as duas poetisas. Tão bela correspondência espelha a beleza das nossas mulheres angolanas e a profundidade da poesia da nossa terra.
Parabéns á Paula Tavares pela regularidade e a qualidade dos seus livros.
Parabéns á Ana Santana pela coragem de lutar sózinha num mundo difícil e de seguir com dignidade o seu próprio caminho.
Ainda é jovem e a poesia não tem pressa nem idade e muito menos é uma maratona.
Não esqueçamos que há poetas reconhecidos em Angola e no mundo que apenas publicaram um ou dois livros e outros que nunca publicaram nenhum e se limitaram a publicar poemas em jornais e revistas.
Quanto à qualidade, como poeta só aceito veredictos de críticos literários reconhecidos e acima de qualquer suspeita e mesmo assim sempre com muita cautela...
Todos e todas somos poucos para a dignificação da nossa Pátria há muito adiada, portanto parabéns a ambas, porque cada uma com o seu próprio tempo, estilo e cadência muito nos orgulham tanto dentro como fora de Angola!

E que Viva a Amizade!

Koluki said...

Caro Amigo Poeta:

Em nome das duas agradeco as suas amaveis e pertinentes palavras e, em particular, a atencao de as trazer directamente aqui para o blog.

E que viva a Amizade!

Koluki said...

Para que fiquem aqui registados, transcrevo abaixo os meus comentarios a este (http://amateriadotempo.blogspot.com/2007/02/abbora-menina.html) post no blog A Materia do Tempo:


Koluki escreveu...

Caro Denudado,

Cheguei aqui agora, como o faco quase todos os dias, e deparo-me com este poema da amiga Paula Tavares...
Bom, penso que pelo menos algumas pessoas que conhecem o meu blog e tenham recebido e-mails de mim, sabem que eu sou a Ana (de) Santana, pelo que aproveito esta oportunidade para, pelo menos tentar, dissipar certas nuvens negras que durante varios anos certas pessoas (a melhor designacao que tenho para elas e' oportunistas) teem tentado estabelecer entre mim e a Paula Tavares.
Ha muito tempo que nao tenho qualquer contacto com ela, pelo que nao posso, nem devo, falar por ela... mas todas as lembrancas que tenho do nosso contacto quando ambas fomos lancadas simultaneamente pela UEA, ou mais precisamente, pelo Luandino Vieira, em 1985 e, mais tarde, em Lisboa, quando ambas nos visitavamos e estavamos em regular contacto, sao lembrancas boas e cheias de riqueza cultural e afabilidade... Desde entao, as nossas vidas tomaram rumos diferentes e, infelizmente, nas nossas costas (estou em crer, pelo que conheco dela, que posso usar aqui o "nossas") houve quem, maliciosamente nao tenha parado de tentar criar uma barreira e supostas "rivalidades" entre nos... pelo respeito e amizade que tenho por ela, nunca antes me pronunciei sobre o assunto, embora ela propria uma vez me tenha manifestado desconforto por esse fel instilado por outras pessoas (no caso, alguem que ja nao esta entre nos - paz a sua alma!). Mas e' cada vez mais claro que isto alguma vez, de alguma forma e em algum lugar, tinha que ser dito! E' que eu e a Paula Tavares viemos de tempos e lugares que certas pessoas jamais serao capazes de perceber... porque nunca la' estiveram, infelizmente para elas.
Ja' ha' tempos encontrei no Kitanda um outro poema dela sob a minha assinatura e prontamente chamei a atencao do Cacusso para o facto e ele tambem imediatamente rectificou o engano... Deve haver algures alguma fonte "mal enganada" de onde estas incorreccoes estao a brotar. Gostaria de saber qual e' para tentar "cortar o mal pela raiz".
Se, porventura, a Paula ler isto aqui fica o meu sempre amigo (e cumplice) abraco!

22 Fevereiro, 2007 23:49


...


Koluki escreveu...

E', meu caro amigo, ha por ai muita gente muito mal formada e, o que e' pior, sem qualquer nocao do quanto o e'. Mas... "fazer mais cumu se esse e' o prublema que estamos memo cu ele"?
De qualquer modo, obrigada pelo interesse e gosto manifestados pelos meus (antigos) poemas. Muito obrigada tambem pela devida correccao da autoria deste poema. Mais do que eu, a Paula Tavares merece-o.

26 Fevereiro, 2007 20:53