[in Novo Jornal #203, 09/12/11 - clique na imagem para ler]
… Ora aqui esta’ um artigo, escrito por alguem que julgo pertencer a
“minha geracao” (... a menos que tambem ja' seja um "sexagenario"!...), sobre uma
“outra geracao” que designa “uma geracao de idiotas”…
Trata-se de alguem, por sinal membro do
"circulo restrito" dos conselheiros de JES, de quem nunca fui proxima (de facto, nunca o conheci pessoalmente), mas que, de ha' uns anos para ca', se tornou uma das 'neofitas amizades e afectos' de alguem que, se nao me conhece exactamente desde que nasci, ou desconhece algumas facetas e periodos do meu
percurso, por varias razoes que nao venhem agora aqui ao caso, tera' lidado mais de perto comigo em determinadas fases da minha vida, ainda que apenas muito curta e superficialmente, do que a maior parte dos membros da minha (
nao muito grande e menos ainda 'poderosa') familia.
Esta pequena introducao vem a proposito de, tal como vem acontecendo com varias coisas que tenho lido na imprensa e na blogosfera angolana, depois da minha primeira leitura desse artigo, me ter sentido algo perturbada e - uma vez que venho sendo alvo, por parte de gente que nem sequer me conhece, ou por gente que considerava
"amiga" e alguma da qual, curiosamente, ate' progenitora dalguns dos membros dessa geracao dita de "idiotas", de uma serie de injustificados (e, aparentemente, tao "inexplicaveis" quanto "interminaveis"!) ataques pessoais
“out of the blue”, especialmente desde que criei este blog - ate’ possivelmente “visada”...
Mas, numa segunda leitura, realizei que as unicas coisas nele que me poderiam porventura “atingir” seriam talvez as mencoes que faz ao “principalmente fora do pais”, as “costureiras da moda” e aos “doutores que nao acabaram o curso”... So’ que, “fora do pais” ha’ muitos angolanos, pelas mais diversas razoes, em varios paises e continentes, de varias proveniencias e geracoes e de todas as “especies e feitios”; eu nao incluiria
a minha mae no grupo das “costureiras da moda” e “doutores que nao acabaram o curso” sei de muitos e certamente entre eles nao me incluo, uma vez que sempre me recusei a ser chamada de “doutora” (... para mim “doutor/a” e’ apenas, excepto nos casos em que o respectivo curso nao o requeira, quem tenha defendido com sucesso uma tese de doutoramento ou equivalente...) e, por
“aquele curso” que nao acabei em Portugal (... e quanto mais nao seja por isso, se ha' alguem que vive sob, ou que impoe a alguem a "ditadura da licenciatura" esse alguem certamente nao sou eu!...) – e nunca sera’ demais repeti-lo:
por circunstancias absolutamente extraordinarias, alheias a minha vontade, completamente fora do meu controlo e... todas originadas no "nosso querido pais" e provocadas, por accao ou por omissao, pelos mesmos "dedos" que hoje, em riste, me acusam de "ter fugido" do pais(!) e,
interestingly enough, alguns deles entre o circulo de amigos do articulista... –, fiz, em ambientes linguisticos e culturais e em circunstancias de vida muito mais dificeis, mais cursos, de nivel mais elevado e exigente e de melhor qualidade, do que muitos dos nossos “doutores”!... E tambem nunca sera' demais repeti-lo: inteiramente 'a minha custa!
And... make no mistake:
posso nao saber para onde vou, mas sei, sempre soube bem
de onde venho!
E... perante o 'que sei bem que me espera em Luanda, quem me dera poder regressar ao "maqui" dos meus avos!!!
Assim, apos uma terceira leitura, embora tivesse preferido que tal nao fosse o caso, e mesmo correndo o risco de estar enganada (... ou, recorrendo ao
"meu velho amigo" Popper, de poder vir a ser "falsificada"...) em qualquer dessas minhas leituras [e aqui nao posso deixar de notar,
en passant, que, a meu ver, esse e’ um dos maiores perigos de um certo
“jornalismo de opiniao”: dificilmente nos permite saber com exactidao,
beyond any reasonable doubt, a
que, ou a
quem (dois dos 5 'Ws' fundamentais da investigacao jornalistica: What? - O que?; Who? - Quem?; When? - Quando?; Where? - Onde?; Why? - Porque?), o articulista se esta’ a referir em concreto – particularmente quando, como eu, o leitor se encontra fora do contexto local em que o texto e’ produzido – funcionando assim,
mais frequentemente do que nao, apenas como pouco mais do que um irresponsavel "fuxico", uma predadora "kuribotice", um insidioso “mujimbo” ou, pior do que isso, como uma letal arma de arremesso, um ofensivo pau de dois bicos ou uma 'indiscriminatoria' mina anti-pessoal e ate', no limite, "anti-familiar" e "anti-social"!...], dei comigo a concordar de alguma maneira com o que afirma e, com os pes bem assentes nos meus ja’
50 anos + 1 de vida, acrescentar-lhe-ia, tentando responder de algum modo ao seu apelo para que se tomem “medidas de caracter profilatico”, embora o faca com intencoes mais "pedagogicas" do que "profilaticas", algumas "mukandas" especialmente dirigidas a alguns membros da “geracao” em causa, qualquer que ela seja:
i) Embora, por necessaria e devida modestia, me seja dificil ‘atestar’
“o que e’ a poesia”, julgo ter minimamente uma nocao do que ela “nao e’”...
Explico-me:
- Quem se pretende “poeta”, deve ter sensibilidade suficiente (...
'sense and sensibility'...) para perceber que a poesia e’ um lugar, senao de silencio total e absoluto, certamente de “tons menores”: de disponibilidade e entrega emocional, psicologica, afectiva e espiritual, interiorizacao, introspeccao, experimentacao, burilacao, depuracao, reflexao e abstracao, enfim, de recato, contencao, contemplacao e auto-superacao:
-- a poesia nao se move pelos caminhos invios, tortuosos e lamacentos da raiva (bem ou mal contida), da inveja, do odio, do ciume, do despeito, da hipocrisia, da rivalidade, do mimetismo, do plagiarismo, da disputa, do despique, da contenda, da competicao, do regateio, da zaragata, do trungunguismo, do ressaibo, do recalcamento, do rancor, da vinganca, do revanchismo, do oportunismo, do racismo, do elitismo, ou do exclusivismo;
-- a poesia nao e’ um lugar previligiado de “mainstreams”... e’, muito mais, um lugar primacial de “undercurrents”...;
-- a poesia nao e’ o "devido lugar" da “oposicao” nem da “situacao”: e’, muito mais, o lugar da “rectidao”... (por isso falava
aqui, com justificado desdem, de uns certos "poetas 'revolucionarios' e 'lucidos' da situacao", que, ademais,
sempre orbitaram nos circulos do poder ao mais alto nivel como seus "conselheiros", "advisers" ou "cortesa(o)s"!...);
-- a poesia nao e’ o lugar natural do “material”... e’, muito mais, o lugar matricial do “espiritual”, do “infinito” e do “sonho”, mesmo quando mesclado com o "pesadelo"...;
-- a poesia nao se presta a comodificacao, a coisificacao, a objectificacao, a plastificacao ou ao artificialismo, nem ao espectaculo ostentatorio, imediatista, bacoco, exibicionista, mediatico, competitivo e barulhento - enfatizemos: embora essas duas figuras possam porventura coincidir em alguns (raros) casos, ser poeta (ou poetisa, como certamente preferem apesar
disto...) nao significa ser "declamador/a"!
-- a poesia exige honestidade e respeito – e para tal requer auto-respeito: mesmo quando, como
aqui,
aqui, ou
aqui, lhe da’ para responder ao "call of the wild", "perder as estribeiras" e “gritar”, “espernear” e “explodir”, em geito de
hiphop, aparentemente em todas as direccoes, e fazer “tabua rasa” e “terra queimada” de todas as normas estilisticas da dita “poesia convencional”... apenas para melhor trazer "uma certa verdade nua e crua", ainda que apenas parcial e relativa, ao de cima: e' que a
"poesia pura e dura" nao se da' la' muito bem com a
"mentira"!... E nisso consiste um dos atributos essenciais que a devem caracterizar, a par da "integridade": a "autenticidade"!
-- a poesia e' um pouco como a "Mulher" de Vinicius de Moraes: "tem que ter qualquer coisa
que chora, qualquer coisa
que sente saudade"!... Ao que eu acrescentaria: tem que ter
ALMA!
ii) Quem se pretende "antologiador/a" ou "critico/a literario" deve adoptar como seu principio "etico-deontologico" fundamental primar pelo maximo rigor e objectividade possiveis na avaliacao das obras sobre as quais se debruca - quando tal lhe for "absolutamente impossivel" por "conflitos politico-ideologicos", "incompatibilidades pessoais e/ou de interesses", ou por qualquer outra razao, deve, moral e profissionalmente, abster-se de o fazer;
iii) Quem se pretende “promotor da literatura e do habito da leitura”, tem que, no minimo, ser capaz de demonstrar que cultiva tal habito desde
muito cedo na vida – ou, caso por qualquer infortunio nao o tenha podido fazer desde a infancia, que o faz consistente e humildemente desde que lhe foi possivel comecar a cultivar tal habito (... mais vale tarde do que nunca!...), para que a certa altura possa, confidentemente:
-- discorrer com alguma congruencia e credibilidade sobre os livros, autores ou correntes literarias que
mais o/a influenciaram ou marcaram na vida e, talvez mais importante do que isso, ser capaz de demonstrar os seus habitos de leitura atraves da qualidade da sua escrita (... mesmo que,
como eu, ainda continue a dar alguns
“pontapes” na lingua de Camoes e, ja’ agora, tambem
na de Shakespeare...) – e’ que “qualidade” nem sempre significa necessariamente “perfeicao” (ou, dito de outro modo, “o optimo pode ser inimigo do bom”...), especialmene quando se “recebeu” a lingua em que se expressa
em “segunda” ou “terceira” mao...
Tendo dito isso, convira’ nao perder de vista que “qualidade”, especialmente em poesia, nao se resume a “estetica formal”, mas (… e antes que me esqueca, aproveito para chamar a atencao de alguns dos ‘destinatarios’ desta mukanda para a diferenca entre ‘mas’ e ‘mais’ – que, propositadamente, nao vou aqui explicar, deixando-o como um, ha’ muito atrasado(!), “trabalho de casa”...) ‘cava mais fundo’ nos labirintos da
“criacao literaria” ate' chegar 'a profundidade da
“etica humanistica” (... a nao ser confundida com o estranho, suspeito, escorregadio e perigoso conceito de “etico-ideologico” recentemente introduzido no “nosso imaginario criativo” por uma certa
“douta literato-cientifica e catedratica, tambem 'mae da negritude branca lusofona pos-colonial'” - ... la' dizia
Chomsky: "O papel historico dos intelectuais, se olharmos tao longe quanto pudermos no passado, infelizmente tem sido o de apoiar os sistemas de poder e justificar as suas atrocidades"!) ... e aqui atrevo-me a sugerir, "sabendo bem o que me espera!", que tera' sido uma certa
"etica ideologica", legitimadora de uma certa
"violencia revolucionaria", que tera' permitido que "medidas de caracter profilatico" como o
27 de Maio de ma' memoria acontecessem sob a presidencia e o "olhar silencioso" de
um poeta como
Agostinho Neto... enquanto,
a contrario, tera' sido uma certa "etica humanistica", historicamente percussora dos contemporaneos "movimentos civicos anti-totalitarios" que tera' levado um poeta como
Vaclav Havel a fazer o percurso que fez!...), onde,
by the way, “criar” tambem se faz, e sobretudo (!),
“com os olhos molhados” ...
[*]
Igualmente a nao perder de vista deve ser o entendimento de que, embora a "massificacao cultural" nao seja de todo um objectivo objeccionavel, ha' que ser-se criterioso nos meios para se a obter, porque um facto incontornavel e' que: se e' certo que, ocasionalmente, da quantidade pode brotar "cumulativamente" qualidade,
the fact remains that os dois conceitos nao se equivalem... Ou, dito de outro modo, "25 poemas + 1" nao sao necessariamente "melhores" do que "25 poemas"!
Para se revelarem "socialmente uteis", a poesia, a literatura e a arte em geral, nao teem que preterir a
"essencia" em favor da
"efervescencia"... ou a
"coerencia" em favor da
"aparencia"... ou a
"consciencia" em favor da
"displicencia"!...
Os livros que, ao longo da Historia da Literatura - que nao inclui apenas "best sellers"... -, alcancaram "sucesso", nao o obtiveram apenas pela sua "promocao" ou "marketing" atraves de
t-shirts ou pelo seu volume de vendas, nem pelos seus autores terem feito cursos de "creative writing" directamente ou pela internet... mas pela "dimensao" ("medida" nao apenas pelo numero de paginas...), "profundidade", "criatividade", "originalidade" e "relevancia" do seu "conteudo"!...
iv) Quem se pretende “porta-estandarte” da
arte, deve pelo menos saber minimamente o que e’ a arte, senao num sentido estritamente
academico e
super-sofisticado ou
elitista, pelo menos num sentido
vivencial e existencial. Ou seja:
-- deve, pelo menos, procurar ter algum contacto, directo ou indirecto, com os
artistas, os processos criativos e os produtos artisticos para os poder perceber e apreciar;
-- deve, pelo menos, cultivar o habito de frequentar ateliers de arte e exposicoes artisticas e ir, sempre que possivel, a museus e galerias de arte, dentro ou fora do pais, para sobre a arte poder discernir e ser capaz de a avaliar ou criticar;
-- deve tambem expor o mais possivel os seus sentidos a um leque diversificado de manifestacoes artisticas, populares e/ou eruditas, desde a
musica, a
danca, ao
teatro e ao
cinema, para melhor e mais criteriosa e conscientemente as poder fruir, recomendar, praticar, replicar ou emular;
-- e deve fazer tudo isso sem deixar de estar de olhos e "pulsoes" abertos aos estimulos da natureza, da sociedade e do mundo que o rodeia, local e globalmente;
v) Quem se pretende "critico musical", seja de que genero for, deve, no minimo, ter alguma
formacao formal em musica;
vi) Quem pertenca as “novas geracoes” (sejam elas economicas, profissionais, academicas, politicas, jornalisticas, culturais, artisticas, literarias, ou outras) deve tentar, o mais possivel, nao deixar de respeitar os “mais velhos” – os que vieram antes de nos, que nos permitiram ser quem somos e nos abriram ou mostraram “um qualquer caminho”, mesmo que “nos tenha dado” para seguir
outro completamente diferente...
E por "respeito" - que, em qualquer caso, quanto a mim e' apenas "devido" na exacta medida em que tais "mais velhos" se saibam fazer respeitar! - nao pretendo significar apenas "reverencia" cega e menos ainda "subserviencia" acritica (pois que tal postura seria intrinsecamente "reaccionaria" porque impeditiva da "mudanca de geracoes" e da "evolucao" - mesmo que apenas "na continuidade"...), mas sobretudo "reconhecimento":
-- no que me diz pessoalmente respeito e em relacao a minha “vida literaria”, por 'incipiente' que seja e embora ate' agora ela nao me tenha trazido muito mais do que
dissabores e inimigos, nao posso deixar de estar eternamente grata a
Manuel Rui Monteiro,
Luandino Vieira,
Costa Andrade "Ndunduma",
Ruy Duarte de Carvalho e
Aires de Almeida Santos, por terem
“insuflado vida” (ainda que "precaria"), e alguns deles “de olhos vendados”, ao que, de outro modo, muito provavelmente nao teria passado de um
“nado morto”, um
“festim para vulto/as esquizofrenico/as e pornografo/as” e
racistas de todas as latitudes, um
“repasto para sordido/as fantasistas e lugubres pervertido/as” e
invejosos de todas as especies e (baixos) coturnos, ou um livro de receitas para
“kuribotices de velhotas, velhacas, bruacas e ressabiadas mulherzinhas de domingo”!...
A esses nomes gostaria de acrescentar, embora por razoes diferentes, mas relacionadas, um outro: o de Artur Pestana
"Pepetela" - por um daqueles "nadas" que, em certas circunstancias, podem significar "tudo". Conto:
Uma vez, pouco depois do lancamento do meu livro, durante um jantar em casa do entao Adido Cultural da Embaixada de Portugal em Angola,
Armando Marques Guedes, em que uma das convivas era a
Sra. Professora, a dada altura o anfitriao referiu-se a mim como uma "intelectual", ao que a Sra. Professora imediatamente lhe retorquiu desdenhosamente: "... intelectual, intelectual... eu digo-lhe quem sao os intelectuais angolanos - um dia destes faco-lhe uma lista"!... Bom, aquilo foi, obviamente, o suficiente para me "calar" para o resto do jantar - mesmo porque aprendi de pequena que
nao se deve falar enquanto se come... Mas, as tantas, como que a tentar "provar a sua tese", ela vira-se para mim e diz, com a sua irrepressivel agressividade: "Entao? Estas muito calada! Nao dizes nada porque?!"... E antes que eu lhe pudesse responder o que quer que seja, o Pepetela (a.k.a.
"o mais elevado dos espiritas"),
muito sensivel, serena e civilizadamente, disse-lhe algo como: "Mas sao assim mesmo os poetas, muito mais silenciosos, introspectivos e observadores do que faladores"... E so' por isso, tambem lhe fiquei eternamente grata!
E, ja' agora, essa memoria leva-me aonde tudo comecou: foi durante um convivio com um grupo de artistas brasileiros em Luanda, durante o qual me vi envolvida numa animada conversa sobre 'cultura' - ja' nao me lembro exactamente qual era o tema especifico. 'As tantas, um dos meus interlocutores diz-me isto: "Poxa, voce fala como uma professora da Sorbonne!... Voce esta' me fazendo sentir como "o po' do coco' do cavalo do bandido!" Bom, depois das inevitaveis gargalhadas, o Manuel Rui Monteiro, que eu conhecera alguns anos antes na
Faculdade de Letras do Lubango e que estava sentado ao meu lado, disse-me que "queria ver o que eu escrevia"... Perguntei-lhe "como e' que ele sabia que eu escrevia", ao que ele: "escreve, escreve de certeza... va' la', mostre-me que eu quero ver". E, assim, alguns dias depois mostrei-lhe alguns dos meus poemas... e foi assim que este 'pesadelo' que estou com ele ate' hoje comecou!...
E, ja’ agora, por falar na Faculdade de Letras do Lubango, impoe-se-me a mencao de um outro nome: o de
Arlindo Barbeitos, que la’ foi meu professor de Historia de Africa. Todavia, por razoes que prefiro nao pormenorizar aqui - sobretudo para que nao sejam confundidas com outras questoes que marcaram
de forma polemica a sua docencia naquela faculdade e com as quais nada tive a ver -, o nosso relacionamento professor-aluna foi tudo menos “facil”, para dizer o minimo… De tal maneira que acabei sendo, efectivamente, muito mais aluna de um outro professor daquela disciplina, de origem Bakongo, a quem peco aqui as minhas sinceras desculpas por me ter esquecido do seu nome.
Porem, Barbeitos continuou sendo o regente da cadeira e responsavel por todos os testes e avaliacoes de todos os alunos, incluindo os do outro professor. Entao, apenas para abreviar a historia, no teste final ele deu-me a mais alta classificacao e como eu nao ia as aulas dele, mandou-me chamar. Quando la’ fui, ele pediu-me que me levantasse e fez-me um grande elogio perante todos os alunos, exaltando a minha “inteligencia” e o conhecimento demonstrados atraves da qualidade da minha participacao nas aulas e naquele e noutros testes que eu tinha prestado durante o ano que frequentei naquela faculdade.
Assim, onde antes so’ havia “gelo” passou a haver algum calor humano, amizade e respeito mutuo… De tal maneira que, quando alguns anos depois nos cruzamos pela primeira vez numa rua de Luanda, foi ele que me reconheceu do outro lado da rua, chamou-me e fez-me uma grande festa!
Anos mais tarde, quando ja’ me encontrava a estudar em Lisboa, recebi de uma editora italiana um postal dizendo que lhes tinha sido recomendada pelo Arlindo Barbeitos e que estavam interessados em publicar os meus poemas. Mas, infelizmente, por razoes que
aqui se podem descortinar, naquela altura eu queria tudo "menos falar, ou ouvir falar, dos meus poemas", pelo que preferi nao prosseguir aquele contacto.
Mas aqui deixo os meus agradecimentos ao professor, historiador, escritor e poeta Arlindo Barbeitos, autor de "Angola, Angole, Angolema".
And last, but by no means least, o meu agradecimento a minha Professora de Portugues no Liceu Feminino de Luanda,
Maria Luisa Dolbeth e Costa.
vii) Quem se considera "intelectual", deve pelo menos evidenciar algumas das caracteristicas delineadas nas definicoes
aqui apresentadas.
Finalmente, mas nao menos importante:
viii) Quem se pretende “moderna, progressista e democraticamente inserido no actual mundo competitivo” em que vivemos, local e globalmente, tem que ser efectivamente capaz de
“competir honestamente” em "mercado aberto" e em "pe de igualdade", seja no mercado de trabalho, seja noutras esferas da vida economica, social, politica, academica ou cultural, e de "vencer" por "merito proprio". Ou seja:
-- nao se pode, pura e simplesmente, valer do nome, da cor da pele, do dinheiro, das casas, dos carros e outros bens materiais ou imateriais, ou das portas que lhe foram abertas pelos seus pais, ou outros familiares ou amigos, numa determinada empresa ou circulo cultural, economico, politico ou social e considerar-se por isso tao ou mais “lutador”, "capaz", “merecedor”, “bem sucedido” ou “vencedor” do que outros, da sua ou de outras geracoes, que nunca beneficiaram de tais “herancas”, previlegios, facilidades, vantagens e oportunidades!...
Caso os preceitos (ou, se se preferir,
“valores e principios”) acima enunciados nao sejam observados, minima ou parcialmente que seja, e aqui diria por “todas as geracoes” (!), por mais “ginwinos” e “bem intencionados” que sejam os seus esforcos e iniciativas, correrao sempre o risco de ser retratados e catalogados como “aqueles que venhem do Roque Santeiro para as escadarias da UEA apenas em busca de ascensao social” (!), como o fez numa outra ocasiao o autor do artigo que me serviu de mote a estas “mukandas”...
Eu di-lo-ia de outro modo: ainda que nao venham do "Roque Santeiro", nem estejam apenas em busca de "ascensao social" [poderao, por exemplo, vir de Viana, da Vila Alice, do Kinaxixe, do Bairro Popular, da Maianga, ou mesmo do Alvalade, da Marginal, do
'Quartier Latin' ou do
Bairro Alto, para as escadarias e
quintais da permissiva e promiscua "comuna 'libertinaria' neoliberal" da Cidade Alta em busca de "proximidade ao poder" e do "menos congestionado" trafico de influencias e de "fontes de informacao" para os "novos jornais" da praca, e.g. sobre "partes da historia do MPLA", que esse lugar proporciona, ou, especialmente no caso dos "rapazes" e "raparigas" que nunca tiveram forca suficiente para pegarem numa catana ou numa enxada para sairem do conforto das ruas asfaltadas da capital e irem para o campo contribuir para a
"resolucao dos problemas do povo", ou a coragem necessaria para pegarem em armas e irem para uma frente de combate defender os "seus ideais", a ilusao de que (tambem) o fizeram... - o que tambem nao e' mais do que buscar "ascensao social" ... o que quer que isso seja ...], continuarao eternamente, ou pelo menos por muito tempo, sem passar das "escadarias da UEA", mesmo que nela consigam entrar e sentar-se, sob o signo dos seus neofitos '7 egos', 'aquela mesa central com o poema "Criar" de Agostinho Neto no
background!... E isto servira' especialmente aos que para la' entram com certo tipo de "declaracoes acintosas" como as
aqui descritas!...
Em suma, como
aqui afirmava ha’ dias, e embora ninguem se possa reclamar “perfeito”, especialmente quando as suas "medidas de caracter profilatico" (ou "pornografico"?) especialmente formuladas para "as classes mais baixas", resultam em casos
como este, e muito particularmente numa
“sociedade doente” como a Angolana:
e’ tudo uma questao de INTEGRIDADE MORAL, HONESTIDADE INTELECTUAL, EDUCACAO E CARACTER!
[*]
P.S.
Apenas dois exemplos de “etica ideologica” em accao:
1. Jose’ Agostinho, dirigente da JMPLA e musico dos primordios da Dipanda, cantou uma cancao com esta letra:
(…)
E’ preciso fazer a guerra
Para acabar com a guerra
E’ bom ver disparar
E disparar tambem
E’ bom ver morrer
E’ bom quase morrer
Para melhor compreender
E perceber
Que e’ preciso fazer a guerra
Para acabar com a guerra
(…)
2. As criancas da OPA (Organizacao dos Pioneiros Angolanos), com idades compreendidas entre os 5/6 e 12/13 anos, no mesmo periodo cantavam uma cancao que rezava assim:
(…)
Eu vou morrer em Angola
Com armas de guerra na mao
Granada sera’ meu caixao
Enterro sera’ na patrulha
(…)
- Ora, dir-se-ha’ que, em ambos os casos, se tratavam de “normais” cancoes de guerra – nada inedito, extraordinario, nem “eticamente reprovavel”: afinal, todas as guerras acabam por criar os seus proprios “cancioneiros” auto-justificativos. E, dependendo de quem justifica a guerra pos-independencia e com que pressupostos ideologicos o faz, dir-se-ha’ ate’ que a cancao de Jose’ Agostinho acabou,
a posteriori por ser “vindicada” pelo desfecho que aquela guerra teve faz agora 10 anos!...
Portanto, ate’ ai, podera’ dizer-se que, do ponto de vista ideologico, “ta’ tudo bem”!...
Mas, e’ do ponto de vista humanistico que comecam os problemas:
- Sera’, antes de mais, a guerra, qualquer guerra, em si mesma “eticamente justificavel” em todas as circunstancias?
- Em ambos os casos, tratavam-se de cancoes destinadas a “condicionar psicologicamente” as criancas e os jovens para a aceitacao da e a participacao na guerra. E, sendo certo que longe estavam ainda os tempos das actuais campanhas internacionais contra o uso de
“criancas soldado” em qualquer guerra, nao era a cancao da OPA contraria aos principios da
Declaracao Universal dos Direitos da Crianca ja’ entao internacionalmente consagrados e
desenvolvidos ao longo das decadas?
Essas apenas duas das questoes fundamentais que, numa primeira abordagem, apelam ao conceito de “etica humanistica” como moralmente superior ao de “etica ideologica”.
Mas, passada essa primeira abordagem, o terreno escorragadio em que se move a “etica ideologica”, veio a revelar-se ainda mais perturbador em ambos os casos:
- Jose’ Agostinho acabou por ser executado pouco depois da Dipanda, na orgia de “violencia revolucionaria” que se seguiu ao 27 de Maio de 1977… e aqui nao poso deixar de me “espantar”, mais uma vez, com a minha “ingenuidade” em relacao aos acontecimentos e personagens a volta daquela tragedia: so’ muito recentemente me foi confirmado que esse foi efectivamente o seu destino, porque naqueles dias disseram-nos, a alguns de nos entao militantes da Jota (... ou seria da "Mocidade Portuguesa"?...), que ele tinha morrido de “uma indigestao causada por uns camaroes improprios para consumo que tinha comido”… e eu sempre acreditei nisso… ate’ muito recentemente!...
- Do “destino” de muitos pioneiros da OPA, e especialmente daqueles que realmente andaram de armas na mao (verdadeiras ou de pau) e muitos dos quais foram servir de "carne para canhao" nas frentes de combate, talvez o caso mais paradigmatico seja o do “menino da bandeira”, Diniz Kanhanga,
aqui relatado!... Enquanto outros, como
este, viriam a ser vitimados por certas
"medidas artisticas de caracter profilatico" (ou "pornografico")?!...
Enfim, em ambos os casos estamos perante facetas e simbolos da historia de duas geracoes ("de idiotas"?)
kruxifikadas pela "violencia revolucionaria" de uma certa "etica ideologica"...
Enfim, em ambos os casos estamos perante facetas da historia de duas geracoes ("de idiotas"?)
kruxifikadas pelas "medidas de caracter profilatico" de uma certa "etica ideologica"...
E isso para falar apenas de dois exemplos da “etica ideologica” aplicada ao “nosso contexto”, porque poderiamos discuti-la mais alargadamente nos contextos da
ideologia Nazi, ou da
Stalinista, ou ainda da que (qualquer que seja a designacao que se lhe de) subjaz as mais recentes
guerras do Iraque e Afeganistao… so’ para citar esses “exemplos maiores”!...
ADENDA
“... que alguem lhes conte uma historia, umazinha so’…”
Pois,
noblesse et sagesse oblige, conto:
“A Minha Amiga”
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